NOSSOS
COLUNISTAS

Amir Labaki
André Singer
Carlos Heitor Cony
Carlos Sarli
Cida Santos
Clóvis Rossi
Eduardo Ohata
Eleonora de Lucena
Elvira Lobato
Gilberto Dimenstein
Gustavo Ioschpe
Helio Schwartsman
José Henrique Mariante
Josias de Souza
Kennedy Alencar
Lúcio Ribeiro
Luiz Caversan
Magaly Prado
Marcelo Coelho
Marcelo Leite
Marcia Fukelmann
Marcio Aith
Melchiades Filho
Nelson de Sá
Régis Andaku
Rodrigo Bueno
Vaguinaldo Marinheiro

Amir Labaki
labaki@uol.com.br
  31 de agosto
  Branco, míope, comunista
 

Veneza - Saí do Brasil pouco depois de dedicar uma coluna a "No Limite". Nada que escrevera antes aqui motivou tamanha repercussão. Duas horas depois do comentário estar online já havia mensagens na minha caixa de correio.
Continuo a recebê-las, quase duas semanas depois.

O placar registra, em média, cinco mensagens de apoio a meu texto para cada e-mail de crítica. Agradeço aos elogios e espero mesmo continuar contando com o privilégio da sintonia dos que os enviaram. Mas fascinante mesmo foram os ataques.

Dois dos mais fervorosos opositores ressuscitam McCarthy e me chamam de comunista (?!?), como se fosse impossível criticar o vale-tudo do capitalismo contemporâneo sem tornar-me automaticamente jurássico.

Camaradas, parodiando Churchill, acho que o capitalismo é o pior sistema do mundo, fora todos os outros, mas é preciso suportar cada companheiro de viagem... Felizmente um e-mail solidário do economista -keynesiano- Gilson Schwartz veio apazigar-me os ânimos.

Um leitor uruguaio radicalizou na investida pessoal. Por usar óculos e estar branquela na foto que ilustra a coluna, diz que meu comentário é coisa de intelectualóide que não aguentaria o tranco no purgatório tropical da Globo.

Concordo em geral com a fórmula de Oscar Wilde (não julgar pelas
aparências é ser superficial) mas acho que ela aqui não nos leva muito longe.

Depois de "Survivor", o "No Limite" americano, vem ai "Confissões",
informa o diário francês "Le Monde". Depoimentos detalhados de criminosos confessando assassinatos, estupros, infanticídios, coisas do gênero, captados para processos judiciais e tornados públicos, serão levados ao ar pela emissora a cabo Court TV. A desumanização transformada em espetáculo, o show da violência e da morte, a mercantilização dos dramas privados, a dissolução das noções básicas de vida em comunidade, tudo se agudiza, numa espiral de audiência, desespero, lucro fácil e brutalização. Não consigo entender o que tudo isso tem a ver com meu saliente abdomen.

* * *

Nenhum festival de cinema me deixa mais à vontade do que o de Veneza (labiennale). Foi o primeiro que cobri, em 1987, para ver a consagração de Louis Malle com "Adeus, Meninos". Tudo se concentra no Lido, uma ilha há quinze minutos de barco da Piazza San Marco, sempre uma esperança de refúgio no caso de uma safra excepcionalmente fraca.

Há ainda a descontração italiana -por vezes, próxima demais da pura e simples bagunça. As coisas mudaram um pouco nesta Era da Celebridade, mas ainda é possível andar aqui lado a lado de estrelas de primeira grandeza sem assistir a maiores demonstrações de histeria. Lembro-me, nas primeiras vindas (esta é a oitava), de tomar cafezinho ao lado de Mastroianni e Tognazzi, sem que ninguém os abordasse. Em Cannes, eles jamais pisariam na Croisette sem a companhia de guarda-costas.

O programa deste ano reafirma mudanças importantes. As atrações estão dispersas pelas várias mostras, sem aquela ênfase toda na competição. A multiplicação de formatos, para além da camisa-de-força do longa-metragem tradicional, consolida seu espaço. A retrospectiva do ano, dedicada a Clint Eastwood, é o ponto fraco, menos por Eastwood do que pela falta de maiores pretensões. Se lembrarmos dos ciclos dedicados ao cinema soviético e americano dos anos 20-30, no início da década de 90, dá vontade de sair puxando orelhas.

Uma rápida lida na lista de concorrentes parece reafirmar ser este mais um ano de predomínio criativo do cinema asiático. Por cinco vezes nos anos 90 o Leão de Ouro voou para o Oriente e algo leva minha intuição a apostar numa sexta viagem. A força e a variedade demonstradas pelos cinemas chinês e japonês em Cannes-2000 apenas aguçam a curiosidade frente ao que veremos
por aqui na próxima semana.


Leia colunas anteriores

24/08/2000 -
Na rota do documentário
17/08/2000 - "No limite" é circo do ultracapitalismo

10/08/2000 - Garrafa virtual
03/08/2000 - Grande Prêmio, ano 2 - o resgate
27/07/2000 - A hora do 'Oscar' europeu



| Subir |

Biografia
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A - Todos os direitos reservados.