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George Avelino

A direita moderada acabou no panorama político brasileiro? NÃO

A despeito do desassossego, há avanços importantes ao alcance da mão

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George Avelino

Doutor em ciência política (Stanford University), é professor da FGV e coordenador do FGV-Cepesp (Fundação Getulio Vargas – Centro de Estudos em Política e Economia do Setor Público)

Ao ser convidado a escrever este artigo, fiquei curioso sobre o motivo da pergunta. Afinal, se entendemos a democracia como um mecanismo para solucionar pacificamente os nossos conflitos, é a moderação que permite o diálogo entre forças com interesses distintos e a construção das maiorias necessárias para encaminhar e aprovar propostas. Políticos moderados, portanto, são essenciais para o bom funcionamento dos governos democráticos.

Mas, assim como existem diferentes tipos de políticos radicais (à direita ou à esquerda, por exemplo), também existem diferenças entre os moderados. Então, o que se pode dizer sobre os políticos moderados brasileiros após as eleições do primeiro turno?

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Os candidatos à Presidência da República Jair Bolsonaro (PL) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) - Reuters

Um resultado importante, por exemplo, foi a repetição do desempenho ruim do PSDB, que elegeu apenas 13 deputados federais. Ainda que não se possa decretar o fim de um partido cuja estrutura mantém diretórios organizados em quase 2.000 municípios brasileiros, a perda do governo de São Paulo certamente reduzirá o seu papel no cenário político nacional. Entretanto, tal derrota apenas coroa um processo mais longo. A crescente divisão da legenda já a tinha feito perder o papel de coordenação da oposição ao petismo nas eleições passadas.

A decadência do PSDB foi paralela ao crescimento dos candidatos relacionados ao chamado "centrão" e a outros partidos próximos, renovando o viés mais conservador que a Câmara dos Deputados adquirira em 2018. A consolidação dessa nova oposição ao petismo se assemelha a um "realinhamento eleitoral", termo usado pela ciência política para definir situações em que a grande maioria dos eleitores se move em direção a um dos lados do espectro ideológico, provocando uma redefinição da agenda política. Mas conservadorismo não precisa rimar com radicalismo, como atestam as participações do centrão em governos de diferentes tonalidades ideológicas.

Mesmo reconhecendo a existência de políticos moderados, a restrição imposta pelo viés conservador do Legislativo não poderá ser desconsiderada por qualquer candidato eleito presidente da República no próximo dia 30. Essa restrição ficaria mais evidente em um eventual governo liderado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), favorito pelo seu desempenho no primeiro turno.

Embora Lula tenha negociado com políticos conservadores em seus dois governos passados, o terceiro governo teria de assumir mais claramente as feições da ampla frente que sustentou sua candidatura e também moderar suas ambições. Essa moderação poderia implicar grandes sacrifícios; por exemplo, limitando algumas das pautas identitárias, frequentes na agenda recente da esquerda, mas de aceitação difícil pela maioria conservadora do Congresso. Em compensação, seria possível avançar na redução de outras formas de desigualdade através de propostas mais convencionais e mais fáceis de serem negociadas, como maior inclusão econômica, acesso a serviços públicos de melhor qualidade e políticas para o meio ambiente.

A despeito do desassossego vivido pelas forças progressistas na noite de 2 de outubro, há avanços importantes ao alcance da mão. Em vez de decretar o fim da moderação, é necessário reavivar a política democrática, identificando os políticos moderados e com eles construir propostas passíveis de aprovação em um contexto de reconstrução nacional. Ainda que o caminho tenha se revelado mais íngreme, este será o grande desafio nos próximos anos.

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