Descrição de chapéu Independência, 200

'Conceito de brasilidade foi consequência da guerra', diz autor em livro

Jornalista Leonencio Nossa descreve conflitos da 1ª metade do século 19 para discutir formação do Estado brasileiro

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Belo Horizonte

Um exercício para encontrar, na historiografia da Independência do Brasil, pontos cegos que ajudaram a construir os processos de formação do Estado Brasileiro.

Esse foi um dos objetivos do jornalista e escritor Leonencio Nossa, que lança "As Guerras da Independência do Brasil" em meio ao bicentenário da Independência.

A pintura mostra um povo que celebra, com os braços erguidos, num largo público. No canto da imagem, um homem negro está estendido no chão, sendo atendido por outro homem
O mural 'O Primeiro Passo para a Independência da Bahia', de Antônio Parreiras (1931), estampa a capa do livro - Ramon Lebre/Secult-GovBa

Com a obra, o autor se afasta da narrativa usual sobre a separação do Brasil de Portugal, que coloca em primeiro plano o Grito do Ipiranga, de dom Pedro 1º. Ainda que essa história esteja incluída no livro, o foco são as guerras e conflitos que moldaram a identidade brasileira e envolveram diversos personagens em todo o território.

"Procurei apresentar uma ligação entre esses episódios que ocorreram país afora e que, muitas vezes, estão desconexos entre si, como se fossem absolutamente regionais", diz Nossa, autor de livros como "Mata! O Major Curió e as Guerrilhas no Araguaia" e "Roberto Marinho - O Poder Está no Ar".

Ele recorreu a diferentes documentos e entrevistas para, ao longo de 27 capítulos, narrar as histórias de 150 conflitos, de maior ou menor dimensão, que ocorreram no Brasil entre 1808 e 1852.

O recorte se justifica pela opção de, a partir das guerras, investigar a constituição de um Estado Nacional. "Eu ousaria dizer que esse Estado brasileiro surgiu em 1808, com a chegada da família real", ele conta, apresentando o ponto de partida do livro.

Além das mudanças políticas no Rio de Janeiro e na então colônia com a mudança de dom João 6º e de sua corte, o ano também foi marcado pela vinda das guerras contra os "índios botocudos", denominação pejorativa de povos que habitavam Minas Gerais, Bahia e Espírito Santo.

"O conceito de brasilidade foi consequência da guerra, e não o contrário", escreve Nossa nas páginas iniciais. No primeiro capítulo, ele conecta as pontas de um processo que se inicia com a guerra contra os botocudos com a luta atual dos Krenak. Esse povo, diz ele, está em constante ativismo contra a companhia Vale por conta dos efeitos do rompimento das barragens na bacia do rio Doce.

O jornalista decidiu finalizar seu recorte após a Cabanagem. A rebelião que irrompeu entre 1835 e 1840 no Grão-Pará, uma província totalmente alijada do poder central, foi causada pela insatisfação popular contra o Império.

Da revolta, o autor destacou a trajetória de um personagem em específico, José Francisco Angelim, e o acompanhou até o sul do país, onde o revolucionário se envolveu com a Guerra do Prata (conflito entre Brasil, Uruguai e Argentina que se estendeu até 1852).

Terra como estopim

No centro de todas essas batalhas, está a terra, descrita como o estopim das disputas pela Independência. "A origem da guerra e do conflito no Brasil é um conceito de busca de terra desde os primeiros tempos de ocupação europeia", diz Nossa, que liga a posse de alguma propriedade ao acesso à liberdade.

Por isso, a rápida relação exposta na obra entre posse e escravidão. "Além de privar alguém de liberdade ou pegar de alguém a sua força de trabalho, a escravidão não permite que o outro seja proprietário, seja dono de terra."

Como se sabe, a questão fundiária ainda se faz bastante presente nos dias de hoje. Os conflitos em torno da demarcação de terras indígenas e quilombolas e as disputas por territórios controlados pelas milícias nos centros urbanos brasileiros são exemplos.

"É difícil dissociar a questão agrária da formação do Estado, que atua muitas vezes para manter ou tirar o direito à terra", afirma o autor.

O livro dedica muitas de suas páginas à participação de pessoas negras, indígenas e mestiças nas lutas da Independência, além de destacar o papel de ciganos, judeus, árabes e latinos europeus de diferentes classes sociais.

"Na Bahia, os pelotões foram formados por negros", conta. "E o indígena vai ter, ao longo desse processo histórico, um papel muito relevante". Para exemplificar, ele lembra o protagonismo desses povos nos conflitos do Pará e nas revoluções em Pernambuco.

As Guerras da Independência do Brasil – O Processo de Criação de um Estado Nacional nos Trópicos

  • Preço R$ 63
  • Autoria Leonencio Nossa
  • Editora Topbooks
  • Número de páginas 445
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