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Ronaldo Laranjeira

O Brasil deveria legalizar o consumo de maconha e outras drogas leves? NÃO

Experiência dos EUA já comprovou o fracasso da 'paz' com os entorpecentes

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Ronaldo Laranjeira

Médico psiquiatra especialista em álcool e drogas, é professor titular de psiquiatria da Escola Paulista de Medicina/Unifesp e presidente da SPDM (Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina)

A promessa de dias melhores com a legalização das drogas, maconha inclusa, já se demonstrou, na prática, um fracasso. Deu errado nos EUA, onde não somente o número de usuários como o comércio ilegal e a criminalidade aumentaram, elevando brutalmente o custo social da saúde.

O estado norte-americano de Oregon —um dos primeiros a descriminalizar a maconha, há cerca de quatro anos— recuou da decisão no dia 1º de março, quando o legislativo local votou pela volta da criminalização do porte de qualquer droga em razão das nefastas consequências do avanço do número de usuários e de dependentes químicos, sobretudo de opioides.

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Pesquisa Datafolha mostra que 67% dos brasileiros dizem ser contra a descriminalização do porte de maconha para uso pessoal - Pedro Ladeira - 29.jun.2023/Folhapress - Folhapress

Em Denver (Colorado, EUA), a legalização fez o índice de usuários dobrar de 10% para 20%, com tendência de aumento. Lá, igualmente, o mercado ilegal de drogas não foi afetado. Pelo contrário: reorganizou-se e fortaleceu-se, passando a conviver com o mercado legal e ampliando o acesso das pessoas aos entorpecentes.

Embora seja um instrumento imperfeito, a proibição da posse de drogas e sua tipificação como crime ainda produz algum efeito de controle com componente de efetividade, como vemos em países nórdicos e asiáticos, por exemplo.

A maconha é uma substância psicoativa e seu uso crônico e prolongado pode causar graves danos à saúde, incluindo dependência química —especialmente se o consumo se iniciar precocemente, ainda na adolescência.

Dos 13 aos 25 anos de idade o cérebro dos jovens ainda está em transição para a fase adulta. Qualquer substância psicoativa utilizada nesse período influencia no que chamamos de poda neuronal, fase em que as sinapses cerebrais estão sendo constituídas.

Um estudo de coorte feito na Nova Zelândia demonstrou que adolescentes usuários de maconha apresentaram comprometimentos neuropsicológicos e cognitivos, com prejuízos à memória de execução, atenção, concentração, função executiva (capacidade de pensar, planejar e realizar), além de redução no QI (quociente de inteligência).

Um outro estudo, publicado em 2019 no jornal acadêmico Jama Psychiatry e conduzido por meio de meta-análise, demonstrou que os usuários de maconha têm risco expressivamente aumentado para depressão, pensamentos suicidas e tentativas de suicídio.

Há evidências suficientes de que a maconha produz, nos usuários "pesados", episódios de psicose aguda e desorganização mental grave, como confusão mental, alucinações, delírio, crises de ansiedade, perda de memória e agitação. Embora não se tenha na literatura médica relatos de overdose por uso de maconha, a intoxicação pelo uso abusivo da substância pode causar desorganização mental, resultar em acidentes e provocar a morte do indivíduo.

Além disso, como o colega Drauzio Varella expôs em artigo nesta Folha ("Maconha está ligada ao aumento do risco de doenças cardiovasculares", 27/3), fumar ou vaporizar maconha eleva as chances de doenças cardiovasculares, infarto e AVC. Quanto maior for a frequência e a exposição, maiores serão os riscos.

No Brasil, ser usuário de maconha ou outro entorpecente não leva mais ninguém para a cadeia, por decisão já tomada pelo Congresso em 2006. As penalidades para o porte de pequenas quantidades são administrativas. Que fique por aí. Já sabemos que práticas legalizantes produziram mais crimes, doenças e fracassos; frutos da "paz" com as drogas.

Avançar no debate para uma flexibilização ainda maior representa um grave risco para o combate à criminalidade e à dependência química em nosso país.

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