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Fernando Neisser e Renato Opice Blum

O desafio dos deepfakes nas eleições

Combate envolve tecnologia avançada, legislação robusta e educação pública

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Fernando Neisser

Mestre e doutor em direito (USP), é professor de direito eleitoral (FGV/SP)

Renato Opice Blum

Advogado, economista e professor; é mestre pela Florida Christian University; presidente da Comissão de Estudos de Novas Tecnologias, Neurodireitos e Inteligência Artificial do Iasp

Em outubro próximo teremos eleições municipais, e uma ameaça tecnológica tira o sono de quem se preocupa com a democracia: os deepfakes. Se campanhas massivas de desinformação já se mostraram um desafio desde ao menos 2018, o que dizer de áudios e vídeos produzidos sinteticamente, simulando imagens e voz de quaisquer pessoas?

Como sempre, há quem anteveja a catástrofe. Não será, contudo, o primeiro desafio tecnológico que enfrentamos a testar nossa capacidade de detectar tentativas de engano.

Em 1917, na Inglaterra, vieram à tona as fotografias das fadas de Cottingley, supostamente tiradas por duas crianças. O furor foi geral, levando gente racional como Sir Arthur Conan Doyle a crer na história. Somente nos anos 1980 admitiu-se a farsa.

Imagem ilustrativa mostra propagação de notícias falsas em redes sociais - Sebastian Bozon - 1º.dez.23/AFP - AFP - AFP

Vinte anos depois, em 1938, Orson Welles, convenceu os Estados Unidos de que estávamos sob ataque marciano, no famoso episódio da Guerra dos Mundos.

Cada novo meio de mídia traz seus desafios à nossa capacidade de desconfiar da realidade que nos mostra. O motivo para isso é simples, já que o cérebro humano mudou pouco desde quando migramos da savana. Seguimos programados, geneticamente, para fugir dos predadores e buscar alimento, não para identificar deepfakes.

Se não há tempo para que a evolução resolva esse problema, é preciso que a cultura e a criatividade humana entrem em campo.

O Tribunal Superior Eleitoral aprovou uma resolução inovadora, regulando o uso da inteligência artificial nas eleições e proibindo, de forma contundente, o uso de deepfakes pelas campanhas. Quem for pego terá a campanha cassada e ficará inelegível por oito anos.

Agora, qualquer conteúdo fabricado ou manipulado por meio de inteligência artificial deve ser acompanhado de informação explícita e destacada desse fato. O desafio central é assegurar que todas as medidas legais sejam efetivamente implementadas.

Mas como podemos determinar o que é real e o que foi manipulado? Quais estratégias podem ser adotadas para melhorar a detecção de deepfakes?

Existem ferramentas comerciais que podem auxiliar nessa tarefa, mas elas necessitam de treinamento e atualização constantes. Dependendo da sofisticação da tecnologia, pode ser possível detectar a falsificação a olho nu, enquanto especialistas podem precisar analisar o conteúdo em outros casos.

Ferramentas de inteligência artificial podem ser mais eficientes do que a análise manual, mas esse é um processo que requer tentativa e erro.

Do ponto de vista social, os indivíduos devem verificar a credibilidade das fontes de mídia antes de compartilhar informações. Muitos não compreendem o que são deepfakes ou os danos que podem causar, mas, com a educação adequada, podem aprender a identificar sinais de falsificação.

Ao tentar identificar uma imagem ou vídeo falso, alguns sinais podem incluir: desfoque evidente no rosto que não corresponde ao resto da mídia; mudanças de tom de pele nas bordas do rosto; queixos, sobrancelhas ou bordas duplas; desfoque do rosto quando parcialmente coberto; seções de qualidade inferior no mesmo vídeo; formas semelhantes a caixas ou efeitos recortados ao redor da boca, olhos e pescoço; padrões de piscar (ou ausência de piscar) e movimentos não naturais; assim como inconsistências no fundo e na iluminação.

Áudios também podem ser falsificados e podem conter frases truncadas; variações de tom inflacionadas no discurso; inconsistências no modo de comunicação do orador; falta de relevância do contexto da mensagem para discussões recentes; e inconsistências nos sons de fundo em relação ao local presumido do orador.

A abordagem eficaz para combater deepfakes nas eleições envolve uma combinação de ferramentas tecnológicas avançadas, legislação robusta e educação pública. Dessa forma, aumentamos a resiliência da sociedade, especialmente em períodos eleitorais. O TSE está encarando o problema com a seriedade devida e cabe a nós reagirmos coletivamente, construindo os meios para barrar mais esse ataque à democracia.

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