Quase todo o desmatamento nos trópicos (88%) é causado por atividades agropecuárias, e um terço dos impactos sobre a biodiversidade global está relacionado ao comércio. Um dos principais desafios da sustentabilidade é tornar o comércio internacional um promotor de melhorias técnicas e mecanismos econômicos que garantam segurança alimentar e, ao mesmo tempo, contribuam para a conservação da biodiversidade e a adaptação climática.
O Brasil é o maior exportador de produtos agrícolas para a União Europeia (UE), o que vincula a demanda dos consumidores ao desmatamento no país. Nesse sentido, deter essa prática tornou-se uma prioridade partilhada entre os países. Nova legislação da UE determina que as importações de commodities agrícolas devem comprovar desmatamento zero em sua cadeia de fornecimento a partir de 2021; o Brasil assumiu o compromisso de zerar o desmatamento e a degradação dos ecossistemas até 2030. Por isso, o governo federal precisa satisfazer a crescente demanda agrícola enquanto cumpre as metas acordadas.
Um estudo recente do Instituto Internacional para Sustentabilidade (IIS) analisou a aderência de seis commodities agrícolas brasileiras à regulamentação de desmatamento zero da UE. Por meio de um índice inédito, o trabalho mediu a probabilidade de conformidade à lei segundo critérios de exportações, desmatamento, certificações e pequenos produtores. O café é o mais próximo da adequação à nova regulamentação, seguido pela soja; já as cadeias da pecuária e do cacau são as mais distantes da conformidade.
O estudo aponta preocupação com efeitos negativos não deliberados, como os altos custos de implementação de sistemas de rastreabilidade e a exclusão de pequenos agricultores. Embora bem-intencionadas, as regulações de desmatamento zero geram consequências em toda a cadeia, atuando como medida comercial não tarifária.
Processos bilaterais também desempenham um papel importante na discussão, a exemplo do Acordo Comercial União Europeia-Mercosul, que voltou aos holofotes devido à reiteração de interesse da UE em concluir o acordo, apesar da oposição da França. Países produtores e consumidores devem negociar instrumentos mais amplos de governança, em ambientes multilaterais, visando coibir o desmatamento e fortalecer a cooperação internacional.
No momento em que o tema é pauta em todas as agendas e o Brasil assume a presidência do G20, o país tem a chance de liderar o debate global sobre desenvolvimento sustentável. Esse fórum pode promover um comércio internacional mais transparente e inclusivo, que considere a sustentabilidade em todas as suas transações, com menor grau de protecionismo. Para isso, o Brasil tem o desafio de frear o desmatamento e recuperar a imagem no cenário mundial para posicionar o país como protagonista nessa transição para um sistema comercial sustentável.
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