Elos de França e Pontes com direita e esquerda no passado viram fardo na disputa ao Senado

Histórico dos rivais em SP volta à tona por vínculos com Lula e Bolsonaro que destoam das atuais posições

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São Paulo

O histórico de flutuação entre esquerda e direita de Márcio França (PSB) e Marcos Pontes (PL) vem sendo explorado contra os dois candidatos ao Senado por São Paulo, apoiados respectivamente por Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), os protagonistas da eleição presidencial.

O ex-governador França, filiado ao Partido Socialista Brasileiro há 34 anos, foi cobrado por sua posição fluída em outras campanhas e acabou reforçando sua ambiguidade. Na eleição ao Governo de São Paulo em 2018, João Doria (PSDB) colou nele o apelido "Márcio Cuba", em referência à ilha comunista.

O ex-astronauta Pontes, que integrou a equipe de Bolsonaro, teve suas credenciais conservadoras questionadas por Janaina Paschoal (PRTB), que disputa com o ex-ministro os votos bolsonaristas. A deputada estadual busca associar o rival a Lula e diz que ele deve sua fama ao ex-presidente.

Márcio França e Marcos Pontes
Os candidatos a senador Márcio França (PSB) e Marcos Pontes (PL) - Fotos Zanone Fraissat e Pedro Ladeira/Folhapress

Janaina aponta o uso eleitoral que o petista, então à frente do Planalto, fez em 2006 da viagem espacial do tenente-coronel.

Ela e Edson Aparecido (MDB) também relembram a filiação de Pontes ao PSB, partido pelo qual ele concorreu a deputado federal por São Paulo em 2014 e obteve 43.707 votos, mas não se elegeu. O emedebista levou o tema ao horário eleitoral, com um vídeo da época em que o rival era da legenda socialista e o comentário de que ele "muda de lado conforme a conveniência".

Segundo pesquisa Datafolha do último dia 22, França lidera a corrida, com 31%, seguido por Pontes, com 19%. Janaina marca 5%, empatada tecnicamente com Edson Aparecido e Aldo Rebelo (PDT), que têm 3%.

Se hoje França diz que é "Lula facinho" e que "para derrotar Bolsonaro sou Lula dez vezes", há dois anos ele posava para foto com o presidente —e há quatro queria "deixar bem claro" que não apoiava o PT.

"Batalhei muito para que o meu partido ficasse neutro aqui em São Paulo", disse em propaganda em 2018 sobre o fato de o PSB não ter apoiado o então presidenciável Fernando Haddad (PT) no primeiro turno.

No segundo turno, o partido endossou o petista contra Bolsonaro, mas França seguiu neutro. Desta vez, entretanto, o pessebista decidiu abrir mão da candidatura ao governo para integrar a chapa de Haddad como candidato ao Senado —e ainda indicou a mulher, Lúcia, como vice ao Palácio dos Bandeirantes.

A defesa da democracia e o combate à miséria foram seus argumentos para justificar a guinada. Mas, numa vacina à pecha de esquerdista que o atrapalhou em 2018 e em 2020, ele afirma: "Continuo o mesmo de sempre. Independente, dono das minhas próprias ideias, sem medo".

O pessebista sempre se deu bem com nomes de direita. Para desgastá-lo em 2018, Doria insistia em dizer que o rival integrava uma sigla socialista e lembrava que França fez parte do conselho político de Lula.

Em 2020, França esteve com Bolsonaro em uma inauguração em São Vicente (SP), seu berço político. Após contestações, justificou que o encontro foi para tratar de uma ajuda humanitária ao Líbano. Hoje, o pessebista posa fazendo o "L" de Lula e assume oposição claramente contrária ao presidente.

A respeito da biruta ideológica, França disse ao jornal O Estado de S. Paulo no mês passado: "Quando me perguntam se sou de esquerda ou de direita, digo que sou a direita da esquerda. Ou a esquerda da direita".

A união da esquerda no estado em torno de França envolveu convencer parte da base a aderir a um nome que até outro dia era visto com ressalvas. O PSOL, que compõe a coligação, atacou o ex-governador em 2020, quando Guilherme Boulos disputava com ele a Prefeitura de São Paulo.

Uma das táticas para deslegitimá-lo era martelar a informação de que ele se aliou a Geraldo Alckmin, até então um líder do PSDB —hoje no PSB e vice na chapa de Lula. A avaliação agora é que as resistências ao candidato ao Senado foram quebradas com a militância progressista, diante da necessidade de união.

À Folha França diz ser um conciliador e lembra sua atuação na aproximação entre Lula e Alckmin. "Sempre estive no mesmo partido. É a 19ª eleição que disputo ou participo pelo PSB", afirma ele.

"Minhas disputas, em São Vicente e no governo do estado, sempre foram contra o PT, mas reconheço que eles são democráticos. Meu apoio agora tem a ver com o momento. Bolsonaro empurrou todo mundo que é lúcido para a esquerda. Na verdade, essa posição dita de esquerda é de defesa da democracia."

No caso de Pontes, a relação dele com Lula no período da viagem ao espaço foi amistosa, mas protocolar. Já o ex-presidente foi criticado por usar eleitoralmente a ida do primeiro brasileiro para a órbita terrestre, o que custou ao país US$ 10 milhões (R$ 52 milhões hoje) e queixas da comunidade científica.

Janaina tem dito que a empreitada foi uma jogada de marketing do petista para abafar a crise do mensalão e ganhar popularidade. Na época, Pontes foi condecorado pelo governo, que lhe deu status de herói nacional, e chegou a ser descrito como garoto-propaganda. O ex-astronauta afirmou, em um texto sete anos mais tarde, que houve tentativa de distorcer "a imagem positiva da missão espacial como arma para atacar" Lula e que "o tempo, para os bem informados, já provou que tudo isso é pura calúnia".

A ida para o PSB também já foi explicada por Pontes: "Minha filiação não tem absolutamente nada a ver com a ideologia socialista ou comunista. Aliás, pouca gente sabe a diferença entre comunismo e socialismo e como o socialismo se encaixa entre o capitalismo e o comunismo", escreveu em seu site.

O ex-ministro sempre disse ter aceitado um convite de Eduardo Campos (1965-2014), que ele conheceu quando o pessebista era ministro da Ciência e Tecnologia e conduzia as tratativas para sua viagem sideral. Além disso, afirmou que buscava um partido sem escândalos de corrupção.

Na filiação seguinte, em 2018, Pontes rumou à direita e entrou no PSL, que abrigava Bolsonaro. Foi cotado para vice do então presidenciável, mas acabou participando do pleito como suplente de Major Olímpio (PSL), eleito à época senador por São Paulo e morto devido à Covid-19 em 2021.

Bolsonaristas reclamam da pouca ênfase do ex-astronauta a bandeiras ideológicas do presidente, mas mantêm o apoio devido à bênção de Bolsonaro. O candidato a senador disse à Folha, dias atrás, que prefere falar de propostas a atacar oponentes. Procurado novamente, não se manifestou.

Janaina, que se declara independente e faz campanha isolada e sem recursos, critica o que considera despreparo de Pontes e pede que os eleitores avaliem a competência dos candidatos para a função.

Professora de direito celebrizada pelo impeachment de Dilma Rousseff (PT), Janaina recebeu mais de 2 milhões de votos em 2018, a maior votação obtida em eleições ao Legislativo na história do país. De acordo com líderes bolsonaristas, a crítica que associa Pontes à esquerda não ecoa na militância, mas sua falta de combatividade é vista de forma negativa.

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