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Márlon Reis

Um novo passo rumo à segurança jurídica nas eleições

Revisão da lei delineará sistema eleitoral mais transparente e responsável

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Márlon Reis

Advogado e ex-juiz auxiliar da presidência do Tribunal Superior Eleitoral, é corredator da Lei da Ficha Limpa

Desde a sua edição, em 2010, a Lei da Ficha Limpa consolidou-se como um marco no desenvolvimento da legislação eleitoral brasileira. Sua instituição teve o propósito de robustecer e ampliar o sistema de inelegibilidades, estabelecendo padrões éticos-políticos substancialmente mais exigentes para aqueles que aspiram ocupar cargos públicos eletivos. Contudo, enquanto esse progresso ocorria, emergiu um desafio latente: uma lacuna processual restou evidenciada, apresentando como oportuna a necessidade de se antecipar e qualificar o debate jurídico acerca de possíveis entraves à elegibilidade.

Neste cenário, propõe-se uma revisão na Lei das Eleições de modo que nela seja introduzido o Requerimento de Declaração de Elegibilidade (RDE), uma sugestão que emerge como resposta a uma demanda contemporânea por aprimoramento da certeza e da segurança jurídica nos processos eleitorais.

Manifestante pede aprovação da Ficha Limpa em frente ao STF, em 2012 - Sergio Lima-15.fev.12/Folhapress - Folhapress

O RDE, que aqui proponho, é inspirado no instrumento da ação declaratória próprio do processo civil. No entanto, adaptado ao direito eleitoral, assume uma identidade singular marcada pela prevalência do interesse público. Sua principal contribuição é fornecer um mecanismo pelo qual um aspirante a cargo eletivo, com incertezas relativas à sua elegibilidade —por questões atinentes às condições de elegibilidade, inelegibilidades ou outros óbices ao registro da candidatura—, possa obter um esclarecimento criterioso da Justiça Eleitoral.

Assim, o pretendente pode adotar uma postura proativa, obtendo uma decisão judicial prévia, que não apenas ateste sua plena capacidade eleitoral, fortalecendo-se contra possíveis contestações futuras, como também o faça sob o manto do encerramento do debate pela via do trânsito em julgado.

Além disso, o RDE possui um caráter eminentemente democrático. Partidos com órgãos diretivos instituídos na circunscrição terão a prerrogativa de impugnar o pedido, garantindo um debate sobre elegibilidade plural e pautado pela diversidade de visões, com a presença do Ministério Público e tudo contribuindo para qualificar o pronunciamento definitivo da Justiça Eleitoral.

O RDE estabelece as bases para um processo de registro de candidaturas mais transparente e seguro. Com sua instauração, espera-se evitar ou pelo menos reduzir a tormenta que hoje se abate nos períodos eleitorais. Atualmente, impugnações em pleno processo eleitoral geram insegurança e distúrbios, pois mesmo após a vitória nas urnas, muitas vezes ainda paira dúvida acerca da efetividade da conquista do mandato. O RDE tem o mérito de diminuir essa incerteza, trazendo tranquilidade tanto para candidatos quanto para eleitores.

Além disso, uma vez declarado pela Justiça Eleitoral que determinada circunstância gera ou não restrição ao direito de registrar candidatura, não faz sentido que o tema possa voltar à baila em sucessivas eleições. Estaríamos diante de um ambiente mais racional, com um único pronunciamento conferindo definitividade ao tema.

Em um país cuja cultura política é rica e onde o debate sobre os valores inerentes à democracia nunca foi tão vívido, mecanismos como o RDE são cruciais. Eles qualificam o processo de registro de candidatura, elevando a legitimidade dos pleitos eleitorais.

Por isso, torna-se imperativo revisar a Lei das Eleições para institucionalizar o RDE. A adoção dessa medida, consectário das benfazejas decorrências da Lei da Ficha Limpa, delineará um caminho para um sistema eleitoral ainda mais transparente, responsável e representativo da vontade popular. Minha expectativa é a de que o Congresso Nacional se valha da oportunidade aberta na revisão das normas para 2024 para incluir nas suas discussões o instrumento processual cuja adoção é aqui defendida.

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