Descrição de chapéu
André Sturm

Streaming na casa da mãe Joana

Urge a regulamentação: para atuar, empresa deveria ter sede e pagar impostos

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

André Sturm

Cineasta, é ex-secretário municipal de Cultura de São Paulo (jan.17 a jan.19)

A pandemia trouxe um crescimento imenso ao mercado de streaming (VoD, “Video on Demand”) no Brasil e no mundo. O segmento já vinha com crescimento importante nos últimos anos, desde a entrada da Netflix no país. Com as pessoas em casa, tornou-se uma das poucas opções de entretenimento para a maior parte da população.

Esse mercado, porém, cresce completamente sem regras. Qualquer empresa simplesmente monta uma plataforma e inicia suas operações. De um lado temos quatro empresas globais de capital sem limites, que produzem conteúdo próprio tendo o planeta como mercado. De outro, mais de 1.200 plataformas menores de diversos locais no mundo, vindas por meio digital, com conteúdo de baixa qualidade, gratuito (a maioria) e financiado por publicidade. A União Europeia criou regras aplicadas no bloco, já que as empresas globais atuam de forma agressiva.

0
O presidente do Belas Artes Grupo, André Sturm - Mathilde Missioneiro - 12.fev.20/Folhapress

Em todos os mercados há regulamentação. Uma empresa pode começar a oferecer voos internacionais a baixo custo no país? Um banco internacional pode abrir agencias e aceitar correntistas? No audiovisual, produtores, exibidores, distribuidores, canais de TV e agências de publicidade têm suas regras. No setor de VoD, nada. Nenhuma empresa brasileira pode ser comparada em força e tamanho às quatro grandes. Como competir com o volume de recursos investidos em marketing? Quantas vezes você viu anúncios da Netflix ou da Disney+ nos últimos meses? E de um VoD brasileiro?

Filmes produzidos no Brasil têm recebido ofertas fora da realidade para pular as salas de cinema e irem direto para as megaplataformas. Produtores brasileiros apresentam projetos e recebem recursos desde que abram mão dos direitos patrimoniais —condições draconianas, não usuais no mercado. De outro lado, temos centenas de plataformas que entram no mercado nacional, vendendo publicidade fora do país e usando o Brasil como receita adicional; o que os canais tradicionais, regulados, não podem fazer.

Urge um regulamento para o vídeo sob demanda: uma empresa para atuar no país precisa ter sede aqui e pagar impostos. A publicidade em plataformas de VoD precisa seguir as mesmas regras das outras mídias. Devem investir parte de sua receita na coprodução ou aquisição de conteúdo nacional com os direitos patrimoniais nas mãos dos produtores. Os países da Europa têm regras neste modelo. Na Espanha, o investimento obrigatório é de 15%. Assim surgiram “La Casa de Papel”, “Elite” e muitos outros sucessos!

A obrigação de investir permitiu que os produtores mais competentes tivessem acesso a recursos e investissem em roteiros e criações de qualidade. É muito importante que a Condecine (Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional) seja cobrada em valor percentual e não por título, o que inviabilizaria os pequenos VoDs. Garantia de percentual mínimo de conteúdo nacional.

Todos ganham com um mercado regulado. As empresas do setor, ao evitar concorrência desleal; o país, com impostos; os produtores, criando obras e gerando empregos; e, mais que tudo, o cidadão, com mais opções de VoDs e de conteúdos diversificados. Não podemos permitir oligopólios nem a banalização.

Durante a pandemia, filmes e séries são um alívio ao isolamento para boa parte dos brasileiros. Com regras claras e iguais para todos, mais plataformas, mais filmes e séries, mais diversidade. Ganham todos!

TENDÊNCIAS / DEBATES
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.​​

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.