Descrição de chapéu Livros ilustríssima conversa

Como Oswald de Andrade conheceu Vinicius de Moraes fugindo da guerra

Podcast comenta livro que relata viagem do modernista à Europa em 1939, quando Hitler invadiu a Polônia

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Em 1939, o poeta, escritor e polemista Oswald Andrade, um dos expoentes da Semana de Arte Moderna de 1922, foi à Europa representar o Brasil num congresso do Pen Club, em Estocolmo. Àquela altura ele e sua então mulher, a poeta Julieta Barbara Guerrini, tinham decidido passar uma temporada no Rio de Janeiro, onde o modernista iria colaborar com um novo jornal e tentar reorganizar sua atividade como escritor.

O casal partiu da praça Mauá rumo a Londres, de onde iriam para a capital sueca, onde encontrariam escritores de diversos países, entre eles nomes de peso, como Thomas Mann. O que os dois não esperavam é que as tropas de Hitler fossem invadir a Polônia, dando início ao que seria a Segunda Guerra Mundial.

O escritor Oswald de Andrade. (Reprodução do livro "Obra Incompleta - Caderno de Imagens") - Reprodução

O escritor, pesquisador e também músico carioca Mariano Marovatto conta as peripécias de Oswald e Julieta na Europa em seu recém-lançado "A Guerra Invisível de Oswald de Andrade" (editora Todavia). Mariano é o convidado do Ilustríssima Conversa deste sábado (24).

"Quando Hittler invade a Polônia e dá início à Segunda Guerra Mundial, Oswald está na Inglaterra sem amigos. Ele pensa então em ir para Paris, onde tinha morado quando foi casado com Tarsila do Amaral. Só que ele chegou na França e já estava acontecendo o êxodo gigante de Paris para outros lugares, para cidades pequenas, nas fronteiras ou outros países. Enfim, tem uma série de amigos que já não existem mais. Outros morreram, outros já estão nos Estados Unidos", conta Marovatto.

O fundamental naquele momento, obviamente, era dar um jeito de retornar ao Brasil. Voltar pela Inglaterra seria complicado, porque tornara-se um perigo atravessar o canal de navio. A melhor opção era tentar ir para Portugal, país que havia se declarado neutro. O casal passou por boas aventuras antes de conseguir chegar a Lisboa –entre elas uma movimentada viagem a bordo de uma ambulância. Na capital portuguesa, entre outros episódios, o livro narra o encontro de Oswald com o jovem poeta carioca Vinicius de Moraes.

"Vinicius estava fazendo um percurso muito parecido", conta o autor. "Ele estava estudando em Oxford, no curso de literatura inglesa. Sua então mulher, Tati (Beatriz Azevedo de Mello de Moraes, jornalista, tradutora, crítica de cinema) foi visitá-lo e eles resolveram passar uma lua de mel em Paris. E aí começa a guerra. Não tinha como retornar a Londres para voltar para o Brasil. E aí sugerem para eles irem para Portugal. E os dois casais se encontram e ficam um mês juntos. É muito engraçado, porque é Vinicius no seu primeiro casamento. Oswald não sei em que casamento estava, talvez o quinto."

Para Marovatto o encontro possivelmente teve repercussões relevantes na vida de Vinicius.

"Minha tese de bar sobre esse encontro é que Vinícius se tornou Vinicius de Moraes por conta desse convívio com Oswald de Andrade, porque ele tinha acabado de sair debaixo das asas de Otávio de Faria, aquele escritor que hoje, enfim, pouco se lê, mas muito se conta. A história do rolê da literatura fala muito sobre o Otávio de Faria, que é uma pessoa conservadora, católica e não saiu do armário. Era apaixonado por Vinicius, que consegue se livrar dessa amizade um tanto quanto opressiva e opressora. Encontrando Oswald, ele vê a antítese de Otávio de Faria. Um comunista, uma pessoa que teve 500 casamentos, expansivo e explosivo. Vinicius disse que ele tinha 'um coração violento'. E eu acho que isso ficou um pouco nesse jovem Vinicius."

O livro de Marovatto, além de trazer à luz o episódio dessa interessante viagem, num momento um tanto esquecido, silencioso e melancólico da vida do poeta paulista, também fornece as necessárias referências históricas, contextualizando os acontecimentos tanto no quadro maior das tensões internacionais, quanto no universo particular de seu polêmico personagem.

O escritor Mariano Marovatto, autor do livro "A Guerra Invisível de Oswald de Andrade" (ed. Todavia)
O escritor Mariano Marovatto, autor do livro "A Guerra Invisível de Oswald de Andrade" (ed. Todavia) - Divulgação

O Ilustríssima Conversa está disponível nos principais aplicativos, como Apple Podcasts, Spotify e Stitcher. Ouvintes podem assinar gratuitamente o podcast nos aplicativos para receber notificações de novos episódios.

O podcast entrevista, a cada duas semanas, autores de livros de não ficção e intelectuais para discutir suas obras e seus temas de pesquisa.

Já participaram do Ilustríssima Conversa Bela Gil, que defendeu a remuneração do trabalho realizado por donas de casa, Javier Montes, escritor espanhol que se debruçou sobre a vida da dançarina e naturista Luz del Fuego, Paulo Arantes, professor de filosofia da USP para quem Lula terá sucesso se frear a extrema direita, Eliane Brum e Maria Rita Kehl, convidadas para o episódio comemorativo dos cinco anos do podcast, João Moreira Salles, autor de um livro sobre o modelo predatório de ocupação da Amazônia, Ailton Krenak, que abordou a tragédia do povo yanomami, Gabriela Lotta e Pedro Abramovay, que discutiram os papéis de burocratas e políticos em uma democracia, Felipe Loureiro, que analisou as relações entre EUA e Rússia depois do início da Guerra da Ucrânia, Denise Ferreira da Silva, para quem a violência racial é um pilar da modernidade, Letícia Cesarino, antropóloga que expõe como algoritmos favorecem o populismo, entre outros convidados.

A lista completa de episódios está disponível no índice do podcast. O feed RSS é https://folha.libsyn.com/rss.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.