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Mark Weisbrot

Desta vez, vamos garantir que os EUA respeitem a democracia no Brasil

Devemos ficar atentos com o que o governo americano fará nos próximos meses e anos

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Mark Weisbrot

Codiretor do "Center for Economic and Policy Research", em Washington, e autor de “Failed: What the ‘Experts’ Got Wrong About the Global Economy” (Oxford University Press)

O povo brasileiro, com seu voto, tirou um monstro da Presidência da República. Agora tem uma oportunidade de restaurar a democracia que havia perdido. Jair Bolsonaro (PL) administrou mal a pandemia, disseminando desinformação em grande escala sobre a Covid-19, o que contribuiu para o total de mais de 600 mil mortos pela pandemia no país. O desmatamento da Amazônia foi acelerado: a área desflorestada em 2021 foi mais de 70% maior do que quando ele chegou ao poder, em 2018. Bolsonaro elogiou e defendeu a ditadura militar do Brasil e disse que ela não matou gente suficiente. Como Donald Trump, ameaçou rejeitar os resultados da eleição se fosse derrotado.

Luiz Inácio Lula da Silva (PT) derrotou Bolsonaro por uma diferença de mais de 2 milhões de votos. Ele foi um governante que transformou o país (2003-2010), imensamente popular quando deixou o cargo. Durante a sua Presidência, o índice de pobreza do Brasil caiu 50%, e a pobreza extrema diminuiu 49%. A renda per capita cresceu 2,9% ao ano, mais de cinco vezes o crescimento dos 20 anos anteriores. Já o desemprego caiu de 13% para 8,5%.

A maior parte do mundo está festejando, ao lado da maioria dos brasileiros. Mas o mundo precisa saber mais sobre como essa democracia foi perdida e sobre alguns dos atores e acontecimentos mais influentes que contribuíram para essa perda para assegurar que ela não se repita.

A democracia no Brasil foi assassinada quando a presidente Dilma Rousseff (PT) sofreu impeachment sem sequer haver cometido um crime. E ela foi enterrada quando Lula foi encarcerado, em 2018, para impedi-lo de candidatar-se à reeleição. Sua condenação foi revogada posteriormente quando a Justiça determinou que o juiz Sergio Moro, que o sentenciara, não havia sido imparcial. Moro tornou-se ministro da Justiça quatro dias depois de Bolsonaro ser eleito.

As evidências para a condenação de Lula foram baseadas no depoimento de um executivo de uma construtora que fora condenado num escândalo de corrupção e tivera sua pena reduzida em troca de seu depoimento. De fato, esta Folha noticiou que o executivo foi impedido de fazer uma delação premiada até que mudasse seu depoimento para implicar Lula num suposto crime.

Quando escrevi sobre essa farsa de julgamento para a página de opinião do New York Times em 2018, o jornal tornou-se o primeiro veículo da grande imprensa americana a divulgar esses fatos básicos, disponíveis ao público, mostrando que o julgamento de Lula foi claramente uma perseguição política. Esses fatos eram necessários para enxergar o que a elite tradicional brasileira estava fazendo realmente: destruindo o Estado de Direito e derrubando a independência do Judiciário, para conseguir o que não pudera conquistar em 14 anos nas urnas: a derrota do Partido dos Trabalhadores.

O PT foi derrotado, mas não sem ajuda significativa, possivelmente decisiva, do governo dos EUA. Representantes americanos de alto escalão tomaram uma série de medidas em público, tais como encontros cordiais com líderes do impeachment de Dilma em Washington e no Rio enquanto o afastamento estava em curso.

O Departamento de Estado dos EUA também contribuiu significativamente para a investigação que levou à perseguição política e à prisão de Lula. Em 2015, por exemplo, 17 funcionários dos EUA foram ao QG da Lava Jato, procurando ocultar a visita do governo federal. As autoridades americanas também concordaram em transferir uma parcela das multas recolhidas nos EUA para uma fundação particular chefiada pelos procuradores brasileiros da Lava Jato, num arranjo que acabou sendo suspenso pelo Supremo Tribunal Federal brasileiro.

Aqueles que prezam a democracia no Brasil precisam ficar atentos para o que o governo dos Estados Unidos fará nos próximos meses e anos.

Tradução Clara Allain

TENDÊNCIAS / DEBATES
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