Tatiana Prazeres

Executiva na área de relações internacionais e comércio exterior, trabalhou na China entre 2019 e 2021

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China passa a ser sócio incontornável de uma Argentina em queda

Pequim vê oportunidade em ativos desvalorizados pela crise econômica argentina

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“A verdadeira amizade se destaca em tempos de adversidade.” Com essas palavras, Alberto Fernández agradeceu a Xi Jinping por doações que a China ofereceu à Argentina para o combate à pandemia, numa carta recente.

As adversidades da Argentina, no entanto, não se limitam à pandemia. E a amizade com a China tem enorme potencial para a recuperação econômica da Argentina. Ambos sabem disso.

Operador político experiente, Alberto Fernández, no entanto, avança com cautela, equilibrando-se entre interesses distintos —e muitas vezes conflitantes. A política externa de Fernández não é a de Cristina Kirchner, sua vice-presidente, que, enquanto liderava o país, aproximou-o da China como nunca antes, inclusive para ganhar distância dos EUA.

Fachada da Casa Rosada, em Buenos Aires - Agustin Marcarian - 4.ago.2020/Reuters

Hoje, a prioridade número 1 da política externa da Casa Rosada é reestruturar sua dívida externa. Para isso, precisa da boa-vontade de Washington no FMI. Recentemente, o governo argentino fechou acordo com um grupo de credores, mas segue em tratativas com o Fundo. Nesse período, prevalece a preocupação em não entrar em rota de colisão com os americanos.

No entanto, equacionada a questão da dívida, é certo que as circunstâncias políticas e econômicas favorecem a aproximação da Argentina com a China.

A situação econômica na Argentina é ainda pior que a do Brasil. Os argentinos precisam de investimentos para alavancar sua recuperação econômica. Mas investir no país é visto como arriscado, o que faz o crédito escasso e mais caro.

E é aí que a China entra. Pequim é que tem condições de investir na Argentina, vê oportunidade em ativos desvalorizados pela crise econômica e tem interesses estratégicos na área de segurança alimentar. Recuperando-se da sua própria crise, a China pode ter menos disponibilidade financeira e menor apetite para risco, mas isso não a impede de enxergar boas oportunidades e de pensar a longo prazo.

Além disso, as vendas do agronegócio argentino para a China têm sido basicamente a única boa notícia no cenário econômico da pandemia. Aliás, mantida a dinâmica vista no primeiro semestre, a China passará o Brasil para se tornar, neste ano, o primeiro parceiro comercial da Argentina.

Tanto como mercado de destino para exportações argentinas, mas principalmente como fonte de investimentos no país, a China tem a oferecer à Argentina o que ninguém tem —nem Brasil, nem EUA. Os chineses tornam-se sócios necessários dos argentinos e aumentam sua influência no país.

Parece questão de tempo, por exemplo, para a Argentina aderir à Iniciativa Cinturão e Rota (BRI, na sigla em inglês). A principal iniciativa da política externa de Xi Jinping ainda não teve adesão de nenhum dos três maiores países da América Latina —Brasil, México ou Argentina.

Não surpreenderá se os argentinos saírem à frente, gesto que seria altamente apreciado por Pequim. E que os argentinos saberão capitalizar. Projetos de infraestrutura e logística para exportação do agronegócio argentino, por exemplo, interessam a ambos e ganhariam impulso com o endosso da Argentina ao BRI.

Apenas nas últimas duas semanas, anunciou-se que os dois governos estariam negociando investimentos chineses de US$ 3,5 bilhões para a produção de carne de porco na Argentina. Os dois também ampliaram um acordo de swap cambial de US$ 18 bilhões, conveniente para a Argentina, com reservas limitadas, e também para os chineses, interessados no comércio mas também na internacionalização do yuan. No mesmo dia, foi também retomada a colaboração espacial entre ambos, num arranjo que inclui uma estação espacial chinesa na Patagônia .

Buenos Aires não tem muitas opções. A China passa a ser parceiro inescapável na recuperação da Argentina. Quanto maiores as adversidades argentinas, mais valor tem uma mão amiga. ​​

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