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José Vicente da Silva Filho

Câmeras corporais são eficazes no trabalho policial? SIM

Mais prisões e apreensões de armas, menos letalidade policial e mortes de PMs

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José Vicente da Silva Filho

Coronel reformado da Polícia Militar de São Paulo, ex-secretário nacional de Segurança Pública (2002, governo FHC), professor do mestrado profissional da PM e membro do Conselho da Escola de Segurança Multidimensional da USP

As boas polícias do mundo buscam se aperfeiçoar constantemente para maximizar o uso de recursos perante demandas crescentes, observar obsessivamente o respeito ao cidadão e o rigor da lei em suas ações, além de investir na proteção do policial em seu complexo e perigoso trabalho. Experiências com câmeras ajudaram nesse processo de melhoria do serviço policial nas ruas de Nova York, Londres, Los Angeles, Berlim e, agora, nos estados de São Paulo e Santa Catarina, os melhores exemplos desse avanço no Brasil.

A utilização de câmeras acopladas no uniforme começou a ser testada na Polícia Militar de São Paulo em 2014. O projeto foi aperfeiçoado na sua utilização no cotidiano policial e nas tecnologias, como a gravação ininterrupta durante o turno do trabalho e o arquivamento altamente controlado do banco de imagens, principalmente das evidências com possível interesse judicial.

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Policiais militares mostram câmeras instaladas nos uniformes, em São Paulo; sistema transmite imagens em tempo real ao Copom (Centro de Operações da Polícia Militar do Estado de São Paulo - Rubens Cavallari - 20.abr.21/Folhapress

Gradualmente se percebeu que as câmeras induzem um comportamento cada vez melhor de conformidade dos policiais às normas reguladoras de seu trabalho e aos procedimentos treinados para obter melhores resultados. Um questionamento feito por policiais da velha guarda, e até por alguns políticos, é o de que a câmera inibiria o policial em tomar iniciativas mais arriscadas durante o serviço, preferindo se omitir tanto quanto possível.

Pelo contrário: as unidades que empregaram as câmeras tiveram produtividade muito maior, medida justamente pela quantidade de criminosos presos em flagrante e de armas de fogo apreendidas, indicadores típicos de atividade policial motivada e eficiente. O aumento, de julho a outubro de 2021 ante o mesmo período de 2020, foi de 41,4% nas unidades com câmeras contra 12,9% nas unidades sem o equipamento. Em levantamento de opinião realizado em abril com 66 capitães do mestrado profissional da PM, 60 deles (90,9%) foram favoráveis à utilização das câmeras.

Os resultados são eloquentes em outras dimensões: o apuro profissional ajudou a produzir substancial redução da letalidade policial, além de alcançar o menor registro de morte de policial nos últimos 30 anos, com um único caso em confronto no serviço em 2021.

Alguns efeitos colaterais positivos do uso das câmeras acabaram fortalecendo o interesse dos policiais pelo seu uso. Um deles, a gravação de evidências de correção do policial em acusações de abuso de força; outro, o registro de evidências no momento de intervenção policial, que servirá para decisões judiciais. Outro aspecto crescente na experiência dos policiais com câmeras é o efeito do "sorria, você está sendo filmado": a redução da resistência de infratores nas abordagens policiais, que chegou a 32% nas tropas com câmeras e a 19,2% nas unidades sem o equipamento, evitando o emprego de força adicional para dominar as situações.

A ação policial com câmera constitui um raro caso em que se leva ao nível das ruas o princípio constitucional da publicidade dos atos praticados por agentes públicos. O Estado e a sociedade devem exigir uma polícia melhor e apoiar seu esforço de aperfeiçoamento; afinal, quando o cidadão aflito liga para o telefone 190, o Estado vai acudi-lo sob a forma de um funcionário com a farda da PM. Pelo Estado e para o cidadão, ele deve ser cada vez melhor.

Um importante alerta para as demais polícias: o melhor uso da tecnologia requer policiais altamente treinados e motivados, além de supervisão de qualidade, ou as câmeras vão revelar mazelas e comprometer a sua implantação.

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