Corpo dos sonhos com uso de anabolizantes é tentador, mas pode custar caro à saúde

'Bomba' de testosterona que acelera ganho de músculos pode causar aumento de mamas e até tumor no fígado; uso contínuo aumenta riscos

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São Paulo

O vendedor fortão atrás do balcão na loja de suplementos pode até ter conquistado todos aqueles músculos se esforçando nos aparelhos, mas há um caminho mais curto e menos sofrido que talvez ele tenha tomado. Mesma coisa o malhadão que frequenta a mesma academia que você e que tem 20 vezes o seu tamanho.

Homem injeta substância em músculo do braço - Adobe Stock

O nome técnico desse atalho é anabolizante, mas pode chamar de "bomba" que ele atende. E quem levanta a possibilidade de que pessoas extremamente musculosas tenham apelado para esse truque é o médico Paulo Rosenbaum, endocrinologista no Hospital Albert Einstein.

"Tudo que parece milagre e vem de forma artificial, e não fisiológica, tem um preço que o organismo depois vai cobrar", diz. Ele explica que o uso das bombas pode parecer sedutor por conta dos resultados rápidos, mas é perigoso em qualquer idade, especialmente na adolescência.

"Geralmente tem esse papo na academia, um cara fala para o outro que encurtou o caminho, esse outro quer ficar grande mais rápido, e o assunto vira o anabolizante", exemplifica. O anabolizante, ele diz, é um método que provoca o aumento de ganho de massa muscular.

Claro que sozinha a "bomba" não faz nada —o sujeito precisa puxar os mesmos ferros de sempre, com a diferença de que os músculos aparecerão muito antes. É diferente do que fazem os suplementos alimentares, como o whey protein e a creatina, por exemplo.

"Suplementos servem para complementar nossa alimentação. Pessoas que não ingerem proteína suficiente podem ingerir whey, ou que não têm calorias suficientes em sua dieta e fazem uso dos hipercalóricos", afirma Rosenbaum.

"Só que está na moda os nutricionistas prescreverem suplemento como se todas as pessoas precisassem deles. E nós médicos sabemos que esse aporte só é necessário para atletas que fazem atividade de forma competitiva, ou em casos específicos de saúde."

De volta aos anabolizantes, o médico explica que eles são feitos do hormônio masculino testosterona, e no geral são receitados em casos de deficiência hormonal, tanto em homens quanto em mulheres. Pessoas idosas, com osteoporose, jovens com baixa produção de testosterona e/ou com problemas genéticos são alguns dos pacientes a quem o hormônio é indicado.

"Acontece que existe atualmente uma indústria que mostra corpos perfeitos, com resultados rápidos, e as pessoas que não se sentem valorizadas por seu próprio corpo veem na 'bomba' uma solução. E há do outro lado pessoas que não são médicas e têm interesse em vender seus produtos", diz.

"Essas pessoas que fazem a propaganda falam que são poucos ciclos, controlados, e que depois dá para fazer uma terapia pós-anabolizantes. Eles têm umas fórmulas que inventaram, para as quais não existe nenhum fundamento médico ou científico."

E, se o resultado a curto prazo parece tentador, com o corpo dos sonhos aparecendo no espelho, o que acontece do lado de dentro não é bonito. Quando um adolescente toma "bomba", um dos primeiros efeitos colaterais é o fim do processo de crescimento. O organismo entende que, com aquele tanto de testosterona circulando, o menino já deve ter virado homem e não precisa mais crescer.

Também é possível desenvolver infertilidade, porque um bloqueio da hipófise faz os testículos interromperem a produção de espermatozóides. O aumento da hemoglobina e dos hematócritos também pode "engrossar" o sangue, provocando fenômenos como infarto e derrame.

Isso sem falar no aumento de risco para tumores no fígado e na ginecomastia irreversível, que é quando indivíduos nascidos meninos desenvolvem mamas.

"Hoje muitas mulheres também querem ficar fortes. Com isso, ginecologistas prescrevem testosterona para elas ganharem massa muscular, mas não é só isso que elas ganham. Elas também ganham pelos e espinhas, problemas de saúde vascular e um aumento clitóris que pode ser irreversível mesmo com cirurgia", afirma.

Em 11 de abril, foi publicada no Diário Oficial da União uma resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) que proíbe a prescrição e o uso de esteroides androgênicos e anabolizantes com finalidades estéticas, de ganho de massa muscular e de melhora do desempenho esportivo.

Segundo o Conselho, não há comprovação científica sobre os benefícios e a segurança dessas terapias hormonais. "É um comércio ilegal e eu não sei como esses jovens têm acesso a essas medicações, existe um mercado paralelo", diz Rosenbaum.

Para ele, o ideal é sempre consultar nutricionistas com registro profissional válido, escolhidos por indicações e não por perfis nas redes sociais, e com a ajuda deles montar uma dieta balanceada focada no desenvolvimento muscular.

Também vale marcar uma visita a um endocrinologista, que vai checar se há alguma deficiência hormonal e, se for o caso, tratá-la.

"É preciso pensar a longo prazo. Quem usa anabolizante não fica forte para sempre, tem que continuar usando de forma recorrente. Você quer usar isso por 20, 30 anos da sua vida e correr o risco de adoecer? Ou prefere fazer exercícios de forma saudável e viver bem até os 90?."

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