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Mudança na Lei das Estatais encontra resistências no governo, que discute alterações no texto

Projeto aprovado pela Câmara é visto como permissivo, e intuito é prever critérios para avaliar indicados a comando das empresas

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Brasília

Diferentes integrantes do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) defendem mudanças no projeto que altera a Lei das Estatais para torná-lo menos "permissivo" na indicação de políticos para postos de comando em empresas públicas.

A intenção é fixar critérios de avaliação dos currículos dos candidatos aos cargos, bem como chegar a um meio-termo no prazo da quarentena exigida nesses casos.

Em dezembro de 2022, a Câmara dos Deputados aprovou, em votação relâmpago, um projeto que reduzia drasticamente o intervalo necessário para uma pessoa que participou de campanha eleitoral ou estrutura decisória de partido assumir cargo em diretoria ou conselho de administração de empresa estatal.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva em cerimônia no BNDES, no Rio de Janeiro - Eduardo Anizelli - 06.fev.2023/Folhapress

A Lei das Estatais, aprovada nas primeiras semanas do governo Michel Temer (MDB), previa uma quarentena de 36 meses para esses casos. A proposta da Câmara cortou esse prazo para apenas 30 dias.

A má repercussão da medida fez com que a discussão do texto fosse interrompida no Senado. Ainda não há previsão de discussão do tema na Casa.

Na época, a votação da mudança na Câmara coincidiu com a indicação, ocorrida no mesmo dia, de Aloizio Mercadante para a presidência do BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social). Ele havia sido coordenador da campanha de Lula em 2022.

A assessoria do ex-senador, porém, negou que a mudança tenha ocorrido para beneficiá-lo e disse que ele nunca exerceu função remunerada no comitê eleitoral do atual presidente. Mercadante assumiu o cargo no BNDES sem que houvesse alteração na lei.

Nos bastidores, a articulação foi conduzida pelos partidos do Centrão, que têm interesse em indicar apadrinhados políticos para postos-chave em empresas estatais. A emenda foi apresentada pelo deputado Felipe Carreras (PSB-PE), aliado do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

A proposta teve apoio suprapartidário por permitir que parlamentares não reeleitos ocupem cargos na administração federal ou até mesmo em seus domicílios eleitorais.

Dentro do governo, a avaliação é de que a lei, como está em vigor, não é de todo ruim e tem seus méritos. Por isso, flexibilizá-la nos moldes do texto aprovado na Câmara acabaria deixando a atual gestão mais vulnerável às investidas do Centrão por maior participação em cargos estratégicos do governo.

A gente não acha que aquilo que está lá [proposta de alteração da lei das estatais] seja o ideal. Se aquele prazo é o razoável ou não, estamos avaliando. [É preciso] entender por que tinha um prazo de 36 meses [de quarentena para integrantes de partido assumirem cargos em estatais] e por que [querem mudar para] 30 dias

Esther Dweck

Ministra da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos

Em entrevista à Folha, a ministra da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck, disse que a mudança na Lei das Estatais foi motivada pelo Congresso, não pelo governo de transição. No entanto, uma vez que o debate está posto, o Executivo vai avaliar a proposta e eventualmente sugerir mudanças.

"A gente não acha que aquilo que está lá seja o ideal", disse a ministra. "Eles estão propondo um prazo para uma coisa muito específica. Se aquele prazo é o razoável ou não, estamos avaliando", afirmou.

Segundo ela, é preciso "pensar qual é a lógica da lei". "Ela tem algumas questões lá que foram feitas naquele momento, e naquele ponto específico precisa entender por que tinha um prazo de 36 meses e por que [querem mudar para] 30 dias", disse.

Dweck ressaltou, porém, que não há ainda qualquer decisão sobre o tema.

Outros membros do governo ouvidos pela Folha sob reserva também criticam o texto aprovado na Câmara, duvidam de sua aprovação no Senado e, por isso, defendem mudanças.

Integrantes do Palácio do Planalto chamam o projeto de "permissivo". O problema, afirmam, não se restringe à redução do prazo de quarentena, mas à ausência de filtros na seleção dos nomes para ocupar cargos de comando nas empresas públicas.

A ideia do governo é fixar critérios para avaliar os currículos dos candidatos aos cargos, o que pode incluir a existência ou não de dívidas de campanha e a situação da prestação de contas.

A triagem também incluiria ainda uma análise criteriosa de funções exercidas previamente pelos indicados, para evitar eventuais conflitos de interesse.

A Lei das Estatais (13.303/2016) foi aprovada pelo Congresso e sancionada pelo então presidente Michel Temer em 2016. O objetivo era fortalecer a governança das estatais, blindando-as contra contra ingerência política.

Sua aprovação ocorreu na esteira de uma série de investigações que apontaram uso político das empresas em administrações anteriores, com desvios de recursos públicos. Para especialistas em governança, enfraquecer a lei pode dificultar o combate à corrupção.

Casa Civil e AGU (Advocacia-Geral da União) discutem a redação de um substitutivo para o projeto em tramitação no Senado.

A apresentação desse novo texto está atrelada, no entanto, a um julgamento do STF (Supremo Tribunal Federal) que pode acabar, por si só, flexibilizando a quarentena imposta para nomeação de políticos.

A Lei das Estatais também já foi alvo de investidas durante o governo Jair Bolsonaro (PL). O ex-presidente tentou trocar o presidente da Petrobras por insatisfação com um reajuste de preços de combustíveis e seu impacto em suas pretensões eleitorais.

Na ocasião, membros do centrão defenderam a flexibilização da lei para facilitar trocas no comando da estatal.

A proposta também já foi defendida pelo presidente da Câmara, que havia pedido mudanças na legislação após a demissão do até então presidente da petroleira feita por Bolsonaro em abril. Na época, Lira afirmou que as regras estabelecidas foram feitas para travar a Petrobras.

ENTENDA A MUDANÇA

Lei das Estatais e lei sobre a gestão das agências reguladoras hoje:

  • Pessoa que atuou, nos últimos 36 meses, como participante de estrutura decisória de partido político ou em trabalho vinculado a organização, estruturação e realização de campanha eleitoral não pode ocupar o conselho de administração ou a diretoria das estatais nem o conselho diretor ou a diretoria colegiada das agências reguladoras.

Como ficam ambas as leis com as alterações via projeto de lei em discussão no Senado:

  • Passam a permitir esses casos, desde que a pessoa que tenha atuado nessas situações comprove o seu desligamento da atividade com antecedência mínima de 30 dias à posse no cargo.

O que o governo discute articular e inserir no projeto de lei:

  • Fixar critérios de avaliação dos currículos dos candidatos aos cargos, bem como chegar a um meio-termo no prazo da quarentena exigida nesses casos.
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