Descrição de chapéu Cenários 2023

Ano de 2023 terá mais cogumelos e algas no prato e menos picanha

Vinhos com menos álcool e preocupação com origem do alimento também estão entre tendências gastronômicas do ano

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São Paulo

Se 2022 ficou marcado pela invasão da burrata, pelos drinques sem álcool e pela consolidação das "dark kitchens", aquelas cozinhas industriais que são voltadas apenas ao delivery, o que o estômago pode esperar para o ano que acabou de começar?

Relatórios de tendências, publicações especializadas e até pesquisas do Google trazem as suas apostas, entre elas um retorno triunfal da experiência de comer fora de casa.

Análises como essas não deixam de ser um exercício de futurologia contaminado por lobbies diversos, e o que vira moda lá fora nem sempre chega à mesa do brasileiro. Ainda assim dá para cogitar algumas possibilidades.

Em uma tábua de madeira escura, são vistas fatias de linguiça de peixe produzida no Ocyá, na Barra da Tijuca, no Rio
Linguiça artesanal de peixe produzida no Ocyá, restaurante em ilha na Barra da Tijuca, no Rio - Rodrigo Azevedo/Folhapress


O sociólogo Dario Caldas, fundador do Observatório de Tendências, não tem dúvidas: 2023 vai ser o ano dos fungos. "Eles estão por toda a parte, na moda, na indústria. E na alimentação, detectamos
que cresce o interesse por eles como alimento funcional."

Os cogumelos também dão a cara no relatório de tendências elaborado pela AF&Co e pela Carbonate, duas empresas americanas de estratégia voltadas ao turismo e à gastronomia. O documento aponta que agora vai ser a vez do maitake, variedade japonesa de fungo que pode ser tostada ou frita, e consumida como uma alternativa às carnes.

Ingredientes que oferecem benefício extra à saúde, como alimentos fermentados —caso do kimchi e de picles—, estão em alta, diz Rosa Moraes, embaixadora de hospitalidade e gastronomia da Ânima Educação. Nesta seara, o que se destaca é o uso de algas, ela acrescenta.


Ela menciona a presença do ingrediente no Ceto, restaurante na Riviera Francesa com menu assinado por Mauro Colagreco —argentino à frente também do Mirazur, que encabeça a lista do 50 Best de 2019. "Uma boa parte do cardápio tem pratos com algas, que podem ter diferentes tipos e cores. Fico imaginando o potencial que há no Brasil", diz. Entre as receitas, está um zabaione (espécie de creme) feito com a matéria-prima.

É algo que vai na mesma direção do que prevê o jornal americano The New York Times, para quem 2023 vai ter gosto de mar, com algas e ouriços chegando às gôndolas.

Outras apostas? A volta dos "salgadinhos nostálgicos". "Sabe quando você vai a um coquetel e servem aperitivos esquisitos, mas você só quer quibe, risoles?", indaga Caldas. "Pois bem, vai haver um esquema misto, com mais salgadinhos para equilibrar."

Fora isso, o sociólogo ainda prevê um declínio das chamadas carnes vegetais. "As pessoas estão questionando se elas realmente indicam mais saúde ou se estão mais para alimentos ultraprocessados."
Essa busca por conhecer mais a origem do que se consome também é o palpite da chef Janaina Rueda, d’A Casa do Porco e do Bar da Dona Onça, em São Paulo.

"Vai haver uma valorização de alimentos mais limpos e mais justos", diz. "As pessoas querem saber mais de onde vem a comida e se preocupam com a forma como ela é feita, se vem de produtores locais."

E a picanha? O nobre corte bovino foi parar até na última disputa eleitoral, com o recém-empossado presidente Lula dizendo que ela voltaria com força ao churrasco do fim de semana. A julgar pela tendência no consumo de carne vermelha, contudo, isso talvez não seja bem assim.

É que, se em 2006, ainda no primeiro dos governos do PT, o brasileiro consumia uma média de 43 quilos de carne por ano, em 2022 esse número registrou o seu menor valor histórico: 24 quilos.

"A resposta é o preço", diz a economista Carla Beni, professora dos cursos de MBA da FGV, argumentando que a inflação média dos últimos quatro anos foi de 28%, enquanto que a da carne bovina foi de 78%.

"Então, de cara eu já digo que em 2023 nós iremos comer mais carne suína, que aumentou bem menos."
Moraes, da Ânima Educação, crê num desenvolvimento da charcutaria nacional, com receitas artesanais de salame, copa, bresaola e linguiças marcando presença. Dentro desse campo, a charcutaria do mar merece atenção, diz a especialista em hospitalidade. Como exemplo, está a linguiça artesanal de peixe produzida no Ocyá, restaurante em uma ilha na Barra da Tijuca, no Rio aberto em janeiro do ano passado.

A economia também deve moldar outros padrões de consumo, na opinião de Caldas, do Observatório de Sinais. Segundo ele, idas a restaurantes podem ficar restritas a poucos, e os aplicativos de entrega continuarão com força total, mas os consumidores devem passar a preferir buscar comida em vez
de pagar o preço da entrega.

Ao centro de um prato é visto um creme azul, feito de algas, servido no restaurante Ceto, instalado em um hotel na Riviera Francesa, que tem menu assinado por Mauro Colagreco
Receita que leva aspargos e creme de algas sazonais servida no restaurante Ceto, instalado em um hotel na Riviera Francesa, que tem menu assinado por Mauro Colagreco - Marion Butet Studio/Divulgação


"O esquema de retirada está se tornando mais forte, porque o preço do frete vai pesar", diz. É algo que pode ficar ainda mais forte diante de uma eventual falência da empresa que faz a intermediação entre entregadores e a plataforma iFood, líder no segmento. É o que teme a Abrasel, a associação que reúne bares e restaurantes, segundo antecipado pela coluna Painel S.A., da Folha. Isso causaria toda uma remodelação desse negócio.

"O fato é que os apps modernizaram serviços que estavam nas mãos de empresas muito tradicionais", diz Vagner Bessa, gerente de indicadores econômicos da Fundação Seade. "Foi uma inovação que pegou e que só tende a ficar mais forte com trabalho híbrido e ensino a distância."

Carla Beni, economista da FGV, crê que os restaurantes verão um afluxo, sobretudo em São Paulo. "Com o fim da pandemia, houve uma demanda reprimida. E o restaurante é a praia do paulistano."

O New York Times também aposta nessa mesma demanda reprimida. Bares e restaurantes vão investir no conjunto da experiência, inclusive com atrações musicais, no que seria uma evolução do piano bar.

Se o assunto é bar, aliás, os brasileiros podem esperar vinhos com menos álcool, que se afastam da marca de 14% de teor, segundo Paulo Brammer, diretor da escola Eno Cultura, em São Paulo. É porque hoje há maior preocupação com a saúde e porque isso se alinha com as preferências da geração Z, menos afeita ao consumo alcoólico. "São vinhos que contribuem para que você não se sinta mal no dia seguinte."

Segundo ele, o vinho tinto ainda é muito forte no país, mas uma mudança ganha força. "Não estou dizendo que 2023 vai ser o ano do vinho branco, mas é uma categoria que cresce", diz. Com bons representantes leves e frescos, a categoria vai de encontro ao clima quente no país.

O QUE PODE VIR POR AÍ

Gosto de mar 
Algas e ouriços estão em alta e devem dar as caras em gôndolas de supermercados e pratos de restaurantes

Brotando por aí 
Cogumelos ficarão ainda mais na mira, e a variedade da moda pode ser o maitake

De bandeja
Coxinha, quibes e risoles podem voltar com força aos coquetéis

Menos ressaca
Vinhos com menor teor alcoólico estão em alta no Brasil, e o vinho branco pode conquistar território no país

Comida rastreada
Clientes vão se preocupar ainda mais com a origem daquilo que comem e se ela vem de produtores locais

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