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Laís Abramo e Rosane Silva

Por uma política nacional de cuidados

Sobrecarga compromete as trajetórias educacionais das mulheres

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Laís Abramo

Secretária Nacional de Cuidados e Família do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome

Rosane Silva

Secretária Nacional de Autonomia Econômica e Cuidados do Ministério das Mulheres

A pandemia de Covid-19 produziu profundos impactos sanitários, econômicos e sociais. Em meio às controvérsias sobre como enfrentá-la, escolas, serviços de contraturno infantil, instituições de atendimento a pessoas idosas e com deficiência se fecharam. Nesse contexto, ganhou visibilidade o enorme volume de horas que as famílias passaram a dedicar ao trabalho de cuidar.

É fato que todas e todos nós necessitamos de cuidado ao longo de nossas vidas, ainda que essa necessidade seja mais premente em algumas etapas ou entre alguns grupos específicos. Mas nem todas as pessoas cuidam. No Brasil, e em boa parte do mundo, são as mulheres que assumem a maior parte dessa responsabilidade, por meio de um trabalho cotidiano gratuito, não valorizado e entendido como sua atribuição "natural".

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Essa sobrecarga gera uma pobreza de tempo, comprometendo as trajetórias educacionais das mulheres - Catarina Pignato

As mulheres dedicam em média 21 horas semanais ao trabalho doméstico e de cuidados não remunerado, valor que é o dobro do tempo dedicado pelos homens (IBGE/2019). Essa carga é ainda maior entre as mulheres negras, as que vivem em territórios com menos serviços e equipamentos de cuidado, tanto na área rural quanto nas periferias urbanas e entre as mais pobres.

Essa sobrecarga gera uma pobreza de tempo, comprometendo as trajetórias educacionais das mulheres, a sua inserção no mercado de trabalho e participação na vida pública. Em 2021, 30% das mulheres em idade ativa que não procuravam emprego não o faziam devido às suas responsabilidades de cuidado, cifra que não alcançava 2% entre os homens. Tudo isso contribui para perpetuar um círculo vicioso de pobreza e desigualdades.

Não por acaso tem sido as mulheres as que têm pressionado para que o cuidado entre na agenda, colocando as políticas públicas como elementos centrais para a garantia de sua autonomia econômica e social e do direito ao cuidado a todas/os que dele necessitem.

Diferentes países, particularmente na América Latina, vêm avançando na construção de políticas e sistemas integrados de cuidados como parte de seus sistemas de proteção social, articulando serviços e benefícios de diferentes áreas, como a assistência social, a saúde, a educação, as políticas de emprego e de promoção do trabalho decente e de segurança alimentar.

No Brasil, esse esforço se inicia agora com a criação, por meio do Decreto n.º 11.460/2023, de um Grupo de Trabalho Interministerial para construção da Política Nacional de Cuidados composto por 20 instituições governamentais e coordenado conjuntamente pelo Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome e pelo Ministério das Mulheres.

Confere-se, assim, protagonismo ao Estado como garantidor do direito ao cuidado e de condições de trabalho decente para as trabalhadoras/es do cuidado, tornando concreto o compromisso do governo do presidente Lula de cuidar do povo brasileiro e de cuidar de quem cuida. É preciso avançar na compreensão de que cabe a toda a sociedade a tarefa de prover cuidados e de que é necessário reconhecer, reduzir e redistribuir o trabalho de cuidado para a construção de uma sociedade mais justa, igualitária e inclusiva.

TENDÊNCIAS / DEBATES
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