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  20 de dezembro
  Mistura Fina
   
   

Contas que não fecham

Chega o fim do ano, está todo mundo cansado. Não é um bom momento para pedir atenção a cálculos áridos e raciocínios estreitos de perdas e ganhos. Ocorre que algumas discussões recentes requerem esse tipo de tratamento para que a ideologia, no sentido forte termo, isto é como falsa consciência, não tome conta dos espíritos.

Veja-se o debate suscitado na semana passada sobre a conveniência de se abrir mais ou não a economia brasileira ao exterior. Em outras palavras, trata-se de saber se vale a pena diminuir a tarifa cobrada de produtos importados.

Os termos da conversa opuseram liberais e protecionistas. Os primeiros, comandados pela equipe do Banco Central, pregam taxas menores em nome do choque de concorrência. Os outros, liderados pelo Ministério do Desenvolvimento, querem segurar o ritmo da abertura, de modo a preparar as empresas brasileiras para a competição.

Por ora, venceram os protecionistas. No entanto, interessa aos cidadãos entender o fundo da polêmica até para opinar, por meio do voto, quando forem chamados a tanto dentro de dois anos.

A divisão ideológica entre os grupos estaria clara - liberais à direita e protecionistas à esquerda - e os eleitores poderiam optar pelo caminho que lhes parecesse mais adequado nas eleições de 2002. Se atentarmos à argumentação dos protecionistas, porém, perceberemos uma conta que não fecha. Bom exemplo é o artigo do empresário Benjamin Steinbruch.

O presidente da Companhia Siderúrgica Nacional afirma que enquanto "os pesados encargos trabalhistas e a carga tributária excessiva" continuarem a encarecer os produtos brasileiros é necessário continuar a protegê-los. A condição, portanto, para baixar a tarifa externa - objetivo do qual ele compartilha - é diminuir o "custo Brasil", leia-se cortar benefícios que a legislação garante ao trabalhador, como o fundo de garantia com multa de 40% em caso de demissão sem justa causa, as férias remuneradas acrescidas de 1/3 do salário e o décimo-terceiro salário.

Os que se alinham nas hostes protecionistas estão dispostos a arcar com tais cortes? Não que os liberais representem uma alternativa branda para os trabalhadores. A depender deles, a desregulamentação das obrigações trabalhistas seria ainda mais veloz. O problema está justamente em que o problema do comércio exterior remete, em qualquer das duas versões (liberal e protecionista) para a competitividade, a qual, por sua vez, toca no problema de baixar o custo da mão de obra. Será que a mão de obra foi avisada?

A outra frente atacada por Steinbruch, e também mencionada pelo ex-ministro Rubens Ricupero, é o dos impostos cobrados pelo Estado à produção. Clama-se por uma reforma tributária que alivie de tal ônus os produtos brasileiros, de forma que eles se tornem mais baratos e possam enfrentar os estrangeiros.

Ora, diminuir impostos significa retirar do Estado, capacidade de realizar política social, quer dizer, menos dinheiro para aplicar em áreas como saúde, educação e salário-desemprego. Ou seja, da mesma maneira que reduzir os encargos trabalhistas implica cortar benefícios dos empregados, desonerar a produção da carga fiscal hoje existente resultará em mais enxugamento nos programas estatais. Estão conscientes disso os que dependem deles?

* Por falar, em programas sociais, é da mesma ordem de problema, a situação que Marta Suplicy e João Sayad começam a enfrentar, mesmo antes de assumir, na Prefeitura de São Paulo. Uma medida da gestão Pitta reduziu o Imposto Sobre Serviços (ISS) de algumas empresas que atuam na cidade.

Em tese, a medida parece boa, uma vez que o fato de o ISS paulistano ser mais alto do que o dos municípios vizinho têm afugentado grande número de pequena empresas de São Paulo. Com isso, a municipalidade perde arrecadação. Para as empresas cujo imposto foi reduzido (como, em outra esfera, reivindica Steinbruch), com certeza a decisão de Pitta foi muito bem-vinda.

Pelos cálculos da equipe de Sayad, contudo, a decisão de Pitta acarretará diminuição de quase R$ 276 milhões para os cofres municipais. É dinheiro suficiente para tocar nada menos que os projetos de renda mínima, bolsa-trabalho, banco do povo, começar de novo e alfabetização de adultos, de acordo com dados apresentados pela Folha ("Conheça o custo dos principais programas do PT", Folha de S. Paulo, 19.12.2000, página C-1).

Em resumo, as decisões reais a serem tomadas pelos políticos - e por nós cidadãos que os escolhemos - quase sempre envolve tirar de uns para dar a outros. A questão é de quem se tira e a quem se dá. Seria bom que o público tivesse consciência disso na hora de votar.


Livro da semana

Nas minhas (poucas) horas vagas, gosto de ler sobre os Templários, a ordem de cavaleiros medieval mais poderosa da Europa. Parece romance policial, só que aconteceu na história real.

Acaba de sair no Brasil "Os Templários" (editora Imago), em que o autor, Piers Paul Read, procura separar os fatos da montanha de ficção criada ao longo dos séculos em torno da Ordem do Templo.


Trecho

"Qual foi o veredicto da história sobre os templários? Desde a época do seu julgamento, a opinião estava dividida quanto a se eles haviam cometido ou não os crimes a eles imputados. Dante Alighieri julgou-os vítimas inocentes da cobiça do rei Filipe, ao passo que Raimundo Lúlio, o poeta, místico, missionário e teórico das cruzadas maiorquino, embora a princípio em dúvida, acabou por aceitar que as acusações feitas contra a Ordem do Templo eram verdadeiras. Contudo, ambos eram sectários: Dante tinha sido expulso de Florença pela facção apoiada por Carlos de Anjou, enquanto Lúlio, como Filipe, o Belo, era fanaticamente a favor da fusão das duas principais ordens militares".


Verso pop da semana

"No pretenden glorias ni laureles, laureles, laureles
Sólo pasan a papeles, papeles, papeles
Experiencias totalmente personales, zonales, zonales
Elementos muy parciales que juntados no son tales"

Léo Masliah, Biromes y servilletas, gravado por Milton Nascimento em "Nascimento"


Os erros do meu latim ruim

Advertido pelo colega Hélio Schwartsman, corrijo o erro de latim na primeira frase da última coluna. O certo é habemus papam e não habemos papa, como escrevi. É isso que dá ouvir Roberto Carlos em lugar de ler Cícero no original. Obrigado, Hélio.



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