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José Leon Crochík e Pedro Fernando da Silva

Sobre bullying e preconceito na escola

Dissociar a violência das tendências sociais estruturalmente violentas equivale a responsabilizar as pessoas individualmente

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José Leon Crochík

Professor sênior do Instituto de Psicologia da USP, é autor de "Preconceito, Indivíduo e Cultura" e coautor de "Bullying, Preconceito e Desempenho Escolar: Uma Nova Perspectiva" (Benjamin Editorial)

Pedro Fernando da Silva

Professor do Instituto de Psicologia da USP, é coordenador do LaEP (Laboratório de Estudos sobre o Preconceito); coautor de "Teoria Crítica, Violência e Resistência" (ed. Blucher) e "Fascismo e Nazismo, Preconceito e Bullying" (ed. Benjamin)

São frequentes as lastimáveis notícias sobre a violência escolar e seus efeitos destrutivos. Neste artigo, apresentamos resultados de pesquisas desenvolvidas pelo Laboratório de Estudos sobre o Preconceito (LaEP), do Instituto de Psicologia da USP, e por colegas de outras universidades, sobre duas dessas formas de violência, o preconceito e o bullying:

1 - A violência escolar abrange as dimensões psíquica e institucional, mas só pode ser compreendida em sua determinação social. Dissociá-la das tendências sociais estruturalmente violentas equivale a responsabilizar as pessoas individualmente;

Bullying virtual também é prática recorrente de violência no ambiente escolar - Karime Xavier-11.01.2012/Folhapress

2 - O preconceito manifestado nos indivíduos provém de tendências culturais dirigidas contra grupos minorizados, depositários do desconforto com o não idêntico. É composto por estereótipos culturalmente produzidos e utilizados para justificar atitudes hostis contra alvos específicos, expressando-se ao menos de três formas: a) hostilidade direta; b) afeto exagerado em relação ao alvo que gostaria de agredir; e c) indiferença. É uma atitude que tem como ação correspondente a discriminação e pode se desdobrar na marginalização e na segregação. Compreende mecanismos psíquicos como a projeção de medos e impulsos não reconhecidos e nem suportados sobre quem é percebido como alvo. No atual clima cultural, o conservadorismo moral o alimenta, favorecendo a rejeição aos que não professam os mesmos valores;

3 - As vítimas do preconceito não podem ser responsabilizadas pela violência que sofrem. Quem é preconceituoso em relação a um determinado grupo tende a ser também em relação a vários outros. Essa tendência é paradoxalmente compatível com o fato de que o preconceito dirigido a um determinado alvo tem alguma distinção do que é dirigido contra outros;

4 - O bullying é uma ação hostil, com motivação, forma e efeitos próprios. Os modos de provocação e agressão que o caracterizam permanecem durante algum tempo contra um mesmo alvo, que não consegue se defender de modo efetivo. Culturalmente, é suscitado pela tendência a ser melhor do que os outros, a ser o primeiro; compreende a tendência à dominação e à destruição da vontade alheia, tal como no assédio e no estupro;

5 - O preconceito é autoritário, consiste na defesa contra o que inconscientemente não é suportado; o bullying é antidemocrático, consiste na manifestação direta do ímpeto de destruição. Como esta sociedade é contraditória, abriga tendências autoritárias, antidemocráticas, mas também democráticas;

6 - Os autores de bullying tendem a se destacar em esportes, a ser mais populares e a ter, segundo seus colegas, baixo desempenho nas disciplinas ministradas em sala de aula; os que são alvos do bullying tendem a ser impopulares e também a apresentar baixo desempenho acadêmico; já os alunos que não se envolvem com o bullying, nem como autores nem como alvos, apresentam bom rendimento nas disciplinas, baixo nos esportes coletivos e percepção de maior pertencimento à escola;

7 - Como nossas pesquisas indicam, os alunos que se sentem incluídos na cultura que a escola transmite tendem a defendê-la. Logo, é recomendável que os educadores concedam maior atenção aos estudantes que têm mais dificuldades, pois o desenvolvimento de sua autonomia pode advir da percepção de que a cultura lhes pertence.

Os indivíduos melhor esclarecidos e efetivamente apoiados têm maiores possibilidades de prescindir da violência e de não se tornarem os seus alvos. Enquanto predominarem relações de dominação não será possível realizar uma cultura da paz, mas é possível entender o que a impede —o que não é pouco.

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