Descrição de chapéu The New York Times

Publisher do Washington Post e futuro editor do jornal são suspeitos de usar informações obtidas por vias fraudulentas

Antes de integrarem a Redação do jornal, Will Lewis e Robert Winnett teriam usado registros telefônicos hackeados para embasar reportagens

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Justin Scheck Jo Becker
Londres | The New York Times

O publisher e o futuro editor do jornal The Washington Post são acusados de terem usado registros telefônicos e de empresas obtidos de modo fraudulento em reportagens quando atuavam como jornalistas em Londres. As denúncias foram feitas por um ex-subordinado do publisher e por um investigador particular.

Will Lewis, o publisher do Washington Post, teria delegado a produção de um desses textos a um repórter em 2004, quando era editor de negócios do Sunday Times. O outro foi escrito por Robert Winnett, que Lewis anunciou recentemente como o próximo editor executivo do Post, em 2002.

Fachada do prédio do jornal The Washington Post. Foto destaca a parte superior do prédio, composta por blocos beges, e o letreiro com o nome do veículo
Prédio do Washington Post em Washington, capital dos Estados Unidos - Andrew Harnik/Getty Images via AFP

O uso de trapaça, hackeamentos e fraude está no centro de uma controvérsia de longa data na imprensa britânica. Práticas do tipo derrubaram um grande tabloide em 2010 e levaram a anos de batalhas judiciais entre veículos e celebridades que os acusavam de obter documentos pessoais e mensagens de correio de voz de forma indevida.

Lewis alega que seu único envolvimento em um episódio do tipo se deu para ajudar a expurgar comportamentos problemáticos no Sunday Times.

Um ex-repórter do jornal disse na sexta-feira (14), no entanto, que Lewis o havia designado pessoalmente para escrever uma reportagem em 2004 a partir de registros telefônicos que ele entendeu terem sido obtidos por meio de hackeamento.

Depois que a história veio à tona, o empresário britânico que era o assunto do artigo afirmou publicamente que seus registros haviam sido roubados.

O repórter em questão, Peter Koenig, descreveu Lewis como um editor talentoso —um dos melhores com quem ele havia trabalhado. Mas, acrescentou, ele tinha mudado. "Sua ambição excedeu sua ética", disse Koenig.

Um segundo texto suspeito leva a assinatura de Winnett. Um investigador particular que trabalhava para o Sunday Times reconheceu publicamente ter usado de fraude para obter os materiais que serviram de base para a reportagem, que saiu em 2002.

Ambos os textos foram produzidos durante um período em que o Sunday Times reconheceu pagar explicitamente ao detetive para obter material clandestinamente. Isso viola os códigos de ética do Washington Post e da maioria das organizações americanas de notícias. O Sunday Times afirmou repetidamente que nunca pagou a ninguém para agir ilegalmente.

Além disso, uma revisão da carreira de Lewis feita pelo New York Times levantou novas questões sobre sua decisão em 2009, quando era editor do também britânico The Daily Telegraph, de pagar mais de 100 mil libras por informações de uma fonte. Pagar por informações é proibido na maioria das Redações americanas.

Em uma reunião com jornalistas do Washington Post em novembro, Lewis defendeu os pagamentos, dizendo que o dinheiro havia sido colocado em uma conta de garantia para proteger uma fonte. Mas o consultor que intermediou o acordo disse em uma entrevista recente que essa conta não existia e que ele próprio havia distribuído o dinheiro para as fontes.

Furo de reportagem

Em 2002, Winnett conseguiu um furo de reportagem.

A Mercedes estava relançando o Maybach, um carro de luxo alemão popular na década de 1930 que o Sunday Times chamou de "a limusine favorita dos nazistas". Figuras britânicas proeminentes estavam se preparando para encomendar o carro, e Winnett tinha uma lista de nomes na lista de espera, incluindo um membro da Câmara dos Lordes do Parlamento do país.

Muitos anos depois, um detetive particular chamado John Ford revelou publicamente ter tido uma longa carreira trabalhando para o The Sunday Times. Ele disse que vasculhou o lixo das pessoas e que obteve acesso a registros bancários, telefônicos e de empresas de figuras públicas de forma clandestina.

Em uma entrevista de 2018 ao britânico The Guardian, Ford falou com arrependimento sobre seu trabalho para uma reportagem de junho de 2002 revelando os compradores do Maybach.

O texto de Winnett é o único que se encaixa nessa descrição. Mas como o texto original não está facilmente disponível online, não foi vinculado publicamente a ele.

Na entrevista ao Guardian, Ford disse que ligou para o revendedor da Mercedes e, com um sotaque falso, afirmou ser um fabricante alemão de chaveiros que precisava ver uma lista de compradores para confirmar a grafia de seus nomes. O homem do outro lado da linha foi demitido depois que o artigo foi publicado, disse ele.

Lewis se tornou editor de negócios em 2002, alguns meses após a publicação da reportagem sobre o Maybach, e se tornou chefe de Winnett.

Em 2004, Lewis chamou outro repórter de negócios após uma reunião e lhe deu uma tarefa, de acordo com o repórter em questão, Koenig.

Koenig afirmou em uma entrevista ao New York Times que Lewis o instruiu a investigar conversas entre dois empresários envolvidos na possível venda de uma empresa de varejo. Koenig contou que recebeu cópias de registros telefônicos —ele acredita que eles pertenciam a Lewis. "Meu entendimento na época era de que haviam sido hackeados", disse Koenig.

A imagem mostra a entrada de um edifício com a inscrição "The Washington Post" gravada na parede externa de granito. Ao fundo, uma porta giratória dourada
Sede do Washington Post em Washington, nos Estados Unidos - Eric Baradat/AFP

Armado com os registros, o repórter disse que persuadiu um dos empresários, Stuart Rose —que na época era CEO da varejista Marks & Spencer e agora é membro da Câmara dos Lordes— a lhe conceder uma entrevista para explicar as chamadas.

A reportagem, publicada em junho de 2004, contém detalhes minuciosos das chamadas telefônicas de Rose. Ela não diz, no entanto, de onde vieram as informações.

Koenig afirmou que tinha quase certeza de que Lewis editou o artigo pessoalmente. Lewis escreveu um artigo em primeira pessoa no mesmo dia sobre Rose e seu papel em um possível acordo da Marks & Spencer em que descrevia ter recebido pessoalmente a dica para investigar o acordo e fazia referência às chamadas telefônicas.

E em um texto paralelo também escrito por Lewis e publicado naquele dia, ele destaca o momento preciso de outra ligação telefônica.

Dias depois, a Marks & Spencer anunciou que os registros telefônicos de Rose haviam sido hackeados.
Lewis não se pronunciou com frequência ao longo dos anos sobre o escândalo de hackeamento de telefones. Nas vezes em que comentou o assunto, apresentou-se como alguém que cooperou com as autoridades e ajudou a News Corp, a empresa por trás do Sunday Times, a erradicar as irregularidades.

"Meu papel era corrigir as coisas, e foi o que fiz", disse à BBC em 2020.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.