Pressionados, líderes discutem se, quando e como reabrir após confinamento por coronavírus

Entenda as diretrizes da União Europeia e da Casa Branca para a retomada

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São Paulo

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Nesta confusão chamada pandemia, há quem esteja em quarentena há quase três meses.

O impacto econômico já cobra a conta, e chefes de governo pelo mundo se vêem pressionados (ou desesperados) para reabrir lojas, escolas e parques e, quem sabe, voltar a algum grau de normalidade.

O problema, caros leitores, é a ausência de uma receita de bolo.

A União Europeia (UE) fez um roteiro para seus países-membros com orientações gerais de como entrar nesta segunda fase da pandemia.

Cartaz no Teatro L'Européen, em Paris, diz "seis semanas com a bilheteria fechada, um recorde"; o país está sob medidas de confinamento há quase dois meses por causa do novo coronavírus
Cartaz no Teatro L'Européen, em Paris, diz "seis semanas com a bilheteria fechada, um recorde"; o país está sob medidas de confinamento há quase dois meses por causa do novo coronavírus - Joel Saget - 22.abr.20/AFP

A Casa Branca do presidente Donald Trump fez o mesmo —não sem antes confrontar e criticar governadores que prorrogaram, às vezes mais de uma vez, as medidas de confinamento em seus estados.

O republicano joga um joga duplo e luta para sair por cima da crise do coronavírus. Explico: se a economia colapsar, é útil que ele possa colocar a culpa nos governadores por estenderem as restrições.

Se a economia se recuperar, ainda lhe sobra espaço para dizer que ele estava certo ao defender a reabertura.

Os dois documentos partem basicamente das mesmas premissas. Vamos lá:

1.A curva tem que estar descendo e estável

Nem a UE nem Washington recomendam uma reabertura sem antes ter havido redução significativa e sustentada do número de novos casos.

Se a propagação do vírus ainda estiver subindo, o melhor é manter o lockdown, o confinamento, a quarentena —o que estiver valendo.

2. ​Testar, rastrear, monitorar

Praticamente um desdobramento do número 1: se o país/estado não tiver capacidade para testar em massa e conhecer profundamente os números, melhor não reabrir.

O risco só vale a pena se as autoridades puderem monitorar a situação e, no pior dos casos, voltar atrás para evitar o pior.

Esse é um ponto crítico para os estados americanos. A Geórgia, por exemplo, sob o governo do republicano Brian Kemp, está tomando a dianteira da reabertura nos EUA.

Ele tem planos de reabrir, até o fim da semana que vem, de lojas a cinemas e restaurantes —daqueles onde se come no local, e não só pega o pedido para comer em casa.

As autoridades de saúde, no entanto, alertam que a Geórgia não realizou testes suficientes para medir a evolução da pandemia e ter uma ideia clara do quadro —algo que se repete em outros estados americanos.

Até esta sexta, a Geórgia realizou 101.062 testes, segundo levantamento da Universidade Johns Hopkins. A Alemanha, referência nesse quesito, fazia 116 mil testes por dia na primeira semana de abril.

O estado tem 21.883 casos confirmados e 881 mortes.

Áustria e França, que também começam suas reaberturas, desenvolveram aplicativos para rastrear e avisar os contatos de quem for infectado pelo coronavírus.

O uso é voluntário, o que não deixa de ser potencialmente problemático em termos de privacidade —uma questão que por enquanto tem ficado em segundo plano.

3. Se der errado, tem que ter atendimento médico para todo mundo

Antes de começar a reabertura, as autoridades de saúde têm que imaginar o pior cenário: haverá leitos de UTI, respiradores, equipamentos de proteção, remédios, médicos e enfermeiros suficientes para atender uma nova onda de casos?

A União Europeia alerta ainda para um efeito colateral das medidas de confinamento: quem está com o vírus, tem sintomas leves e estava evitando os pronto-socorros pode mudar de ideia.

Os hospitais também podem ficar sobrecarregados com uma "demanda reprimida": quem teve outros problemas de saúde nesse período ou já recebia tratamento por outras doenças provavelmente voltará a procurar os médicos —e, portanto, têm que ser levados em consideração nessa conta.

4. Parcial, gradual, setorial

A recomendação é ir por partes. No caso de aulas: liberar alguns dias por semana primeiro, com turmas reduzidas. Idosos devem ser os últimos a receber a luz verde para sair de casa. Reabrir o comércio primeiro, com restrições de horário e número de clientes; bares, restaurantes e eventos, depois.

A Espanha começou por fábricas, a Itália pelas madeireiras, algumas lojas foram o primeiro passo de Eslováquia, Áustria e República Tcheca. Dinamarca, França e Noruega vão começar pelas creches e escolas. Algumas delas, como a Dinamarca e a Noruega, já começaram.

5. Não se mexe em time que está ganhando

As medidas de prevenção não devem ser abandonadas: lavar as mãos com frequência, uso de máscaras, distanciamento social —tudo isso pode ser mantido.

Na Espanha, por exemplo, onde a indústria já voltou a funcionar, o governo está distribuindo máscaras no transporte público.

Mesmo com todas essas recomendações, a União Europeia alerta: reabertura, mesmo, só depois de encontrarmos uma vacina.

Até lá, Reino Unido, Áustria e Alemanha estudam adotam um "passaporte da imunidade": quem já tiver sido contaminado pela Covid-19 e se recuperado ganharia passe livre para seguir com a vida.

O problema, alerta a Organização Mundial de Saúde, é que nem todos os doentes que se recuperaram desenvolveram anticorpos contra a doença, nem todos os testes para anticorpos são confiáveis e ainda não se sabe se a presença de anticorpos garante a imunidade.

Para complicar: a Coreia do Sul identificou casos de "reincidência" da Covid-19. Pessoas que já tinham se curado, mas voltaram a ter resultado positivo nos testes. Não se sabe se eles foram reinfectados, se estão realmente curados mas o vírus segue ativo em seus organismos ou se houve erros nos testes anteriores.

Ou seja: realmente, ainda não temos uma receita de bolo.

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