Descrição de chapéu Filmes Oscar

William Friedkin estourou com 'O Exorcista', mas lutou para seguir em Hollywood

Após 1985, diretor vacilou entre filmes como 'A Árvore da Maldição', 'Killer Joe' e o fraco 'O Diabo e o Padre Amorth'

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São Paulo

Era a noite de 10 de abril de 1972, logo após a entrega do Oscar. Pelas avenidas largas de Los Angeles, três limusines cruzavam juntas a cidade levando um diretor de cinema cada uma. Alcoolizados, os passageiros —William Friedkin, Peter Bogdanovich e Francis Ford Coppola— berravam pelas janelas que eram os reis do mundo.

E com razão. Enquanto Coppola dominava a bilheteria americana com o primeiro "O Poderoso Chefão", Bogdanovich e Friedkin eram donos dos filmes mais indicados ao Oscar daquele ano, com oito nomeações cada um. O último ainda venceria o prêmio principal daquela noite, por "Operação França", e dois anos depois estaria de volta com outro grande sucesso —"O Exorcista", de 1973.

Cena do filme 'O Exorcista', de 1973 - Divulgação

Essa cena, contada com ares mitológicos no grande livro de fofocas que é o livro "Como a Geração Sexo, Drogas e Rock ‘n’ Roll Salvou Hollywood", de Peter Biskind, define com precisão o status que Friedkin alcançou cedo na carreira.

Aos 38 anos, o diretor morto nesta segunda-feira consagrou uma nova geração de cineastas —apelidada de nova Hollywood— por seus filmes, criando um respiro para a indústria pela forma e pela popularidade. Mas, como muitos nomes daquela época, Friedkin rapidamente se viu descartado pelos mesmos engravatados que bancaram seus maiores sucessos comerciais.

Um pouco pelas circunstâncias, em especial pela ascensão dos blockbusters —que o diretor testemunhou de perto. "O Comboio do Medo", thriller feito por Friedkin na sequência do fenômeno que foi "O Exorcista", estreou na mesma data que o primeiro "Star Wars", em junho de 1977. Se hoje um "Oppenheimer" se beneficia da popularidade de "Barbie", naquela época a produção de George Lucas implodiu o adversário.

Friedkin também não facilitou a sua vida. Ao longo dos anos e depois de dois hits, ele construiu uma reputação de difícil, brigando constantemente com produtores e membros da produção, incluindo o elenco. Sua determinação era encarada como um imenso ego, e a impossibilidade de produzir um novo "O Exorcista" nas bilheterias custou espaço a ele.

A cereja do bolo, porém, foram os filmes. Como muitos de sua geração, Friedkin nunca foi de se conformar com uma única fórmula, e o status delicado à sua volta o levou a projetos inesperados. Quando não ofensivos a determinados grupos, como "Parceiros da Noite", lançado em 1980, com Al Pacino no auge, o suspense policial despertou protestos de vários núcleos da comunidade gay, que o acusavam desde as filmagens de ser homofóbico.

Mas Friedkin seguiu lutando, mesmo que isso significasse socar a ponta da faca. Ao longo das décadas, o diretor investiu em filmes contraditórios ao momento. Como "A Árvore da Maldição", de 1990, terror no qual um casal era atormentado por uma ninfa que, disfarçada de babá, buscava sacrificar seu filho a uma árvore mágica e consciente.

Filmes como "Jade", de 1995, e "Possuídos", de 2006, dariam sequência a esse estranho projeto de vida do cineasta, intercalados a produções mais tradicionais —incluindo um remake de "12 Homens e Uma Sentença" para a TV em 1997, com Jack Lemmon e George C. Scott no elenco.

O mesmo pode ser dito de seus últimos dois filmes lançados em vida, grandes provocações a seu jeito. "Killer Joe: Matador de Aluguel", baseado em uma peça, despertou controvérsia em 2011 ao mostrar Matthew McConaughey obrigando Gina Gershon a chupar um frango do KFC na altura da sua cintura, simulando assim o sexo oral com o alimento.

O cineasta William Friedkin, diretor de 'O Exorcista' e 'Operação França', em fotografia de 2018
O cineasta William Friedkin, diretor de 'O Exorcista' e 'Operação França', em fotografia de 2018 - Gabriella Demczuk/The New York Times

Já "O Diabo e o Padre Amorth", de 2017, levou ao constrangimento. Um documentário sobre o exorcista Gabriele Amorth, a produção mostrava Friedkin acompanhando o padre no esforço de comprovar na câmera um dos seus trabalhos com uma mulher italiana. Uma tentativa pífia de capitalizar em cima da imagem do diretor de "O Exorcista", que mais lembrava um especial de TV canhestro.

Mas Friedkin, contra todas as probabilidades, se mostrou à frente da curva em todos os momentos. Enquanto "Killer Joe" chegou aos cinemas apenas três anos antes de McConaughey vencer um Oscar por "Clube de Compras Dallas", em 2014, o mesmo padre Amorth que ele registrou há seis anos se tornou um sucesso de bilheterias neste ano com "O Exorcista do Papa", terror baseado em suas experiências e com Russell Crowe no papel principal.

Além de dois filhos e da mulher, Sherry Lansing, o diretor deixa o filme "The Caine Mutiny Court-Martial", um drama de tribunal com Kiefer Sutherland e Jason Clarke. Selecionado para o próximo Festival de Veneza, o longa era mais uma chance de Friedkin encontrar um novo reconhecimento pela indústria que ajudou a erigir, junto a uma sequência de "O Exorcista" prevista para outubro. Mas, mesmo na morte, ele se foi cedo demais.

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