Descrição de chapéu Eleições 2020

Veja perguntas incômodas sobre 'esqueletos no armário' de candidatos à Prefeitura de SP

Reportagem preparou questionamentos a Covas, Russomanno, Boulos e França sobre falhas, atos ou visões controversas

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São Paulo

Os quatro candidatos mais bem posicionados na corrida eleitoral para a Prefeitura de São Paulo têm seus esqueletos no armário, seja por falhas nos períodos em que ocuparam cargos públicos, seja por inconsistências ideológicas.

Veja, a seguir, cinco perguntas incômodas preparadas pela Folha para os postulantes ao posto de chefe do Executivo municipal a partir de 2021, bem como os contextos em que elas estão.

Candidatos a prefeito Bruno Covas, Celso Russomanno, Guilherme Boulos e Márcio França em campanha em SP - Divulgação

BRUNO COVAS (PSDB)

1. Adversários exibiram apoio de nomes importantes de seus partidos. O sr. foi o único a esconder seu padrinho, João Doria (PSDB), junto com o próprio partido. Por quê?

João Doria, principal nome do PSDB hoje, não aparece na campanha de Bruno Covas e também não é mencionado. Doria carrega grande rejeição após abandonar a Prefeitura de São Paulo para concorrer ao governo estadual.

Por outro lado, adversários de Covas exploram em suas campanhas a ligação do prefeito com o governador. A marca do PSDB também foi omitida em boa parte do material de campanha de Covas. A opção coincide com o momento em que a sigla foi alvejada pela Operação Lava Jato.

2. O sr. considera adequado o tipo de relação do seu vice, Ricardo Nunes (MDB), com donos de empresas locadoras de creches e entidades gestoras? Como fiscalizar o gasto de dinheiro público com relações tão próximas? Além disso, como vê a acusação que a mulher dele fez sobre violência doméstica em 2011?

O vice de Covas, vereador Ricardo Nunes, tem relação com entidades gestoras de creches conveniadas e também com donos de empresas locadoras de imóveis para as unidades. Até a empresa dedetizadora da família de Nunes prestou serviços para entidade a qual é ligado.

Além disso, Nunes foi acusado em 2011 de violência doméstica, ameaça e injúria pela esposa, com quem segue casado até hoje. Regina Carnovale registrou boletim de ocorrência contra o vereador em 2011, na 6ª Delegacia da Mulher, em Santo Amaro (zona sul).

3. A campanha do sr. diz priorizar a mobilidade, mas diminuiu a meta de corredores de ônibus de 72 km para 9 km. Mesmo assim, nem isso entregou. Por outro lado, a gestão aumentou os gastos para recapeamento, inclusive retirando verba de corredores para abastecer um programa criado para ser vitrine da eleição de João Doria ao governo. A prática não contradiz o discurso?

A gestão de Bruno Covas e João Doria orçou R$ 1,5 bilhão com corredores, mas só havia gastado R$ 245 milhões até o fim de outubro. Por outro lado, gastou R$ 1,043 bilhão, 63% do orçado inicialmente de R$ 1,648 bilhão, com recapeamento e tapa-buracos. A mesma gestão começou aumentando os limites de velocidade das marginais Tietê e Pinheiros, promessa de campanha que foi um aceno aos motoristas.

4. O sr. foi acusado de improbidade administrativa sob suspeita de direcionar duas licitações, uma do Carnaval e outra da Zona Azul. O que diz sobre isso?

Covas é alvo de ações de improbidade administrativa que tratam de direcionamentos no patrocínio do Carnaval e na concessão bilionária da Zona Azul (estacionamento rotativo).

Uma delas afirma que o prefeito participou de direcionamento do contrato de patrocínio do Carnaval de rua de 2017, feito por meio de chamamento público. A suspeita é que Covas teria orientado a empresa sobre quais itens da planilha apresentada deveriam ser alterados para vencer o chamamento público.

Em outra ação, a Promotoria diz que a gestão já havia dito que a empresa vencedora havia manifestado interesse em assumir o serviço de Zona Azul, antes mesmo da licitação. Além disso, a cobrança de outorga fixa de R$ 595 milhões até o fim de 2020 diminuiria a competitividade.

5 - A gestão do sr. só cumpriu até agora 46% das metas e não deixou nenhuma marca. Por quê?

A pouco mais de dois meses do fim do mandato, ele tinha apenas 33 das 71 metas batidas, 46% do total. Sem marcas, Covas tem se vendido como uma espécie de resolvedor de problemas, alguém que enfrentou graves crises em seu mandato, ocasiões em que ele foi pessoalmente ver e lidar com as tragédias.

Entre as metas que não foram cumpridas estão a entrega de 12 CEUs (Centros Educacionais Unificados), baixar para 30 dias de espera dos exames prioritários e implantar 10 novos parques, entre outras.


CELSO RUSSOMANNO (Republicanos)

1. Para explicar que o sr. não é racista, o sr. se utilizou de práticas consideradas racistas por grupos representativos, como alusão à ama de leite, símbolo da escravidão. E chamou homenagem ao movimento negro de vandalismo. Quais as políticas para negros vai ter em São Paulo se for eleito?

Pelo Twitter, Russomanno afirmou que a homenagem da prefeitura ao Dia da Consciência Negra, com o símbolo do punho cerrado em semáforos, era ato de vandalismo.

Para dizer que não era racista, afirmou em sabatina Folha/UOL: “Eu fui criado por uma mãe de leite negra. Eu sou uma pessoa que não vejo diferença entre os negros e os brancos. Os meus melhores, tenho grandes amigos que são negros. E tive namorada, inclusive”. A figura da ama de leite está ligada às escravas obrigadas a deixar de alimentar os seus próprios filhos para alimentar os filhos brancos dos seus senhores

2. Como o sr. pretende administrar a maior cidade do país se acumula processos por má administração de um bar, o Bar do Alemão, em Brasília?

O Bar do Alemão, do qual Russomanno era sócio e administrador, foi despejado em 2016 por não pagar aluguel ao proprietário do imóvel. Hoje, Russomanno é alvo de uma execução judicial e teve os bens bloqueados em ação que cobra cerca de R$ 7 milhões em dívidas —sua defesa contesta esse valor.

Além disso, Russomanno foi alvo de ações trabalhistas movidas por ex-funcionários do bar. Em 2016, a Folha levantou 15 ações em que garçons, barman, chefs de cozinha, cozinheiros e copeiros decidiram buscavam direitos não atendidos, segundo suas versões.

3. O sr. tem o apoio do presidente Jair Bolsonaro. Como avalia a denúncia contra Flávio Bolsonaro, que é do seu partido, e o fato de o presidente não ter parabenizado Joe Biden até agora?

O senador Flávio Bolsonaro (Republicanos), filho de Jair Bolsonaro, foi denunciado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro sob acusação de liderar uma organização criminosa para recolher parte do salário de seus ex-funcionários em benefício próprio ("rachadinha").

Em relação à eleição de Joe Biden nos EUA, Bolsonaro está entre os poucos líderes mundiais que não enviaram mensagem de congratulações —se igualando a governos ultrarradicais e minando a parceria entre os países.

4. O sr. deu apoio a Dilma Rousseff (PT) em 2010, a João Doria (PSDB) em 2018 e seu partido, o Republicanos, integra o governo do tucano em São Paulo. Integrava também a gestão do prefeito Bruno Covas (PSDB). Agora, o sr. apoia Bolsonaro. O sr. é um governista de ocasião, vai continuar pulando de galho em galho?

Russomanno aparece em vídeos e fotos dando apoio a Dilma e a Doria. Apesar de criticar o governador paulista, o Republicanos deu cinco de seis votos favoráveis ao projeto de ajuste fiscal do tucano. O partido também era aliado de Covas. O próprio Russomanno tinha indicados que trabalhavam no Procon municipal.

5. O sr. diz respeitar a ciência e não ser negacionista, mas minimiza o coronavírus e é mais votado entre quem não usa máscara ou usa a máscara de maneira incorreta. O que o sr. tem a dizer a seus eleitores sobre o uso da máscara e outras medidas comprovadas de prevenção como o distanciamento social?

Ao longo da campanha, Russomanno afirmou que o coronavírus “não dizimou ninguém” e não matou como era esperado na periferia e entre moradores de rua. Chegou a sugerir que moradores de rua tinham imunidade por falta de banho.

Também afirmou que a vacina Coronavac não era testada na China e questionou as fases de teses no Brasil. Ou seja, espalhou informações falsas que colocam a vida em risco. O coronavírus já matou mais de 160 mil brasileiros.


GUILHERME BOULOS (PSOL)

1. O plano de governo do sr. promete coisas que dependem de aprovação do Legislativo, o que demandará articulação política. O sr. está disposto a negociar cargos com partidos em troca de formar uma base aliada na Câmara Municipal?

O plano de governo do candidato tem entre as promessas elevar alíquotas do ISS (Imposto sobre Serviços) para bancos e de IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) para mansões, além de renda mínima, políticas caras ao PSOL, que prega o combate à desigualdade.

Mas o partido também é crítico ao loteamento de cargos em administrações públicas. É para conseguir articular projetos caros à gestão que prefeitos acabam cedendo secretarias e órgãos inteiros para partidos, de modo a compor base aliada.

2. O sr. participou de protestos em que houve depredação, além de ocupação de terrenos públicos e fechamento de vias. Quando protestos como esses acontecerem na gestão do sr., pretende chamar a Guarda Civil Metropolitana e pedir apoio da Polícia Militar?

Protestos do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto) por vezes fecham vias importantes e colocam fogo em pneus e entulho, o que costuma ser combatido com repressão policial e da GCM, que responde ao prefeito. Se eleito, Boulos terá que negociar com o próprio movimento do qual é hoje coordenador.

3. O sr. é réu sob acusação de ter incitado a destruição do patrimônio público em protesto contra a reintegração de posse da ocupação de Pinheirinho, em São José dos Campos (SP). Considera aceitáveis protestos com atos de vandalismo?

O candidato do PSOL se tornou réu pelas manifestações ocorridas na desocupação de uma área conhecida como Pinheirinho, onde moravam milhares de pessoas, em 2012. Boulos chegou a ser detido naquele dia e foi agredido por agentes de segurança.

Em fevereiro deste ano, o Ministério Público propos ao candidato um acordo que prevê o pagamento de reparação ao patrimônio danificado, além de estabelecer que ele não pode frequentar "locais onde seja vendida bebida alcoólica para consumo imediato" nem se ausentar da comarca por mais de 15 dias sem comunicar a Justiça. Ele ainda seria obrigado a comparecer bimestralmente ao juízo para informar suas atividades. Se cumprir o plano, a ação é suspensa.

4. O sr. é crítico da política de conciliação dos governos Lula na Presidência. Na capital paulista, grandes empresas possuem uma série de contratos com o poder público. Na gestão do sr., o sr. vai negociar com essas grandes empresas?

A capital paulista tem contratos com grandes empresas como a Construcap, construtora que se tornou concessionária do parque Ibirapuera, o mais importante da cidade. Além disso, organizações sociais tocam equipamentos públicos de saúde, como a SPDM e a Iabas. O novo prefeito terá que sentar à mesa com essas empresas se quiser governar.

5. O PT não apoiou o sr. mesmo tendo um candidato mais fraco eleitoralmente, que divide com você parte dos votos da esquerda. Isso pode custar seu lugar no segundo turno. Mesmo assim, e apesar de uma série de denúncias de corrupção que atingiram gestões petistas, o sr. pretende continuar a defender o partido e suas figuras publicamente?

O PT preferiu lançar o ex-secretário de Transportes Jilmar Tatto mesmo sabendo que Boulos tinha mais chance na corrida eleitoral. O candidato petista começou a corrida com 1% de intenção de votos e hoje tem 6%, número que, caso fosse somado ao de Boulos, daria mais tranquilidade para levar o candidato do PSOL para o segundo turno. Apesar de não ter tido apoio do PT, Boulos costuma defender suas principais figuras, como o ex-presidente Lula (condenado nos casos do tríplex de Guarujá e do sítio de Atibaia), em atos públicos.


MÁRCIO FRANÇA (PSB)

1. O tesoureiro da sua campanha, Janio Francisco Benith, é suspeito de ter sido funcionário fantasma do banco de fomento estadual Desenvolve SP com salário de cerca de R$ 25 mil enquanto o sr. foi governador. Não é uma acusação relevante por atingir pessoa tão próxima e com atuação no período em que o sr. governou São Paulo?

Entre novembro e dezembro de 2018, Benith ocupou o cargo de superintendente do setor de produtos da Desenvolve SP, com salário de cerca de R$ 25 mil. Ele foi alvo de uma investigação do comitê de ética da Desenvolve SP, que, segundo a Folha apurou, apontou que ele não foi ao trabalho nos dois meses em que ocupou a superintendência de produtos do banco.

A comissão da Desenvolve-SP calculou que o banco desembolsou mais de R$ 80 mil, em salários e benefícios, com o funcionário que não teria ido trabalhar. O relatório do grupo apontou a necessidade de abertura de processo administrativo para apurar a conduta do ex-funcionário. A ação ainda não foi concluída.

2. O sr. foi acusado em 2018 de usar a máquina pública do estado para ajudar em sua campanha a governador. Na máquina municipal, o sr. repetiria as práticas da última eleição, seja ao se lançar de novo ao Palácio dos Bandeirantes em 2022 seja em eventual campanha de reeleição?

Em 2018, recém-empossado governador depois que Geraldo Alckmin saiu para disputar a Presidência da República, o PSDB acusou o candidato do PSB de usar a máquina estadual para se eleger. Na época, os tucanos entraram em uma batalha judicial que conseguiu retirar publicidade institucional e proibir discursos de promoção pessoal em eventos públicos.

3. O sr. faz forte oposição a João Doria, mas há quatro anos, enquanto vice-governador de Alckmin, se gabava de ter sido responsável por costurar as alianças que elegeram Doria prefeito, juntamente com Covas. Até que ponto o sr. não é responsável pelo que hoje combate?

Enquanto vice de Alckmin, França articulou politicamente a chapa que elegeu Doria prefeito de São Paulo, em 2016. Na época, Doria fez vídeos agradecendo o apoio de França nas prévias. "Ele oferece seu exemplo de vida, como gestor, administrador e bom político. Uma referência não apenas para o PSB também para o PSDB, e, mais que tudo, para a política brasileira. Eu sou e estou com Márcio França", disse Doria. Desde 2018, no entanto, quando disputaram o governo do estado, França tem Doria como um de seus principais inimigos políticos.

4. O sr. foi da base aliada do ex-presidente Lula na Câmara dos Deputados, foi vice de Alckmin, já esteve próximo de Doria e, mais recentemente, acenou para Bolsonaro, acreditando que isso poderia ajudá-lo na campanha deste ano. A bússola ideológica do sr. muda conforme quem está no poder? E vai querer Bolsonaro em seu palanque no segundo turno?

Enquanto deputado federal, França foi líder dos partidos de esquerda, grupo à época chamado de bloquinho, e compunha a base de Lula. Recentemente, se encontrou com Bolsonaro em agenda do presidente em São Vicente (SP). Adversários de França o acusam de pouca consistência ideológica e de mudar de lado de acordo com quem está no comando.

5. Como governador, o sr. aliviou a punição de um médico que hoje é réu sob acusação de comandar uma organização criminosa que desviou R$ 500 milhões de verbas da saúde pública. Não se trata de conivência com a corrupção?

Em 2018, quando era governador de São Paulo, França atendeu ao recurso do médico Cleudson Garcia Montali, servidor da Secretaria da Saúde e investigado em processo administrativo por contratar clínica da qual era sócio, entre outras acusações.

Em vez de dispensa, o funcionário pegou apenas a suspensão por 30 dias do serviço público. Meses antes, ele e França estiveram juntos no interior de São Paulo.

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