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Bruna Estivalet

A Folha é o meu país

Longe de casa, jornal acalenta; é o primeiro respiro da manhã

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Bruna Estivalet

Jornalista, atua em assessoria de imprensa e conteúdo

Fevereiro é o mês do meu aniversário e o mês em que a Folha completa 100 anos. Estou longe de casa, longe da minha família, longe dos meus amigos, passei um ano tão diferente num país diferente. Eu posso afirmar que a Folha é o meu acalento e o meu primeiro respiro da manhã junto com o café aguado, bem americano, que já me acostumei a tomar aqui em Nova York.

Na vida profissional nunca trabalhei num jornal, mas sempre contei com a ajuda do veículo impresso para servir de base de pauta nas manhãs da minha rotina como produtora de TV. E a Folha, que sempre saiu na frente em tantos furos, para usar um jargão jornalístico, era a minha principal fonte de consulta na Redação. Lembro bem do dia em que uma matéria minha, que produzi para a TV Bandeirantes, foi capa da Folha. Nossa, para uma jovem de 22 anos, parecia que havia recebido o prêmio Pulitzer!



O jornal é, sem dúvida, uma grife. Influente, avançou no tempo sem perder a capacidade de inovação, credibilidade e pluralidade. Poucas empresas completaram cem anos de atuação e, no mercado de mídia, tal feito é ainda mais difícil de se conquistar devido às imensas transformações desde o surgimento da internet. Nessa era de fake news, o trabalho do jornalista se mostra cada vez mais valoroso. As redes sociais, apesar de ferramenta importante no ofício, também se tornaram o refúgio de muitos indivíduos que a utilizam para divulgar mentiras, que podem ser utilizadas para o malefício social, sobretudo quando legitimadas por artistas, influenciadores digitais, autoridades políticas etc.

As eleições de 2016 nos Estados Unidos marcaram essa nova era, com um pleito configurado pela difusão de notícias falsas, a ponto de as principais redes sociais terem que desenvolver novos algoritmos para tentar diminuir a enxurrada de inverdades. O auge no Brasil foi em 2018, quando em plena campanha eleitoral jornalistas precisaram criar departamentos para investigar se uma publicação compartilhada por milhares de pessoas em aplicativos e plataformas digitais era verdadeira ou não. E de novo a Folha estava na vanguarda. O jornal revelou naquele ano um esquema de disparos em massa de mensagens pelo WhatsApp para bagunçar a campanha presidencial, assunto que até hoje é investigado pela Justiça.



A prática de disparos online foi proibida pelo TSE a partir dessa denúncia da Folha, mas se repetiu nas
eleições de 2020, como mostrou nova reportagem do veículo. O jornal também criou nas eleições passadas uma newsletter para a checagem das fake news nas eleições. Isso para citar apenas momentos recentes referenciais que marcaram a sua atuação em prol da sociedade. Mas não há como esquecer o passado grandioso, como, por exemplo, na campanha das Diretas Já. Acho que é difícil encontrar um símbolo mais fantástico da honra de um jornal do que esse momento da Folha de S.Paulo.

As Diretas Já fazem parte da história brasileira. Faz parte, também, da história da Folha, que aderiu à campanha e foi o primeiro grande meio de comunicação a fazê-lo. O jornal experimentou uma mobilização interna sem precedentes. Externamente, disseminou e consolidou o prestígio público acumulado nos anos anteriores. Impôs-se, ao país inteiro, como uma das principais forças formadoras de opinião pública. Conquistou um importante crédito de confiança junto à sociedade civil. Antes da campanha, era difícil ignorar o jornal; depois dela, tornou-se impraticável.



A Folha é o meio de comunicação mais arrojado de toda a grande imprensa brasileira. É o mais sensível aos movimentos da opinião pública e também o mais ágil. É, com certeza, o que encontra maior repercussão entre os jovens. Foi o primeiro a compreender as possibilidades da abertura política e o que mais se beneficiou dela, principalmente na redemocratização. É o jornal pelo qual a maioria dos intelectuais optou. É o mais discutido nas escolas de comunicação e nos debates sobre a imprensa brasileira. Está no rumo certo, graças à lucidez e à competência dos jornalistas que o integram.

Como jornalista, sei o quanto a ossatura de um veículo de comunicação —o que lhe sustenta o corpo, dando-lhe consistência e forma— são as reportagens, os textos noticiosos, as fotos e imagens de boa qualidade. E quem trabalha no dia a dia construindo a notícia sacrifica muito de sua vida pessoal. É um sacerdócio. Mas, olhando esses 100 anos de história e em homenagem a todos que fizeram a Folha acontecer, podemos dizer que valeu a pena. Um país sem uma imprensa forte não tem uma sociedade livre. Devemos muito de nossa liberdade à atuação incansável deste jornal.

TENDÊNCIAS / DEBATES
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.​​

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