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Lula dobra aposta no Supremo como palco político central

Indicação de Dino e Gonet visa blindar governo, mas histórico desautoriza previsões

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São Paulo

A protelada dupla indicação feita por Lula (PT) para o STF (Supremo Tribunal Federal) e para a PGR (Procuradoria-Geral da República) acabou, afinal, apenas confirmando o modus operandi do presidente em seu terceiro mandato: pragmatismo em ritmo lento.

Os quase dois meses tomados para indicar Flávio Dino para o STF e Paulo Gonet para a PGR enervaram muitos aliados do petista, que tem adotado o padrão em suas decisões como forma de analisar o contexto político e deixar os nomes especulados expostos ao bombardeio usual de denúncias, insinuações e pressões.

Lula e os indicados Paulo Gonet (PGR) e Flávio Dino (STF)
Lula e os indicados Paulo Gonet (PGR) e Flávio Dino (STF) nesta segunda-feira (27) - Ricardo Stuckert/Divulgação Presidência

Como disse um ministro do Supremo ao comentar a indicação final, a montanha acabou por parir um rato, mas um roedor com o couro já curtido. E demonstra como Lula percebe o Supremo como o palco principal da política brasileira, papel que a corte tem abraçado com gosto.

Para críticos, há ativismo judicial inadequado, do excesso de declarações públicas dos ministros às dúvidas sobre o alcance e os procedimentos do inquérito das fake news. A comparação com a Suprema Corte americana vem sempre à mente, embora a propalada discrição de seus magistrados tenha sido tisnada recentemente pelo comportamento de Clarence Thomas e Samuel Alito.

Já defensores do Supremo apontam que, sem a posição firme personificada na dupla Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes, a turbulência institucional patrocinada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) poderia ter saído dos trilhos e ameaçado de fato a democracia brasileira.

O momento, com o Senado mostrando os dentes ao fazer avançar a proposta que limita decisões monocráticas de ministros da corte, algo que não ocorrera enquanto Bolsonaro esperneava contra o Supremo nas ruas, é extremamente tenso.

O voto a favor da ideia do líder do governo na Casa, Jaques Wagner (PT-BA), sugere que Lula exerceu um sutil morde e assopra, um discreto tiro de advertência.

Na hora da verdade, contudo, Lula ficou com os juízes. A escolha de Dino, animal político de grande instinto, lembra de certa forma a ida de Nelson Jobim para a corte, em 1997.

Ambas as figuras tinham saber jurídico elogiado pelos pares e vinham da pasta da Justiça, mas suas vocações estavam além dos limites do STF, como articuladores.

Com o ex-governador maranhense no plenário, Lula terá um aliado para embates retóricos. Como na sua primeira indicação à corte nesta encarnação presidencial, de seu advogado pessoal Cristiano Zanin, o critério de lealdade presumida pesou.

Lula ignorou o discurso de inclusão que clamava por uma ministra negra, como forma de mitigar duplamente a falha de representatividade social do STF, e também o PT —que, desde a escolha para vice em sua chapa de 2022 do tucano eterno Geraldo Alckmin, ora no PSB de Dino, tem tido de engolir alguns sapos indigestos.

O PT não só bombardeava Dino, mas também Gonet. Aqui, novamente Lula olhou para o outro lado da praça dos Três Poderes: o subprocurador é apadrinhado pelo duo Gilmar-Moraes. O peso da PGR é enorme, a começar pelo seu poder de apresentar denúncia contra o presidente.

Na argumentação do petista, Gonet amplia demais o poder da dupla composta pelo decano e pelo xerife do STF. Confiante de que a acomodação com a corte passa por ela, Lula foi em frente atrás de blindagem para seu governo, como já fizeram antes ele e seus antecessores.

A história, contudo, mostra que tais arranjos têm prazo de validade. A crescente politização do Supremo, seja por ativismo ou por contingências como a inação congressual, levou a corte a navegar em direções contrárias por diversas vezes nos últimos anos.

Lula certamente não esquece o voto do ministro que indicou no rumoroso julgamento do mensalão, quando na prática a política de seu primeiro mandato foi para o banco dos réus e acabou condenada.

Como outro ministro do Supremo lembrou, quem entra no plenário ganha uma perspectiva de anos ou décadas, enquanto o mandato presidencial é bem mais exíguo.

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