Descrição de chapéu Folha, 100 E eu? jornalismo

Série E Eu? aponta falhas do jornalismo na cobertura da diversidade brasileira

Entrevistados descrevem problemas na abordagem de questões de raça, gênero e religião

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São Paulo

Indígenas, negros, refugiados, pessoas com deficiência. Evangélicos, pais de santo. Homossexuais, transexuais. Moradores das muitas periferias do Brasil.

Esses são alguns dos grupos sociais sub-representados não apenas nos altos escalões de empresas e órgãos públicos como na própria imprensa, incluindo esta Folha. Na série E Eu? – O Jornalismo Precisa me Ouvir, membros dessas parcelas da sociedade comentam a relação com a mídia e expõem as barreiras que dificultam suas ações nas esferas pessoal e profissional.

Com depoimentos em vídeo e em texto, a série integra os projetos do centenário da Folha. Assista o trailer.

No total, 13 integrantes desses grupos discutem as falhas mais recorrentes que percebem na forma como a imprensa noticia —ou não noticia— assuntos que dizem respeito a eles.

Também apontam episódios de preconceito e desinformação, embora em alguns casos vejam uma lenta melhora no panorama geral, como afirma Amara Moira, escritora e ativista do transfeminismo. “Hoje você vê a palavra travesti e não tem mais certeza de que o texto fala sobre assassinato, como há 40 anos.”

Ainda assim, vozes da periferia, como a de Eduardo Lyra, fundador do instituto Gerando Falcões, seguem sendo não apenas pouco ouvidas como também pouco compreendidas pelos jornalistas. “A imprensa ainda não entende a periferia.”

Aliás, as periferias. A dificuldade de abordar a complexidade das múltiplas periferias aparece também no âmbito religioso, como diz Jackson Augusto, ativista da teologia negra, que critica a miopia daqueles que não percebem as diferenças entre as várias manifestações da fé evangélica no Brasil.

A jornalista e pesquisadora Bianca Santana, autora de “Quando Me Descobri Negra”, critica a falta de contexto do noticiário, que “contribui para a continuidade do genocídio negro no Brasil”.

É o que acontece, diz ela, quando histórias de violência contra negros, por exemplo, não aparecem articuladas às questões estruturais, como desigualdade, preconceito e as deficiências da educação e da saúde

Para o integrante do movimento Entregadores Antifascistas Paulo Roberto da Silva Lima, o Galo, o problema não é o jornalista em si, mas “como o jornalismo funciona”. Como criticar as empresas que pagam os anúncios que sustentam as Redações?, ele questiona.

Surgem também críticas à cobertura da realidade das mulheres brasileiras. "A linguagem jornalística tem preocupação com a objetividade", afirma a poeta Stephanie Borges, "mas até que ponto isso não reforça a violência? Ao usar construções como 'suposto estupro', você coloca a palavra da denunciante em dúvida quando existem agressões óbvias".

Além disso, o jornalismo não dá a devida atenção à sexualidade de mulheres mais velhas, segundo a escritora e palestrante Isabel Dias.

Ao comentar reportagens sobre pessoas com deficiência, a atriz e ativista Tabata Contri diz que as "narrativas de superação" terminam por distorcer a imagem dessa parcela da população.

Para Veronica Oliveira, ex-faxineira e influencer, a representação caricata no jornalismo também afeta trabalhadoras domésticas. "Sempre tem uma reportagem do tipo 'filho da faxineira se formou em medicina'. Qual é a importância de dizer que é o filho da faxineira?", questiona.

A questão indígena também é tema da série. "A imprensa precisa olhar mais a fundo para as irregularidades que o governo comete", afirma o ativista Thiago Karai, para quem os jornais brasileiros, afastados da realidade dos povos originários, terminam por contribuir "para a destruição".

Há ainda pautas tratadas como secundárias, como a homofobia no futebol. Para o jornalista e escritor João Abel, a imprensa deveria discutir o que acontece fora de jogo e lembrar que o esporte "não está à parte da sociedade".

"Jornalistas precisam entender que não somos todos iguais", afirma o engenheiro sírio radicado no Brasil Talal al-Tinawi, para quem a imprensa deveria saber diferenciar histórias de imigrantes de origens diferentes, como sírios, haitianos e venezuelanos.

Todos os depoimentos foram gravados no auditório da Folha, no centro de São Paulo, ao longo de janeiro de 2021.

Assista a todos.

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