Descrição de chapéu
Janaína Rueda

Não deixe fechar a conta

Vilões não são os bares e restaurantes regularizados, mas sim as festas clandestinas

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Janaína Rueda

Dona do Bar da Dona Onça, em São Paulo, e conselheira dos movimentos Gastronomia Viva e Não Deixe Fechar a Conta

Poucos setores se empenharam mais na adoção de protocolos sanitários na pandemia de Covid-19 do que o setor de restaurantes, bares, lanchonetes, cafeterias, sorveterias e padarias. Após meses operando com as portas fechadas, houve empenho na definição de boas práticas e medidas de prevenção, submetidas, ao final, à aprovação das autoridades de saúde.

A mobilização envolveu investimentos significativos, cuja única certeza era a redução do número de pessoas atendidas para se somar aos esforços do poder público em prol da defesa do direito à vida. É possível afirmar que esses esforços trouxeram resultados positivos. O motivo é simples: nossa razão de ser está intimamente ligada ao bem servir e ao cuidado.

Por isso, enxergamos como contraditórias as decisões de autoridades paulistas que agora nos estrangulam ao mesmo tempo em que são negligentes em relação a estabelecimentos em situação irregular e festas clandestinas –essas sim as vilãs pela explosão de contágios no período das festas de fim de ano.

A imprensa noticia diariamente aglomerações em ruas de comércio e até em comemorações de torcidas, mas os únicos penalizados somos nós, que seguimos todos os protocolos. Os restaurantes, inclusive, estavam fechados nas festas de fim de ano, fato que pode ter encaminhado inúmeras pessoas a festas nas quais a possibilidade de contágio era —e é— certamente maior.

Para piorar as coisas, o governo do estado, indiferente ao cenário excepcional, fortalece o pacote de maldades encaminhando à Justiça protestos por atrasos de pagamentos dos impostos estaduais e ainda executa a dívida de pequenos empresários.

Sair dessa tragédia impõe que o debate público e as decisões políticas sejam melhor fundamentados, e não com base em achismos. Seja na política fiscal, seja da equivocada posição adotada pela política sanitária que elegeu bares e restaurantes como vilões no avanço da pandemia da Covid-19 no Brasil.

Caminhamos ao lado da ciência na definição de regras rígidas de acesso e permanência nos restaurantes e bares. Operamos com número reduzido de mesas. Nossos colaboradores utilizam EPIs (equipamentos de proteção individual) que só são vistos em hospitais. Medimos temperatura, e os clientes ficam sem máscara somente sentados. Há oferta de álcool em gel e sanitização frequente dos espaços.

A cidade de São Paulo, com 55 mil bares e restaurantes, dispõe de 170 fiscais para cuidar dessa frente, o que é um escárnio com quem paga impostos. Por que não recrutar novos servidores e não mobilizar a Guarda Civil Metropolitana para evitar a ocorrência dessas festas absurdas?

Dados da Abrasel (Associação Brasileira de Bares e Restaurantes) indicam que, no início de 2020, existiam cerca de 1 milhão de negócios do setor no Brasil, empregando diretamente 6 milhões de trabalhadores. Oitenta por cento deles tinham faturamento inferior a R$ 20 mil por mês. Com a pandemia, cerca de 300 mil já fecharam. E 1 em cada 10 de todos os desempregados do país veio desses estabelecimentos.

No estado de São Paulo, a situação é dramática e tende a piorar: a alíquota do ICMS para bares e restaurantes que adotam o regime normal de tributação passou, em 2021, de 12% para 13,3%, e de 3,2% para 3,69% para os que adotam o regime especial.

Com o fim da MP 936 em 31 de dezembro de 2020, que permitia a redução de jornada ou a suspensão de contratos de trabalho, e o recente endurecimento das restrições de horários de funcionamento está se formando uma tempestade perfeita: se antes éramos parte da solução, arrecadando impostos, gerando emprego e renda, passamos a ser estatística da quebradeira.

Se há uma lição importante em matéria de economia é a de que não existe dinheiro do governo, mas sim dinheiro do contribuinte. No momento em que os gastos públicos para enfrentamento da pandemia aumentam, não é inteligente matar quem paga a conta.

Precisamos ser ouvidos. O diálogo é fundamental para a sobrevivência dos negócios e de seus trabalhadores. Não nos confundam! Não somos os culpados. Não deixe fechar a conta.

TENDÊNCIAS / DEBATES
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamento contemporâneo.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.