Descrição de chapéu China

China tira do cargo chanceler desaparecido há um mês e renomeia antecessor

Wang Yi retoma função que exerceu no ministério das Relações Exteriores do país asiático por uma década

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Taipé

Ministro das Relações Exteriores da China nos dois primeiros mandatos de Xi Jinping, Wang Yi voltou ao cargo, informou a mídia estatal do país nesta terça-feira (25). O anúncio sucede semanas de rumores em torno do paradeiro do agora ex-chanceler Qin Gang —que havia substituído o próprio Wang em dezembro.

A medida foi determinada em uma sessão especial do Comitê Permanente do Politburo, principal órgão político do país. O portal NPC Observer, que cobre o cotidiano político chinês, apontou para o fato de que a própria reunião teve um caráter excepcional. Segundo o site, encontros do órgão precisam ser marcados com ao menos sete dias de antecedência, enquanto este foi convocado na véspera.

Qin Gang, agora ex-chanceler da China, em encontro com seu homônimo egípcio, Sameh Shoukry, no Cairo - Mohamed Abd El Ghany - 15.jan.23/Reuters

O lacônico anúncio da decisão —"a mais alta legislatura da China votou para nomear Wang Yi como ministro das Relações Exteriores; Qin Gang foi removido do cargo"— só fez crescer o mistério acerca de seu desaparecimento. O diplomata saiu do radar há um mês, tendo sido visto pela última vez em 25 de junho, quando se reuniu em Pequim com o vice-chanceler da Rússia Andrei Rudenko.

Desde então, faltou a todos os seus compromissos. Na maior parte deles foi substituído por Wang, que foi à reunião de líderes da Asean (Associação de Nações do Sudeste Asiático) na Indonésia e ao encontro preparatório da cúpula do Brics na África do Sul. Também foi o diplomata quem recebeu o enviado dos EUA para o clima, John Kerry, e o ex-secretário de Estado americano Henry Kissinger em Pequim.

O decreto não deixa claro se a nomeação de Wang, que aos 69 anos teria idade avançada para o cargo, é temporária. A princípio, ele acumulará as tarefas de chefe de política externa do Partido Comunista, cargo em que assessora Xi Jinping na definição de estratégias, e de chanceler, responsável por executá-las.

Se o anúncio da volta de Wang ao ministério foi saudado por alguns, o mistério que ronda o desaparecimento de Qin também serviu para lembrar o mundo da opacidade do regime chinês.

O episódio acontece em um momento estratégico para a diplomacia do país. Depois de um prolongado isolamento durante a pandemia de Covid e enfrentando dificuldades para reconquistar investidores estrangeiros, a China buscava reforçar laços com o exterior por meio de intensa agenda internacional.

Durante a ausência de Qin, as viagens do representante diplomático da União Europeia, o espanhol Josep Borrell, e do chanceler britânico, James Cleverly, foram adiadas devido à indefinição sobre a autoridade chinesa de cargo equivalente, por exemplo. O caso ainda se dá em meio a uma tentativa de reaproximação entre Pequim e Washington após uma escalada de tensões no início do ano.

Os Estados Unidos, aliás, marcaram um momento crucial na carreira de Qin. Foi após sua breve experiência como embaixador em Washington, posição que ocupou por menos de um ano, que ele foi promovido à liderança da chancelaria chinesa, sendo o mais jovem diplomata a ocupar o cargo, aos 57 anos.

Alguns viram a passagem pelos EUA como uma espécie de estágio para a ascensão à chancelaria —o posto costuma ser concedido a oficiais de carreira com ampla experiência, e Qin serviu pouco no exterior. A função em que teve mais destaque foi a de porta-voz da pasta, entre 2006 e 2014.

Mas foi em um cargo menos glamoroso, liderando a parte de protocolo do ministério, entre 2015 e 2018, que ele teria se aproximado de Xi —segundo analistas, foi essa relação que permitiu a ele ser catapultado ao posto de chanceler. Nesse sentido, a saída de Qin teria respingado diretamente no líder chinês.

O jornal honconguês South China Morning Post descreveu o episódio como "uma das maiores crises" enfrentadas por Xi desde o início de seu inédito terceiro mandato. Um analista afirmou ao New York Times que o caso pode até não ser decisivo para o dirigente, poderoso demais para isso, mas seus críticos estavam se deleitando com a controvérsia, "embora não ousem dizer isso em público".

Intriga sobretudo como o sumiço de Qin vem sendo tratado internamente. Em geral, especular nas redes sociais e na imprensa sobre o paradeiro de uma autoridade tão sênior seria o suficiente para o regime censurar o assunto. Mas os internautas chineses têm se mobilizado em torno do tema, tendo publicado milhares de posts e vídeos sobre ele —ainda que, segundo o jornal britânico The Guardian, ao digitar no Weibo a pergunta "onde está Qin Gang?", a plataforma traga como resposta "sem resultados".

Uma das razões para isso talvez seja o melodrama insinuado por um dos boatos que explicariam a ausência. Nessa versão, a causa do desaparecimento seria uma relação amorosa com uma jornalista que trabalha para a emissora Phoenix TV, de Hong Kong, que saiu dos holofotes no mesmo período que ele.

Os dois teriam tido um bebê, mas o regime não teria aprovado o relacionamento por se tratar de um caso extraconjugal —Qin é casado e já tem outro filho. Sua carreira teria sido congelada como punição.

Outros rumores sugerem que o ex-chanceler estaria doente, explicação inicialmente dada pela chancelaria para justificar seu afastamento, mas não repetida no decreto desta terça-feira. Outros, ainda, alegam que ele foi acusado de traição, pego num caso de espionagem ou desagradado Xi com um post nas redes sociais. A última tese, de perseguição política, remete a vários casos ocorridos na China nos últimos anos.

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