Suprema Corte dos EUA julga ações que vão determinar futuro das redes sociais

Juízes decidem validade de leis que proíbem big techs de banir candidatos políticos e de 'censurar' conservadores

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São Paulo

A Suprema Corte dos Estados Unidos começa nesta segunda-feira (26) a julgar duas ações que vão determinar o futuro das redes sociais. A mais alta instância da Justiça americana vai analisar ações que contestam leis aprovadas em 2021 no Texas e na Flórida para, segundo os legisladores, combater uma suposta censura imposta pelas big techs às vozes conservadoras.

A lei da Flórida proíbe as redes sociais de banirem candidatos a cargos políticos e de "esconderem" suas publicações. A legislação do Texas impede as empresas de discriminarem seus usuários por seus "pontos de vista". Em jogo está a capacidade das redes sociais de moderação de conteúdo.

Isto é, a Suprema Corte vai decidir se Facebook, YouTube, X e TikTok são mais parecidos com telefones e ferrovias ou com jornais.

FILE Ñ The U.S. Supreme Court in Washington, Feb. 8, 2024. Social media companies are bracing for Supreme Court arguments on Monday, Feb. 26, that could fundamentally alter the way they police their sites. (Kenny Holston/The New York Times)
Sede da Suprema Corte dos EUA, mais alta instância da Justiça do país, em Washington - Kenny Holston - 8.fev.24/The New York Times

A corte pode acatar o argumento dos governos do Texas e da Flórida de que as redes sociais são empresas de utilidade pública, que fornecem serviços essenciais e precisam servir a todos os cidadãos igualmente, sem discriminação —da mesma maneira que uma ferrovia não pode impedir uma pessoa de andar no trem por sua posição política e uma companhia telefônica não pode baixar o volume de ligações feitas por pessoas que tenham determinadas características.

Se isso ocorrer, as empresas podem ser impedidas de remover publicações, por exemplo, de pessoas que negam a eficácia das vacinas ou que questionam a existência do Holocausto.

A corte também pode seguir na direção contrária e decidir que as redes sociais não são um serviço de utilidade pública porque os usuários têm opções –se não gostarem do X, podem recorrer a redes como Truth Social ou Gab, por exemplo. Ou seja: nesse cenário, as redes funcionam como jornais, que têm o direito de tomar decisões editoriais sobre qual conteúdo vão —ou não— veicular e que destaque darão a cada notícia. Nesse caso, elas podem remover vídeos de apologia da anorexia ou do suicídio e elogios a Adolf Hitler –conteúdos que não são necessariamente ilegais, mas que violam regras de uso das plataformas.

Os casos diante da Suprema Corte são mais uma manifestação da polarização nos Estados Unidos. As leis do Texas e da Flórida partem do pressuposto de que as redes sociais censuram os conservadores, discriminam políticos de direita e promovem conteúdo mais progressista.

A legislação da Flórida, sancionada em maio de 2021 pelo governador Ron DeSantis, foi uma resposta direta à suspensão de Donald Trump do então Twitter e do Facebook. O agora ex-presidente foi banido das redes por veicular conteúdo de incitação à violência que teria colaborado para os ataques ao Capitólio em 6 de janeiro de 2021, em que seus apoiadores tentaram reverter o resultado da eleição presidencial de 2020, que deu vitória a Joe Biden. A invasão deixou 5 mortos em Washington e é considerada o mais grave ataque à democracia dos EUA em sua história moderna.

"Muitos em nosso estado já sofreram com a censura e com outras tiranias em Cuba e na Venezuela. Se os censores das big techs aplicarem suas regras de forma inconsistente, para discriminar a favor da ideologia dominante do Vale do Silício, agora serão responsabilizados", disse DeSantis à época da sanção.

Além de proibir a "desplataformização" de candidatos, a lei exige que cada empresa publique os critérios usados para moderar conteúdo e também permite que cidadãos da Flórida processem as big techs.

Três dias após o aval do governador à lei, a NetChoice, associação que reúne empresas como Meta, Google e TikTok, entrou com uma ação pedindo a suspensão da legislação. O argumento é que ela fere a Primeira Emenda da Constituição dos EUA, que protege a liberdade de expressão —no caso, a liberdade de empresas privadas decidirem que discurso permitem, ou não, sem interferência do governo.

"Trata-se de ataque frontal à Primeira Emenda e uma intervenção do governo no livre mercado de ideias, algo que seria impensável para mídia tradicional, livrarias e bibliotecas", disse a entidade. "Da mesma maneira que a Flórida não pode dizer ao New York Times que editoriais deve publicar ou à Fox News que entrevistas deve levar ao ar, não pode dizer ao Facebook ou ao YouTube que conteúdo devem disseminar."

O governo Biden, que normalmente pressiona por mais regulação das big techs, dessa vez ficou ao lado das plataformas.

Após um tribunal distrital baixar uma liminar suspendendo a aplicação da lei, o procurador-geral da Flórida recorreu ao Tribunal de Apelações, que manteve a liminar —levando o estado da Flórida a recorrer à Suprema Corte.

Já a lei do Texas foi sancionada em setembro de 2021. Ela proíbe a censura com base no ponto de vista ou da localização do usuário. "Como as empresas de telégrafos de antigamente, os gigantes de mídias sociais usam seu controle sobre a praça pública moderna para direcionar e amordaçar debate público", disse o procurador-geral do Texas, Ken Paxton, afiliado ao Partido Republicano.

Menos de duas semanas após o aval à lei texana, a NetChoice entrou com nova ação contestando, também com base na Primeira Emenda. Um tribunal distrital bloqueou a lei, mas Paxton recorreu, e uma corte de apelações restabeleceu a lei. A entidade que representa as empresas apelou à Suprema Corte.

Os juízes da Suprema Corte começam a ouvir as sustentações orais nesta segunda, mas espera-se que a decisão final saia apenas em junho ou julho. Qualquer que seja o veredicto, vai impactar a regulação da internet em geral.

Caso decidam pela validade das leis, isso restringirá muito a capacidade das empresas de moderarem conteúdo e pode deixar as redes sociais ainda mais tóxicas.

Se considerar que as empresas não são de utilidade pública ou que as leis ferem a liberdade de expressão das plataformas, pode inviabilizar muitas outras tentativas de regular as big techs.

Quem é quem na Suprema Corte dos EUA

  1. John Roberts, 69 (conservador)

    Indicado por George W. Bush em 2005. Ainda que seja considerado conservador, o atual presidente da Corte às vezes atua mais ao centro

  2. Clarence Thomas, 75 (conservador)

    Indicado por George Bush em 1991

  3. Samuel Alito, 73 (conservador)

    Indicado por George W. Bush em 2006

  4. Neil Gorsuch, 56 (conservador)

    Indicado por Donald Trump em 2017

  5. Brett Kavanaugh, 59 (conservador)

    Indicado por Trump em 2018

  6. Amy Coney Barrett, 52 (conservadora)

    Indicada por Trump em 2020

  7. Sonia Sotomayor, 69 (progressista)

    Indicada por Barack Obama em 2009

  8. Elena Kagan, 63 (progressista)

    Indicada por Obama em 2010​

  9. Ketanji Brown Jackson, 53 (progressista)

    Indicada por Joe Biden em 2022

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