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Horácio Lafer Piva, Pedro Passos e Pedro Wongtschowski

O tamanho do Estado

O que se espera da administração ora no poder são ajustes às efetivas necessidades do país

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Há no país uma eterna discussão sobre o tamanho ideal do Estado brasileiro. Os mais liberais querem um Estado mínimo; os mais à esquerda, um Estado empreendedor e provedor. Na verdade, estamos no pior dos mundos: um Estado que tenta ser empreendedor e não consegue convivendo com um Estado insuficiente de tão mínimo.

Os brasileiros já definiram, na Constituição de 1988, que "a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo" (art. 173).

Favela de Paraisópolis em contraste com edifícios luxuosos do Morumbi (ao fundo), em São Paulo. - Eduardo Knapp/Folhapress - Eduardo Knapp/Folhapress

A despeito disso, ou em função de uma interpretação elástica do que venha a ser "relevante interesse coletivo", o Estado brasileiro insiste em exercer inúmeras atividades que seriam muito mais bem realizadas pelo setor privado, sujeito à regulação e aos limites definidos em lei.

Os exemplos incluem transporte coletivo, gestão de rodovias, tratamento de água, gestão de ferrovias, portos e aeroportos, centrais de abastecimento nas grandes cidades, distribuição de encomendas e correspondências, fabricação de produtos químicos e geração de energia, dentre muitos outros. Enquanto o Estado brasileiro faz (em geral mal) muita coisa que não deveria, deixa de fazer (ou faz mal) muita coisa que é dever indeclinável do setor público. A lista é longa, incluindo desde o setor privado gastar fortunas para cuidar da segurança de seus ativos físicos e humanos até descobrir formas criativas (e em geral caras) de fugir do setor público, como na logística, onde se evita, quando possível, utilizar ativos sob gestão estatal.

Na ponta do que o Estado deveria fazer, mas faz mal, a lista é longa. Vejamos alguns exemplos:

1 - A CVM (Comissão de Valores Mobiliários), órgão indispensável para o funcionamento do mercado de capitais, tem 400 funcionários; o seu presidente indicou que a autarquia precisa de 1.200 novos servidores —o último concurso foi realizado em 2010;

2 - A Embrapa, instituição fundamental para a pesquisa agropecuária no Brasil, fez o seu último concurso em 2010; nos últimos 15 anos, perdeu 40% de seus funcionários;

3 - O Inpi (Instituto Nacional da Propriedade Industrial), órgão essencial para a garantia de direitos de propriedade intelectual, tem 800 cargos vagos —o último concurso foi em 2012;

4 - A ANM (Agencia Nacional de Mineração), órgão regulador do imenso e relevante setor mineral brasileiro, declara uma defasagem de 70% nos seus quadros técnicos: tem 664 servidores dos 2.021 necessários;

5 - O Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), instituição hoje em fase adiantada de sucateamento, tinha 769 servidores em 2008 —hoje são 473 e, destes, 56% já podem se aposentar. Entre os pesquisadores, 90% têm condições de se aposentar imediatamente;

6 - O quadro de descalabro do Ibama é conhecido: a instituição perdeu 58,7% de seus servidores em 20 anos. Na fiscalização ambiental, o órgão tinha 1.800 servidores em 2008, mas hoje tem cerca de 700;

7 - O IBGE dispunha de 6.369 funcionários em 2013; em 2023, são 4.172. Daí decorre que o Censo 2022 se estendeu muito e passou a ser conhecido como "o interminável". Houve, pela primeira vez, atraso na divulgação do IPCA.


Todas as instituições citadas são tipicamente órgãos de Estado, que cumprem funções indiscutivelmente públicas. Há ainda outras distorções, com as quais já nos acostumamos. O serviço de controle de passaportes nos aeroportos brasileiros é terceirizado. O caso é característico da execução pelo setor privado de um serviço típico e indelegável do Estado.

O que se espera da administração ora no Poder Executivo federal é ajustar a sua estrutura à efetiva necessidade do país. Certamente há áreas ineficientes e com excesso de pessoal —é preciso identificá-las e corrigir as distorções. Este é um dos objetivos da sempre adiada reforma administrativa. Mas, até lá, imagina-se que o Estado saia das áreas onde não se aplica o já citado "imperativo da segurança nacional" e se concentre em executar bem os serviços necessários para o adequado funcionamento da economia e da sociedade brasileira. É o que os brasileiros esperam e merecem.

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