Chefs abrem as portas de casa para experiências intimistas

Reservas para até 20 pessoas oferecem aconchego, além de evitar o desperdício de comida

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Vista da da janela para o pátio da casa da chef Viviane Gonçalves, que oferece experiências intimistas para poucas pessoas Lucas Lacaz Ruiz A13

São Paulo

No outono de 1765, uma antiga padaria parisiense fez uma revolução: criou uma lista de receitas com preços e passou a servi-las em mesinhas individuais. Até então, só viajante comia fora —ou melhor, caçava um pedaço de mesa coletiva em albergues e se submetia a um prato único.

Dali para frente, restaurante virou templo da gastronomia. E, embora deva continuar assim, dá brechas a novos formatos, mais reservados, por vezes até sigilosos.

A chef Viviane Gonçalves, que promove o Chef Vivi Casa - Divulgação

Viviane Gonçalves, por exemplo, não fechou o premiado Chef Vivi, na Vila Madalena, mas mudou seu jeitinho —colocou em prática o Chef Vivi Casa, que recebe de seis a 16 pessoas por vez. Para dar forma ao projeto, trocou algumas mesas pela instalação de câmaras frias e alterou os horários de funcionamento.

Assim, Vivi se dá ao direito de receber colegas em algumas noites de segunda-feira, e até de não abrir depois de uma noitada dessas. No jardim de um imóvel dos anos 1950, no Sumaré, a cozinheira colhe PANCs, livra-se de ervas daninhas, "respeita os gnomos", replanta para a próxima estação.

"Servir na minha casa é mágico, é muito diferente de um restaurante com a porta aberta. Tem um romantismo, um resgate de valores", defende.

Seu universo paralelo tem aspecto de casa de avó, aromatizada pelo assado no forno, e menu e atendimento personalizados. "Não é sobre porcelana requintada. É sobre como vive uma chef real, que tenta entregar uma simplicidade aconchegante sem abrir mão da técnica, muito menos de ingredientes éticos", responde.

Com seus cães e gatos devidamente "guardados", Vivi já atendeu colegas —como o chef Jun Sakamoto—, críticos gastronômicos em dia de folga, e habitués dos 11 anos de seu restaurante.

No domingo (6), receberá a amiga Roberta Sudbrack para um "esquenta". "No dia 7, vamos fazer uma ‘Sessão de Segunda’ no restaurante e, na véspera, vamos nos entrosar no quintal", enumera Vivi.

Se a noite do dia 7 no restaurante está disponível pelo direct do instagram @chefvivicasa (o menu de seis tempos custa R$ 360), o convescote intimista, que já está fechado para o público, segue outras regras.

"Em casa, monto cardápios inéditos. Relembro meus anos na China, na Inglaterra e clássicos do restaurante. É bem livre", adianta Vivi, que trata de datas e horários via WhatsApp.

Servido no Ada, o curaca leva pisco, capim limão e abacaxi, e vem acompanhado de raízes crocantes e aioli - Néuton Araújo

Igualmente na zona oeste da capital, com dois gatos e dois cachorros que não sofrem com as visitas frequentes, Dadis Vilas Boas botou um sonho em prática. Seu Pingue Aqui, na Vila Anglo, lhe trouxe uma autonomia de que a chef diz jamais ter desfrutado.

Vilas Boas pode abrir uma, duas, três —ou nenhuma— vezes por semana, para até 20 pessoas, "sem chuva", como é anunciado no Instagram. A reserva é feita por DM (mensagem direta) mediante o pagamento de um valor que varia entre R$ 60 e R$ 90.

Sabendo quantas pessoas ocuparão seu quintal, e se elas têm alergias ou intolerâncias, Dadis vai às compras. Insumos, de preferência orgânicos, são achados no Instituto Chão e em fornecedores parceiros.

Proteínas do mar podem complementar a lista, assim como queijos e embutidos artesanais para as pizzas inspiradas na receita da avó, que teve uma pizzaria no litoral norte paulista.

"Não é só garantir produtos sazonais, é fazer mise en place [ordenação que antecede o cozinhar propriamente dito] com calma e saber que não haverá desperdício", avalia.

Para ela, o sistema é ecológica, financeira e humanamente melhor, pois não se gasta com alimentos que não serão usados. Também são vantagens a incidência de impostos menos austera, se comparada à de um restaurante, e o fato de que, no esquema intimista, caso o subchef perca o horário do transporte público, terá por lá mesmo um quarto para "chamar de seu".

Ambiente do Ada, da mixologista Dudah Bonatto - Néuton Araújo

Do outro lado da Pauliceia, na zona leste, a mixologista Dudah Bonatto reforça este novo cenário gastronômico. "A pandemia me trouxe uma sensação de ansiedade por ocupar o tempo. Eu tinha uma sala imensa, uma cozinha enorme e decidi adaptar tudo. Brinco que agora tenho um quartinho dentro de um bar", diz.

Em seu Ada, não há carta de drinques, nem de belisquetes, mas "capítulos" que se sucedem. Hoje, os capítulos são três ou cinco, pelo valor de R$ 120 ou R$ 180, respectivamente.

O primeiro deles evoca a lenda indígena de Eldorado e inclui o Nahuas, um "episódio suave, mas picante", com tequila, tamarindo e erva-doce.

"Transformei o mito em experiência gastro etílica. Combino coquetéis e petiscos com os mesmos ingredientes para harmonizar e para reforçar a história. É uma pitada de gastronomia na coquetelaria e um dash de coquetelaria na cozinha", define Dudah.

Para se tornar um dos sete espectadores nas noites de quarta, quinta ou sexta-feira, deve-se reservar pelo Instagram com 24 horas de antecedência. O prazo é para que, além de arrumar a casa, seja possível entender quantos e quais drinques serão feitos.

"Pode ter um vegano, vir uma grávida ou alguém ter alergia. Para evitar surpresas, respondo às mensagens com um questionário", explica.

Chef Vivi Casa

Informações e reservas via WhatsApp no (11) 99888-0064. Instagram @chefvivicasa.

Dadis

Informações e reservas pelo Instagram @pingue.aqui.

Ada

Informações e reservas pelo Instagram @ada.gastroetilica.

Erramos: o texto foi alterado

Diferentemente do que foi publicado anteriormente, o correto é "a chef" Dadi Vilas Boas, e não "o chef". O texto foi corrigido.

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