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Pedro Estevam Serrano

As penas para os réus dos ataques de 8 de janeiro foram adequadas SIM

Fracasso da intentona golpista não atenua as responsabilidades criminais

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Pedro Estevam Serrano

Doutor em direito do Estado (PUC-SP) com pós-doutoramento nas Universidades de Lisboa, Católica de Paris e Paris Nanterre, é advogado e professor de direito constitucional e de teoria do direito da PUC-SP

Pela primeira vez na história brasileira estamos resolvendo uma crise humanitária fruto do autoritarismo em sua dimensão pública. Ao julgar os atos golpistas de 8 de janeiro, o Supremo Tribunal Federal começou a responsabilizar, mediante observância do devido processo legal e aplicação estrita da lei penal, pessoas que atacaram as instituições democráticas e o próprio sistema de direitos.

Historicamente, o modo tradicional de resolução das crises humanitárias em nosso país se deu pela composição elitista a partir de soluções privadas negociadas, em prejuízo dos mecanismos públicos de restauração dos valores democráticos.

Ex-funcionário da Sabesp e morador de Diadema (SP), Aécio Lúcio Costa Pereira, 51, foi condenado a 17 anos de prisão pelos ataques de 8 de janeiro - Reprodução - Reprodução

O fim do escravismo, por exemplo, foi viabilizado a partir da indenização dos senhores de escravos, em detrimento de uma forma de solução pública e democrática que possibilitasse a emancipação verdadeira dos ex-escravizados.

Após a ditadura militar, promoveu-se a reparação indenizatória aos exilados, presos e torturados pelo regime; porém, aos tiranos e torturadores restou a impunidade caracterizada pela ausência de responsabilização jurídica e histórica pela grave violação dos direitos humanos por eles praticada.

Voltando aos dias de hoje, é importante dizer que os atos golpistas não podem ser encarados como mera deterioração de bens públicos, pois as provas são abundantes no sentido de demonstrar a intenção de depor o governo legitimamente constituído e abolir o Estado democrático de Direito.

A circunstância de não terem consumado seu intento não atenua responsabilidades, pois tais crimes se caracterizam imediatamente pela tentativa. Não se trata de particularidade do ordenamento brasileiro, mas de uma imposição lógica, como ilustrativamente se pôde verificar no recente episódio em que 25 pessoas foram presas na Alemanha por planejar um golpe de Estado.

A invasão e a destruição dos prédios que simbolizam os Poderes de Estado, com a intenção de promover intervenção militar e depor o governo eleito, atentou contra a própria existência da democracia constitucional brasileira. Tivessem os bolsonaristas obtido êxito em seu propósito golpista, o sistema de justiça e a proteção dos direitos individuais teria perdido totalmente a sua eficácia, o que revela a gravidade e a reprovabilidade social das condutas.

Não podemos admitir a manipulação retórica do discurso da defesa de direito individuais dos golpistas para blindar a tentativa de destruição dos mecanismos públicos de defesa dos direitos de todos.

No direito penal, costuma-se apontar dupla função da pena. Em primeiro lugar, a imposição de sanções criminais é encarada como retribuição à prática de condutas socialmente reprovadas e tipificadas em lei como tal. Em segundo lugar, tem função preventiva, pois, em sua dimensão social, desempenha o efeito pedagógico de reafirmar os valores civilizatórios e inibir comportamentos indesejáveis.

A preservação da democracia reclama uma inédita solução pública para as aventuras autoritárias. Em boa hora, o STF tem promovido avanços civilizatórios a partir de uma jurisprudência que pode estabelecer mecanismos públicos de defesa do sistema de direitos face aos ataques perpetrados. Tais condutas devem ser rigorosamente sancionadas nos termos da lei, impondo-se a devida responsabilização aos executores e, com maior severidade, aos mandantes e financiadores de atos golpistas, que simbolizam o mais violento crime político em uma democracia constitucional.

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