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Josep Borrell

Trinta anos após Acordos de Oslo, não abandonaremos o projeto de paz no Oriente Médio

Mundo não pode permitir que o conflito israelo-palestino seja esquecido

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Josep Borrell

Chefe da diplomacia da União Europeia

Há 30 anos, Yasser Arafat e Yitzhak Rabin selaram, com um aperto de mão, os Acordos de Oslo que, supostamente, deveriam conduzir a uma resolução permanente do conflito israelo-palestino num prazo de cinco anos.

Recordo a esperança que senti, então, de que enfim seria possível pôr fim a décadas de um conflito trágico entre árabes, israelenses e palestinos. Em 2023, o que resta dessa esperança? Não há paz, ou um processo de paz. A esperança transformou-se em amargura e desespero, e o marco dos 30 anos passou praticamente despercebido.

Localmente, a tensão está aumentando de novo, tendo já causado a morte de 200 palestinos e 35 israelenses. Os ataques terroristas, perpetrados tanto por militantes palestinos contra israelenses como por colonos israelenses contra palestinos, voltaram a atingir níveis recordes. Israel continua a aumentar o número de colônias na Cisjordânia: enquanto na época dos Acordos de Oslo existiam 280 mil colonos, hoje eles são mais de 700 mil.

Em 1993, o então presidente americano, Bill Clintou, entre o premiê israelense, Yitzak Rabin (esq.), e Yasser Arafat, líder da Organização pela Libertação da Palestina
Em 1993, o então presidente americano, Bill Clintou, entre o premiê israelense, Yitzak Rabin (esq.), e Yasser Arafat, líder da Organização pela Libertação da Palestina - Gary Hershorn - 13.set.1993/Reuters

A violência dos colonos, a construção de muros para separá-los dos palestinos, as demolições de propriedades locais e outras medidas estão, em muitas zonas da Cisjordânia, empurrando gradativamente a população palestina para fora das suas terras enquanto a catástrofe humanitária em Gaza prossegue sem tréguas ou qualquer final à vista.

Entretanto, o apoio nacional a uma liderança palestina internacionalmente reconhecida nunca foi tão baixo, situação que é agravada por uma carência de financiamentos cada dia maior. Em contrapartida, Israel tornou-se uma "nação startup" próspera, não obstante seu ambiente de segurança imperfeito. A necessidade de mudar o status quo não é sentida tão intensamente em Tel Aviv como em Ramallah, mas o conflito não vai desaparecer: a ideia de que Israel poderia avançar sem firmar uma paz com os palestinos é uma ilusão perigosa.

A violação persistente de resoluções do Conselho de Segurança da ONU e de alguns dos princípios mais fundamentais do direito internacional estão minando a confiança numa ordem global baseada em regras, e não só na região como no mundo inteiro. É, portanto, mais necessário e urgente do que nunca que a comunidade internacional reafirme o seu empenho em favor da paz entre israelenses e palestinos e se mobilize nesse sentido.

Há anos que a União Europeia e a comunidade internacional defendem uma solução baseada na coexistência de dois Estados: um de Israel e um Palestino —independentes, democráticos, contíguos e soberanos, que existam lado a lado em paz e segurança.

Devido à política levada a cabo por Israel, esta solução afigura-se cada vez menos viável. No entanto, que outra alternativa poderá permitir a israelenses e palestinos viver lado a lado em paz? Ninguém consegue articular qualquer outra solução plausível.

O estabelecimento de laços diplomáticos entre alguns Estados árabes e Israel, apesar de essencial para garantir a paz a nível regional, não permitiu, até agora, aproximar israelenses e palestinos. Foi por isso que decidimos, juntamente com a Liga Árabe, a Arábia Saudita, o Egito e a Jordânia, contribuir para dar um novo impulso à solução baseada na coexistência de dois Estados.

Em 18 de setembro, no âmbito da ONU, em Nova York, lançamos, conjuntamente e com sucesso, uma "Jornada para a Paz" que contou com a participação de mais de 50 países e organizações. Pretendemos fazer uma espécie de engenharia reversa da paz, elaborando um pacote de apoio a ela que permita que palestinos e israelenses maximizem seus benefícios caso atinjam um acordo de paz.

Esta proposta se baseia na Iniciativa de Paz Árabe de 2002 e no "pacote de apoio político, econômico e de segurança" da UE de 2013 que, inspirado no estabelecimento de relações diplomáticas entre Israel e alguns Estados árabes, prevê incentivos para ambas as partes do conflito caso elas consigam alcançar a paz.

Planejamos reunir todas as ideias possíveis para tornar a paz uma realidade, com a efetiva abertura das fronteiras e uma cooperação regional significativa no Oriente Médio. O que poderíamos oferecer em termos de perspectivas políticas, econômicas e de segurança? Quais projetos poderíamos iniciar nas áreas de energia, clima, água, desenvolvimento e outros?

Esta "Jornada da Paz" não é apenas uma iniciativa realizada entre árabes e europeus: todos os parceiros internacionais estão convidados a contribuir, e em Nova York, muitos de fato ofereceram seu apoio. Em 13 e 14 de novembro, em Bruxelas, iniciaremos o trabalho para detalhar e concretizar o pacote de apoio à paz.

Esta iniciativa não pode, evidentemente, substituir um verdadeiro processo de paz entre israelenses e palestinos. E o pacote de apoio à paz, por si só, não bastará para superar os muitos obstáculos que impedem uma normalização, mas poderá fornecer um incentivo para avançar nessa direção, não só pelas vantagens que oferecerá, como também por recordar às partes que a única opção estratégica viável e aceitável é uma solução negociada.

Embora os nossos amigos israelenses e palestinos ainda não tenham dado início a negociações de paz, lançamo-nos nesta viagem a fim de contribuirmos para manter viva a ideia de uma solução baseada na coexistência de dois Estados. Nossa esperança é que, graças à nossa colaboração, seja possível acelerar esse processo.

Muito embora a paz no Médio Oriente possa parecer, neste momento, uma possibilidade remota, continuaremos a dirigir esforços nesse sentido, fazendo eco às palavras de Nelson Mandela quando afirmou que "todos os objetivos parecem impossíveis até terem sido alcançados".

Pelo bem dos direitos legítimos dos palestinos, de uma situação de segurança sustentável para os israelenses a longo prazo, da paz e do desenvolvimento na região e da credibilidade da ordem internacional baseada em regras, o mundo não pode permitir que o conflito israelo-palestino seja esquecido.

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