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Quem
vai para o segundo turno? Quem irá disputar com Marta Suplicy?
Quem tem chances de vencer o PT?
Como se sabe, estas são as únicas questões em
foco na campanha para a Prefeitura de São Paulo. O empate técnico
entre Maluf, Tuma, Erundina e Alckmin terminou gerando um efeito bem
ruim, a meu ver.
Pois estas eleições deveriam significar o julgamento
de Pitta e de Maluf. É por isso, evidentemente, que Marta está
em primeiro lugar. Mesmo assim, a campanha parece ser mais o julgamento
do PT do que do malufismo.
A cidade está destruída, o escândalo da máfia
dos vereadores foi total, Pitta bate recordes nacionais de impopularidade.
E Maluf, apesar da rejeição, passa incólume pela
campanha eleitoral. De certo modo, a campanha em seu todo imita o
comportamento do próprio Maluf: esquece-se sistematicamente
do passado, vira a página, assume um tom de não
é comigo.
Não digo que uma campanha municipal possa convencer alguém
de que a pena de morte é uma estupidez, de que direitos humanos
não são só para bandido, de que movimento
social não é sinônimo de bagunça, enfim,
todas as teses que fazem de Maluf um representante do conservadorismo
mais profundo e ressentido da população.
O que interessa ressaltar, entretanto, é que o malufismo
não é apenas um populismo de direita, uma
questão de opinião política, de ideologia conservadora.
Maurício Puls acaba de publicar, na coleção Folha
Explica, um bem documentado livro sobre o malufismo. Narra com
imparcialidade a trajetória política de Paulo Maluf,
nota que o malufismo substituiu o antigo ademarismo, analisa os resultados
de várias eleições e identifica, digamos assim,
as bases sociais do fenômeno.
Mas a meu ver o livro termina destacando apenas o fato de que Maluf
expressaria as opiniões de parcela significativa do eleitorado.
Creio que o malufismo é também um método, um
sistema, e seria este o ponto que a campanha eleitoral deveria pôr
em julgamento.
Desde o início da sua trajetória política, Maluf
contou sobretudo consigo mesmo; conquistou os votos dos convencionais
da Arena (o partido que sustentava o regime militar) sem ter apoio
dos generais no poder.
O procedimento, o método de Maluf, nunca foi apenas o de representar
uma tendência de opinião. Isso terminou acontecendo depois;
o poder, para o malufismo, é muito menos uma questão
de representação política, do que uma coisa que
se adquire, que se açambarca contra tudo e contra todos.
Daí a famosa persistência de Maluf; é
a certeza de que todos irão se dobrar diante do irrecusável
apelo, não de suas idéias, não de suas palavras,
mas de recursos menos abstratos.
Quando a maioria dos vereadores da Câmara Municipal terminou
mantendo Pitta no cargo, graças à negociação
fisiológica, é ainda de malufismo que se trata. O poder
é uma quantidade de postos administrativos que se compra e
se reparte entre o lumpesinato político, com a anuência
de parte do eleitorado. Não é apenas o rouba mas
faz, mas uma idéia muito paulistana da esperteza
e da tenacidade que está em jogo aqui; não
é apenas o fisiologismo tradicional, pois este existe em muitos
outros partidos.
O fisiologismo clássico envolve a formação de
uma estrutura partidária, de uma engrenagem política.
O modelo malufista é de uma estrutura empresarial; donde o
seu dinamismo incansável.
O PFL aparentemente não suporta Maluf, como não o suportavam
muitos representantes do regime militar, porque o autoritarismo, o
conservadorismo, o coronelismo, o neoliberalismo não parecem
ser valores em si para os malufistas; são instrumentalizados
num processo que diz muito mais respeito à lógica privada
do que à gestão pública.
Não creio, enfim, que se vote em Maluf apenas porque ele seja
conservador ou carismático --coisa que ele definitivamente
não é; creio que o malufismo representa bem mais a rejeição
da própria política enquanto tal --seja coronelista
e autoritária, seja reformista e democrática--, em favor
de uma concepção na qual o poder é visto como
objeto de aquisição privada, as forças policiais
como um grupo de justiceiros de aluguel, as obras públicas
como monumentos ao modo com que foram feitas, e a estrutura administrativa
como um loteamento perto dos mananciais.
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15/09/2000 - Bicadas
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25/08/2000 - O voto vândalo
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