Apagão
charmoso
Quando
Kátia Vasconcelos abriu uma pequena oficina para produzir
velas artesanais, não estava preocupada em ganhar dinheiro.
Afinal, basta-lhe o suficiente para sobreviver; produção
em série é, para ela, uma ofensa, uma deturpação
da arte.
Sua paixão
é descobrir novas formas na cera e mesclar cores com
aromas, usando flores, cascas de árvores e frutas,
que, combinadas com a luz, teriam o dom de alterar o estado
psicológico das pessoas - as velas proporcionariam
uma espécie de terapia, acredita Kátia, que
vive nos fundos de uma casa na Vila Madalena. Receita velas
como se receitam remédios.
Mas os
planos da artesã foram alterados pelo medo da escassez
de energia: o sossego da oficina é, agora, perturbado
pela enxurrada de pedidos dos restaurantes em busca de uma
solução charmosa para não afastar os
clientes na hora do apagão.
Encomendam-se
velas para todos os ambientes: do banheiro à cozinha.
Das trevas,
Kátia consegue vislumbrar um avanço espiritual
nos apagões: "Serão momentos de interiorização.
Não haverá tanto apelo visual, tudo isso vai
promover um movimento interno", raciocina, numa tese
que, pelo menos na Vila Madalena, conta com adeptos.
Gente
poderosa, por motivos bem diferentes, está convencida
de que a crise pode dar mais charme à cidade.
O secretário
estadual do Meio Ambiente, Ricardo Tripoli, enxerga no medo
da escuridão a chance de apressar o projeto de despoluição
do rio Pinheiros. Já recebeu, na semana passada, sinais
positivos do presidente Fernando Henrique Cardoso, do ministro
do Desenvolvimento, Alcides Tápias, e do governador
Geraldo Alckmin. "Ganhamos força", comemora
Tripoli.
A razão
é simples: despoluídas, as águas do rio
Pinheiros podem voltar a ser bombeadas para a represa Billings
e daí a uma hidrelétrica em Cubatão.
Gera-se, assim, um excedente de energia.
Diante
do interesse governamental em liberar recursos, Tripoli suspendeu
a licitação da obra, a ser entregue à
iniciativa privada, que pagaria a despoluição
e ganharia, em troca, energia barata. "Se vier dinheiro
público, tudo vai sair mais rapidamente", informa
Tripoli, que prometeu nadar, já no próximo ano,
nas águas do Pinheiros, cujas margens se transformam
num jardim.
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