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Nem Anitta nem ninguém depende do Grammy de revelação

Billie Eilish, Olivia Rodrigo e Dua Lipa, que levaram a estatueta, já eram fenômenos antes de levarem gramofone

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São Paulo

Anitta saiu do Grammy 2023 sem o prêmio de artista revelação, dado na noite deste domingo (5), na cerimônia realizada em Los Angeles. A cantora de jazz americana Samara Joy levou a melhor na categoria. A estatueta, bastante simbólica por sua história, é uma forma de reconhecimento importante dentro da indústria, mas que hoje não é capaz de mudar o status de um artista com em outras épocas.

As últimas artistas coroadas como revelação do ano já trilhavam uma carreira de sucesso antes do prêmio, e muito provavelmente continuariam sem ele. Billie Eilish já era um fenômeno quando colecionou gramofones, assim como Olivia Rodrigo ou Dua Lipa.

Anitta com look da Versace no Grammy 2023
Anitta com look da Versace no Grammy 2023 - Reprodução

Não foi o Grammy quem deu prestígio a elas, mas sim a premiação quem teve de correr atrás delas para continuar em sintonia com o que é consumido atualmente. Ser coroado na cerimônia da Academia de Gravação significa ter uma chancela da indústria fonográfica americana —nada mais, nem menos, que isso.

Para a brasileira, a premiação tem uma importância extra. Isso porque ela já tem uma carreira de mais de uma década fazendo sucesso em seu país, e ter a anuência do mercado mais influente do planeta pode facilitar consideravelmente seu projeto de se tornar famosa nos Estados Unidos, estendendo o sucesso que já tem nos países da América Latina.

É também um sinal dos tempos. No século passado, era importante ter uma referência em relação a qual disco investir dinheiro, já que só era possível escutá-lo depois de comprá-lo, seja em formato de vinil ou de CD.

Hoje, todos os indicados estão a um clique do consumidor de música, e o preço mensal do serviço de steaming não vai mudar a depender de qual álbum o ouvinte vai escolher executar. Ninguém precisa de uma premiação para em poucos minutos ouvir determinado artista ou obra e tirar suas próprias conclusões.

Além disso, o acesso instantâneo faz com que a música de diferentes partes do mundo sejam propagadas em outra velocidade e abrangência. O melhor exemplo disso é Bad Bunny, que na noite deste domingo teve o primeiro disco cantando inteiro em espanhol concorrendo na categoria de melhor álbum —uma das quatro grandes do Grammy.

Artista de Porto Rico, ele construiu uma carreira com um reggaeton moderno, embebido no trap, e no disco "Un Verano Sin Ti" faz um passeio por sonoridades latinas do presente e do passado, do mambo ao dembow. Sem acenos ao mercado americano, o reggaetonero se tornou o artista mais ouvido do mundo no Spotify não uma vez, mas por dois anos consecutivos, colecionando recordes de audiência no streaming.

Bad Bunny não emula o pop americano, não lança clipes visando ter apelo nos Estados Unidos e não tem estrelas da música do país como padrinhos. Já foi indicado em categorias menores, em anos anteriores, no Grammy, algo que teve pouca ou nenhuma influência em sua popularidade.

Quem detinha o posto de artista mais ouvido do Spotify no planeta, antes de ser destronado por Bad Bunny, era Drake. O rapper canadense, altamente influente na música pop mundial nos últimos anos, boicota o Grammy e ecoa uma reclamação de diversos artistas negros —a de que só são reconhecidos em categorias setorizadas, de gêneros como rap e R&B, e nunca nas gerais.

Drake faz parte de uma lista que inclui The Weeknd, outro gigante do streaming, e Frank Ocean, este um queridinho da crítica musical, nomes que não inscrevem seus trabalhos para consideração por não concordar com a Academia. Kendrick Lamar, um dos mais indicados ao prêmio deste ano, já endossou as reclamações.

Mas Beyoncé é quem melhor expressa essa contradição. Ela se tornou neste Grammy a pessoa mais premiada, além de já ser a mais indicada da história, mas havia ganhado somente um dos 13 prêmios a que concorreu nas categorias gerais, as quatro principais —de música, gravação, álbum e revelação do ano.

Beyoncé é hoje uma das maiores estrelas, um dos nomes mais famosos e uma das artistas mais celebradas do mundo. É algo que acontece a despeito do Grammy.

Por outro lado, são poucos os que fora dos Estados Unidos reconhecem Jon Batiste, o último vencedor do prêmio de álbum do ano, seja entre os críticos e fanáticos por música, seja pelo público mais genérico. Menos ainda os artistas de música country, grandes na terra do Tio Sam, mas pequenos fora dela, e que estão nas listas de indicados ano após ano.

E não é algo que se resume à popularidade de um artista. Rosalía, cujo álbum "Motomami" foi nome recorrente nas listas especializadas de melhores do ano, apareceu apenas lateralmente no Grammy, em categorias de vídeo e de música latina —mesmo ela sendo de Barcelona, na Espanha.

Para Anitta, ter a chancela das pessoas que ditam as regras da indústria fonográfica é estratégico, mas como parte de um plano que vem de anos, e que vai continuar independentemente da perda no Grammy. Significa superar mais uma barreira —não a maior, nem a menor— de aceitação num ambiente restrito e que não é o seu próprio, como foi cantar no Coachella, por exemplo.

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