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André Singer
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  26 de janeiro de 2001
  Mistura Fina
   
   

Emprego, o melhor presente para São Paulo

A notícia mais importante destes dias em que se comemora os 447 verões de São Paulo é a de que caiu o desemprego na região metropolitana. A Folha publicou na quarta-feira (24/01) os dados do Dieese/Fundação Seade. Segundo eles, a taxa média de desocupação reduziu-se de 19,3% em 1999 para 17,6% em 2000.

Ótimo, foram criados 280 mil postos de trabalho. Mas sabem quanta gente que precisa trabalhar ainda aguarda uma chance na Grande São Paulo? Eram quase 1,5 milhão em dezembro, quando costuma aumentar recrutamento temporário em função das festas natalinas.

Quantos serão neste fim de janeiro? Quantos, só na antiga vila de Piratininga, nada têm a comemorar porque amargurados pela falta de uma remuneração, já nem digo digna, uma remuneração qualquer?

É uma enormidade de gente, um mar de desespero dos quais uns poucos foram pinçados para fora da miséria no ano que passou. Os índices de 17,6% (média de 2000) ou 16,2% em dezembro, colocam a Grande São Paulo entre os lugares em que o desemprego é dos mais altos do mundo. É verdade que há uma divergência na forma de cálculo do indicador, que opõe o número apurado pelo Dieese/Seade ao do IBGE, que vem a ser o oficial do Brasil. Para o IBGE, o desemprego na região estava em 6,2% em novembro passado.

O IBGE leva em consideração apenas quem procurou emprego nos últimos sete dias, ao passo que o Dieese/Seade utiliza o período de 30 dias. Além disso, o dado do governo federal só leva em conta indivíduos acima de 15 anos, ao passo que a informação levantada pelo órgão dos sindicatos em associação com a fundação ligada ao governo do Estado de São Paulo engloba crianças de 10 a 14 anos que tenham buscado trabalho.

Seja como for, as autoridades federais, estaduais e municipais sabem que o problema é dos mais graves. Não há como fugir. Em quatro anos duplicou o número de paulistanos que citam o desemprego como principal problema da cidade. Compreende-se. De 1995, o melhor momento do Real, a 1999, quando houve a desvalorização da moeda, a população que não encontrava atividade remunerada na métropole subiu quase 50%, segundo a pesquisa Dieese/Seade. Foi de 13,2% para 19,3%. Isto é, houve um crescimento assustador sobre uma base já ruim, que caracteriza a década de 90. A forte elevação da quantidade de desempregados foi também detectada pelo levantamento do IBGE.

Note-se contudo que em 1992, o pior momento da tragédia que foi a gestão de Collor, o desemprego médio na Grande São Paulo ficou em 15,2%. Quer dizer, a situação piorou de modo significativo na administração FHC. No ano passado começou a melhorar, mas trata-se de uma recuperação vagarosa e que ainda está longe de poder modificar o quadro desolador da periferia.

Marta Suplicy e outros candidatos do PT nas capitais foram eleitos em boa parte como resposta à piora que houve nos últimos anos.

Convém lembrar que em 1996, quando Pitta foi escolhido, a situação era superior à atual e não se podia prever, então, que piorasse tanto.

A prefeita sabe disso. Encerra os festejos do aniversário paulistano no Jardim Ângela, bairro pobre da zona sul, considerado o mais violento da cidade.

Vejam o que disse Mano Brown, líder dos Racionais MCs, ao jornalista Spensy Pimentel, que o entrevistou para a revista Teoria e Debate:

"Pergunta: Qual deve ser a prioridade da luta da esquerda hoje?

Mano Brown: Dar condição para as pessoas ganharem o seu dinheiro. O povo não quer ganhar nada de graça. Ninguém quer ser filho da assistência social. O favelado tem orgulho. Se o PT ganha a eleição e começa a doar salário para as famílias que estão desempregadas, com o tempo não vai mais dar resultado. O cara que vive do seguro do governo é a parte mais baixa da sociedade. E ninguém quer ser a parte mais baixa. Nenhum ser humano quer. Todo mundo quer mostrar seu valor, seu brilho."

Mano Brown, como se sabe, é hoje um dos principais porta-vozes da violenta periferia paulistana. O desafio de ajudar a diminuir o desemprego com os instrumentos limitados da Prefeitura talvez seja até maior do que o de instituir a renda mínima, o que já não é fácil.

A gestão de Marta está apenas no começo. Oxalá no 25 de janeiro de 2002 muito mais gente tenha o que comemorar.

Livro da semana

Leio "Memórias das trevas", do jornalista João Carlos Teixeira Gomes. O volume leva por subtítulo, "uma devassa na vida de Antonio Carlos Magalhães". Até o ponto em que vou da leitura, a promessa contida na frase acima não corresponde ao texto. Na verdade, trata-se de uma autobiografia do jornalista, e não de reportagem investigativa. Para quem se interessa por política, entretanto, surgem elementos vivos do estilo de um personagem central na cena brasileira há pelo menos um quarto de século: ACM.

Trecho

""A propensão para o confronto, indicativa de temperamento impulsivo, já se manifestara em Antonio Carlos Magalhães desde a adolescência, quando freqüentava uma turma de jovens do Campo da Pólvora, zona residencial e antigo bairro histórico de Salvador, onde se realizavam anualmente as famosas "Festas da Mocidade" e depois se construiu o Fórum Rui Barbosa. Esses jovens provocadores deixaram triste fama, conhecidos pelas arruaças que ali promoviam entre meados da década de 40 e início da de 50, versão provinciana da juventude transviada simbolizada no cinema em papel desempenhado por James Dean, então no auge da sua fama de ator rebelde."

Verso pop da semana:

"Eu que moro onde o pecado mora ao lado
E me visita sempre no verão
Eu que já fui preso por porte de baseado
É baseado nisso que eu lhe digo não, não, não"

Milton Nascimento e Gilberto Gil, em "Lar hospitalar", gravada no disco "Milton e Gil".

Verso pop do fim-de-semana (apesar do verão):

"Já não sinto saudade, saudade de nada que fiz
O inverno, do tempo, da vida
Oh, Deus, eu me sinto feliz"

Cartola e Roberto Nascimento, em "O inverno do meu tempo".


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17/01/2001 - Tragédia e teoria política em Camaragibe
12/01/2001 - O fator Itamar
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