Descrição de chapéu Governo Bolsonaro

Rebaixado e sem canal com Bolsonaro, Esporte diz não temer corte de verbas

General Marco Aurelio Costa Vieira, 67, assumirá pasta no Ministério da Cidadania

São Paulo

Com o governo Jair Bolsonaro (PSL), o Esporte terá que enfrentar a mudança de status de ministério para secretaria, subordinada à pasta da Cidadania, de Osmar Terra (MDB-RS). Para tocar a transição, foi escolhido o militar Marco Aurelio Costa Vieira, 67. General três estrelas e de reserva, foi desportista militar, trabalhou como diretor-executivo de Operações da Rio-2016 e cuidou da tocha olímpica. 

Segundo ele, a perda de status na esplanada ministerial não terá como efeito direto o corte de verbas. Desde 2015, quando o orçamento da pasta —que existia desde 1995— foi de R$ 3,9 bilhões (em valores atualizados), as receitas disponíveis para a área vem diminuindo. Em 2018, o montante foi de R$ 1,5 bilhão, cerca de 0,4% do total do país.

“O fato de mudar de ministério para secretaria não vai mudar, já é um dos menores orçamentos de todos. O orçamento nunca é bom. A gente sempre vai brigar por mais. Qualquer outro vai reclamar da mesma maneira”, afirma à Folha

O futuro secretário de Esporte, Marco Aurelio Vieira, durante evento no Rio de Janeiro
O futuro secretário de Esporte, Marco Aurelio Vieira, durante evento no Rio de Janeiro - Fabiano Rocha-1.ago.17/Agência O Globo

A briga por mais dinheiro não será com o presidente. O general diz respeitar “hierarquia e disciplina” e que, por isso, deixará o diálogo com Bolsonaro para o seu superior, o ministro Terra.

 

Além da Escola de Educação Física do Exército e do trabalho na Rio 2016, qual a experiência do senhor com esporte? Sou atleta. Tinha um ranking da academia militar, eu fui o segundo melhor atleta de 1973, perdi pra um italiano que corria mais que eu. Fui melhor cavaleiro da academia militar, atleta de polo aquático, pentatlo militar, depois fui técnico da equipe de pentatlo durante 10 anos, depois dirigente da Confederação Brasileira de Desportes Terrestres até 1989.

Tenho experiência de trabalhar nesse meio das confederações, que é difícil no Brasil, mal estruturado.

Quem o indicou para a secretaria? Sua relação com os generais Heleno e Mourão ajudou? O próprio ministro [Osmar Terra me indicou]. Não vejo [a relação ajudar], são outras coisas, não influi nisso. O ministro é de um ministério que eles juntaram três áreas, ele soube da minha competência, provavelmente por intermédio do meu trabalho na Olimpíada, quando trabalhei como diretor-executivo.

Tenho ouvido aí que fui rebaixado [na Rio-2016], mas isso não é verdade, pelo contrário. Eu era diretor de Operações e como eu estava muito bem, me disseram “então pega as operações fora do Rio de Janeiro”. Peguei o futebol fora do Rio. Como fui bem, falaram “fica com a tocha”, aí foi a experiência maior da minha vida em termos de organização, 329 municípios, 329 contratos com prefeituras. Na Inglaterra, o organizador da tocha falou “general, aqui a gente teve 30 cidades da tocha e só em 28 conseguimos fazer contrato, nas outras tivemos que contornar”.

No trajeto da tocha houve alguns percalços, como os episódios em Angra dos Reis (RJ), quando apagaram a tocha, e a morte da onça em Manaus (AM). São historias meio mal contadas. No caso da onça, eu estava lá e o que aconteceu foi que, de manhã fizemos a chamada operação especial, fomos no
Centro de Instrução de Guerra na Selva, tiramos a foto com a onça e fomos embora. De tarde, os soldados brincando com a onça, tiveram esse problema, não teve nada a ver com a gente, mas a gente nunca consegue explicar isso depois que publicaram. Aí a comunicação resolveu absorver e pedir desculpas.

Na verdade, o único incidente foi em Angra, que foi uma manifestação muito feia, negócio difícil de contornar, mas que a gente tinha um planejamento adequado para isso, mas foi difícil.

O relato de pessoas que estavam na Rio-2016 à época é de que você perdeu atribuições. Isso é verdade? Não, eu acumulei funções. Logicamente que como eu estava na tocha alguém me substituía aqui [no Rio]. As pessoas tem essa impressão porque eu não estava aqui, mas eu estava no Brasil. Quando eu voltava, vinha para o Main Operation Center (MOC) e via todo o planejamento que tínhamos realizado. Toda a parte de segurança eu fazia, praticamente sozinho, porque era o único militar.

Como você avalia o legado olímpico? Diria que foi bom, mas poderia ter sido muito melhor, e agora precisamos administrá-lo.

Poderia ter sido melhor se o Brasil soubesse aproveitar uma senhora oportunidade de negócios, de esporte, de projeto para imagem do país. O Brasil não tratou isso com a devida importância. Havia problemas políticos, era época de impeachment [da presidente Dilma Rousseff], então os Jogos foram prejudicados pelas condições que o país vivia naquela época. Não foi nem culpa de ninguém, o Brasil estava em condições precárias para realizar o evento.

Não há responsabilidade do Comitê Olímpico ou do Ministério do Esporte pelo legado não ter sido o que poderia ser? Acho que não. Todo o trabalho do Comitê Olímpico Internacional é baseado em contratos, então os contratos foram cumpridos? Sim. O que falta? A execução. São ferramentas de trabalho que, no Brasil, tem pouca capacidade de entrega, mas ninguém tem responsabilidade sobre isso, não houve má-fé, foi um trabalho muito bem feito.

A gente não tem a história verdadeira, a gente tem uma crítica muito grande sobre o que não aconteceu, não tem uma critica positiva para o que acontece. A gente fez quatro cerimonias de abertura com o menor orçamento até hoje de todas as Olimpíadas. Tivemos desempenho, em todos os aspectos, melhor que em todas as Olimpíadas, em segurança, em esporte. Não atrasamos nenhum treinamento ou competição. Eram 150 mil atividades por dia que eu controlava no MOC. Foram 25 milhões de refeições que entregamos.

Não acho que tenha havido irresponsabilidade, mas as condições do país, que ainda hoje estamos vivendo, eram piores ainda.

Qual o maior desafio do esporte nesse momento? É você integrar todas as facetas do nosso esporte: educacional, a participativa, de rendimento e de formação. São os quatro aspectos do esporte no Brasil, por lei. A gente tem que integrar esses aspectos. Muitos dos projetos se perdem no caminho por mudança de governo, por falta de um sistema. Uma das metas vai ser sistematizar isso de forma que a gente consiga melhores resultados.

A gente já evoluiu muito. Existe um sistema legal de patrocínio, uma bolsa atleta, isso é uma grande evolução. Temos que aperfeiçoar isso para criar um sistema, e aí acho que é um ponto nevrálgico, que atenda principalmente ao lado educacional. O esporte tem que chegar lá na educação e no nível da formação, na escola.

Mas então não seria melhor a secretaria fazer parte do Ministério do Educação e não da Cidadania? Acho que são assuntos correlatos. O esporte é cidadania, sim, e acho que faz sentido. Em uns países é um aspecto de educação, em outros de cidadania, em outros inclusive militar. Acho que está adequado, verificando a característica do próprio governo e como ele tenta racionalizar os ministérios.

Mas não pode dificultar o laço entre esporte e educação? Não, o importante é a entrega. Tanto faz se é ministério ou secretaria, se você tiver uma racionalidade e organização com a politica publica adequada você faz com que os seus planejamentos sejam entregues. A política pública é que é importante. Atender o cidadão e nesse aspecto nós estamos muito bem.

 

Como vai ser a dinâmica com o Osmar Terra? É de ministro para secretário, relação normal de trabalho.

Você terá contato direto com o Bolsonaro ou com a cúpula do governo? Não, meu contato é com ministro, eu raciocino com hierarquia e disciplina. Quem trabalha com presidente é o ministro.

Como está a transição do ministério para secretaria? Fizemos um processo de transição com análise de estrutura e pessoal. Estamos fazendo uma proposta e o ministro [Leandro Cruz] está analisando. Essa proposta vai ser conjugada com as dos demais ministérios [Desenvolvimento Social e Cultura] e com isso a gente vai chegar a uma forma e um conteúdo, e apresentar um modelo para começar o trabalho.

Vocês ainda vão apresentar essa proposta? Estamos trabalhando nisso.

A princípio nada muda. O que muda é a estrutura. Vão continuar existindo secretarias, só vai mudar o nome porque não pode haver dobramento de nomenclatura, constitucionalmente. A estrutura será muito parecida, só uma questão do que era comum aos três ministérios vai passar para a Cidadania e o restante vai funcionar como funciona até hoje.

O então ministro da AGU, Antonio Dias Toffoli, e o general Marco Aurélio Costa Vieira, então comandante da 12ª Região Militar, durante visita ao CIGS - Centro de Instrução de Guerra na Selva, em 2009.
O então ministro da AGU, Antonio Dias Toffoli, e o general Marco Aurélio Costa Vieira, então comandante da 12ª Região Militar, durante visita ao CIGS - Centro de Instrução de Guerra na Selva, em 2009. - Valter Campanato-7.mai.09/ABr

Há previsão de corte? Qual será a mudança estrutural? Que eu saiba, não. Será uma mudança no organograma. Já é um dos menores orçamento de todos. O orçamento nunca é bom. A gente sempre vai brigar por mais. Qualquer outro vai reclamar da mesma maneira.

E sobre a lei de incentivo ao esporte? Isso é um problema que diz respeito muito mais ao Legislativo, a gente tem que conversar com a Comissão de Esporte, apresentar nossas demandas, ouvir as críticas. Quem trata disso é a comissão.

O ministério tem problemas nas prestações de conta e os comitês estão endividados. Como o senhor vai administrar essa questão financeira? Nós temos que estudar isso e ver como vamos fazer. Eu tenho que tomar pé do problema. Não posso responder isso porque eu não conheço o problema a fundo ainda.

Como o senhor vê o Brasil para Tóquio-2020 e para o Pan de Lima, em 2019? A missão do governo é uma missão de apoio, de dar condição internamente. A missão de atletas é do Comitê Olímpico e das confederações e federações brasileiras. Eu já sofri isso e sei como é, então a gente vai tentar dar as melhores condições. Mas essa missão da entrega de medalhas é da estrutura esportivo clubística e do nosso comitê.

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