Novos protestos contra Bolsonaro puxados pela esquerda terão tucanos, e MBL avalia adesão

Presidente do PSDB na capital paulista chama militância para manifestação neste sábado (3)

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São Paulo

Enquanto membros da Campanha Nacional Fora Bolsonaro esperam maior adesão do público nas manifestações em defesa do impeachment do presidente Jair Bolsonaro marcadas para este sábado (3), partidos e atores políticos mais ao centro e à direita avaliam que a crise se agravou, mas ainda digerem os novos fatos com ceticismo sobre a formação de uma força de oposição mais ampla e decisiva.

As novas suspeitas de irregularidades na aquisição de vacinas contra a Covid-19, reveladas pela Folha na terça-feira (29), e o caso Covaxin, no alvo da CPI do Senado desde a semana passada, movimentaram algumas peças.

A avaliação geral é a de que Bolsonaro perdeu de vez um fundamento estruturante de seu discurso, o de que seu governo não tinha casos de corrupção –embora a tese já fosse contestada a partir de investigações de ministros e do filho Flávio por rachadinha. A expectativa é de estrago na opinião pública.

A campanha divulgou nesta quarta um balanço de 177 atos convocados em 165 cidades do Brasil e exterior.

O PSDB, que vinha se mantendo afastado dos atos, promovidos sobretudo por movimentos e partidos de esquerda, decidiu se somar aos protestos. Já o MBL (Movimento Brasil Livre), um dos protagonistas do impeachment de Dilma Rousseff (PT), resolveu consultar seguidores sobre ir às ruas ou não.

"Nosso líder Bruno Covas disse que restariam poucos dias para o obscurantismo e o negacionismo e, para que isso se concretize, é necessário que todos os que são a favor da democracia e principalmente da vida se unam contra um governo que coloca o brasileiro a venda por 1 dólar", diz nota assinada pelo presidente do diretório municipal do PSDB da capital paulista, Fernando Alfredo.

O partido convoca na nota "a militância tucana e simpatizantes para que, dentro dos protocolos, estejam presentes nessa luta em defesa da democracia".

Segundo Alfredo, o partido não quer retirar espaço de ninguém na manifestação, mas sim somar forças. "A ideia é derrubar esse cara [Bolsonaro], que não tem mais condição de exercer a Presidência. A gente abre o jornal e fica enojado com o que vê”, diz.

O dirigente tucano estima ser possível haver a participação de até mil tucanos. Ainda não está decidido se serão usados símbolos do partido, como camisetas. Também não haverá caminhão de som próprio. Caso haja convite para que lideranças do PSDB discursem no evento, será aceito, afirma o dirigente.

“Subiremos sem problema no caminhão de som que estiver lá, mesmo que seja da esquerda. Nós somos adversários em momento eleitoral”, diz.

A princípio, a participação dos tucanos será feita por dirigentes partidários e militantes, sem a presença do governador João Doria (PSDB), que é pré-candidato a presidente.

Renan Santos, coordenador nacional do MBL, afirma que sua posição pessoal é pela realização de protestos pelo impeachment. “Pessoal, tudo se encaminha pra um gigantesco esquema de roubo de vacina. Não dá pra não ir pra rua”, escreveu.

Nesta quarta-feira (30), Renan resolveu consultar a opinião de seus seguidores em um vídeo que questiona: “Você sairia às ruas contra o governo Bolsonaro?”.

O MBL debate a questão internamente e vai levar em conta opiniões nos comentários da publicação. No vídeo, Renan afirma que só há impeachment com pressão popular e comenta as suspeitas de corrupção na compra de vacinas.

“Isso não tem paralelo em nada que eu já vi na história do Brasil. [...] Se você não for pra rua, não vai ter impeachment. [...] Esse é meu recado, esse é meu desafio”, diz.

Superpedido de impeachment é protocolado em Brasília - Pedro Ladeira/Folhapress

O MBL é um dos movimentos que assina um superpedido de impeachment protocolado na Câmara dos Deputados nesta quarta, ao lado de PT, PDT, PSB, PC do B, PSOL, ex-aliados de Bolsonaro, como deputados Alexandre Frota (PSDB-SP) e Joice Hasselmann (sem partido-SP), além de outros movimentos da sociedade civil.

Diante das novas suspeitas que pesam sobre o governo Bolsonaro, houve pressão nesta quarta para que o ex-presidente Lula (PT) se manifestasse pelo impeachment, o que o petista já fez em outras ocasiões.

Membros de partidos do centro avaliam que o ex-presidente, na verdade, prefere que Bolsonaro dispute as eleições de 2022, uma vez que as pesquisas mostram a vitória do petista.

Dirigentes do PT rechaçam essa tese. Nos bastidores, uma declaração de Lula era esperada, e a explicação para a demora estaria no fato de que o ex-presidente tem calculado cada passo e evitado misturar a questão eleitoral e o impeachment.

No fim da tarde, por fim, Lula tuitou: “Parabenizo as forças de oposição ao Bolsonaro e os movimentos sociais que conseguiram unificar os mais de 120 pedidos de impeachment pra pressionar o [presidente da Câmara, Arthur] Lira. Espero que as manifestações de rua convençam o presidente da Câmara a colocar em votação”.

“Lula é a grande voz de oposição. O PT está à frente, puxando o processo de impeachment. Lula já se manifestou em redes sociais sobre isso”, disse a presidente do partido, deputada federal Gleisi Hoffmann (PR).

Gleisi disse esperar que outros setores da sociedade, além da esquerda, engrossem a mobilização popular pelo impeachment. “Só assinar o pedido não adianta”, diz.

A parlamentar afirma ainda que o novo escândalo atinge Bolsonaro em uma bandeira que lhe é cara, a do combate à corrupção.

“O fato de entrarmos com pedido de impeachment hoje não vai resultar na abertura do processo amanhã nem semana que vem, mas começa uma erosão política, que vai aumentar. Os crimes de responsabilidade já são concretos, estamos à espera da responsabilidade política do Congresso”, completa.

O também presidenciável Ciro Gomes (PDT) foi um dos que cobrou Lula. “Aliás, cadê a opinião do Lula sobre esses escândalos todos? Não fala nada porque na hora que ele falar em corrupção a turma manda ver Palocci, Sérgio Machado, Eunício Oliveira”, tuitou mais cedo.

“Não era só incompetência e negacionismo. Era propina e corrupção!”, afirmou o pedetista sobre a escalada da crise no governo.

Entre os atores de esquerda, a estratégia é ampliar os movimentos de oposição em direção ao centro e formar uma frente mais diversa, a exemplo do que ocorre no superpedido de impeachment.

Outra tática é tentar descolar os protestos do debate eleitoral de 2022, o que manteve Lula de fora dos atos até agora, apesar de incentivá-los nas redes.

Como mostrou a Folha, o crescimento da pressão pelo impeachment esbarra em pautas da esquerda que não ecoam no centro, sobretudo em relação à economia, e no receio de parte da população em convocar aglomerações ou aderir a elas na pandemia.

Hoje a Campanha Fora Bolsonaro é majoritariamente de esquerda –composta por frentes como a Povo sem Medo, a Brasil Popular e a Coalizão Negra por Direitos, que reúnem centenas de entidades, entre elas MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem Teto), UNE (União Nacional dos Estudantes), CMP (Central de Movimentos Populares) e Uneafro Brasil.

Partidos de esquerda, como PT, PSOL, PC do B, PCB, UP, PCO e PSTU, também integram a organização dos atos.

A segunda manifestação teve novas adesões —centrais sindicais, o Movimento Acredito e siglas como PSB, PDT e Rede, que dizem não estimular as aglomerações, mas não proibiram a presença de seus quadros. Já o Cidadania anunciou apoio oficial às manifestações.

“Se houver manifestações sem bandeiras partidárias, fatalmente todos iriam embarcar, revivendo o movimento dos caras-pintadas [contra Collor]. O governo entrou num caminho sem volta. Quem se mantiver junto com esse governo vai ter seríssimos prejuízos de popularidade”, afirma o deputado federal Júnior Bozzella, presidente do PSL de São Paulo.

As últimas revelações sobre propina e os desdobramentos do depoimento dos irmãos Miranda na CPI são temas de conversas bilaterais entre líderes e presidentes de partidos que não embarcaram de vez na oposição ou que dão sustentação ao governo.

A grande questão é se ou quando partidos do centrão abandonarão Bolsonaro. Na esquerda, esse movimento é esperado, a exemplo do que aconteceu com Dilma.

“Sinto Bolsonaro cada mais isolado. A posição de partidos da centro-direita de negar o voto impresso é um dado. O aumento de entidades e unidade para o pedido de impeachment hoje é outro fato”, afirma João Carlos Gonçalves, o Juruna, secretário-geral da Força Sindical.

Caciques de partidos do chamado centro avaliam, nos bastidores, que o governo Bolsonaro está sendo corroído crise após crise e que uma acusação de corrupção é o principal revés até agora, mas acham improvável que haja impeachment.

Primeiro, porque o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), não demonstra disposição em levar o impeachment adiante. Em segundo lugar, o vice-presidente, Hamilton Mourão (PRTB), tampouco articula para isso e lhe faltaria peso político.

Na leitura de representantes do centro, o centrão tira mais proveito da degradação de Bolsonaro do que da sua remoção. O presidente do MDB, deputado federal Baleia Rossi (SP), diz que as acusações de corrupção preocupam os partidos.

“Fatos narrados na CPI são relevantes e preocupantes e exigem do governo uma resposta.
São denúncias graves, que precisam de apuração. Claro que a oposição tem uma posição mais crítica e busca um desgaste maior, mas todos, direita, esquerda ou centro, estão exigindo respostas claras”, afirma.

O presidente do Cidadania, Roberto Freire, esteve nas últimas manifestações e diz que irá novamente no sábado. Para ele, novas adesões não virão de partidos, mas da própria população, o que por sua vez mobilizará parlamentares.

“É mais um movimento difuso da sociedade do que de partidos. O que fica evidente é que o processo de impeachment está em pleno andamento. Se vai ter sucesso, hoje a gente ainda não pode dizer.”

“Esperamos um público maior, espontâneo mesmo. Que começa a se revoltar com esse envolvimento direto [do governo] em corrupção. O caso atinge o líder do governo, do centrão, e fragiliza o setor que dá sustentação a Bolsonaro na Câmara”, afirma Josué Rocha, coordenador do MTST.

O deputado federal Marcelo Freixo (PSB-RJ) também aposta em manifestações maiores, movidas pelo clima de insatisfação. “É impressionante como bolsonarismo encolheu nas redes, porque não conseguem se defender”, diz.

“É a primeira vez que há uma manifestação muito ampla, com partidos de centro, todos com um único compromisso em comum que é a defesa da democracia”, afirma sobre o pedido de impeachment.

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