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Mulheres, eleições e o futuro do Brasil

Redução das desigualdades sociais passa por agenda feminista e antirracista

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VÁRIAS AUTORAS (nomes ao final do texto)

As mulheres brasileiras contribuem enormemente para a produção da riqueza nacional, embora o reconhecimento e a retribuição material por esse trabalho sejam inferiores aos recebidos pelos homens.

Geralmente responsabilizadas pela atenção aos filhos, elas dedicam mais tempo às atividades domésticas e de cuidados, o que tornam sua inserção no mercado mais precária: estão mais presentes em trabalhos sem registro, a tempo parcial. A sociedade trata ensinar, cuidar, limpar e cozinhar como atributos naturais de ser mulher —algo feito por amor, não como trabalho. Não à toa essas atividades têm menor status social e, se pagas, remuneração inferiores.

Um mercado de trabalho competitivo, com jornadas desreguladas e que ultrapassam as 40 horas semanais, leva mulheres e homens a delegar para uma maioria de mulheres negras atividades que possibilitam, afinal, continuarmos vivos. São elas que mantêm nossas casas e espaços de trabalho limpos, crianças e idosos cuidados e a comida pronta —seja em casa, seja no restaurante a quilo. A maioria de mulheres negras entre empregadas domésticas e cuidadoras explicita o lugar subalterno a que são relegadas em nossa história, cunhada na escravização.

Não à toa a informalidade persiste nesses setores, com a negação, na prática, do que a PEC das Domésticas garantiu e o veto, pelo presidente Jair Bolsonaro (PL), ao projeto de lei que regulamenta a profissão de cuidadoras de idosos. As profissionais da educação infantil também lutam para serem reconhecidas como docentes. Portanto, admitir a centralidade desses trabalhos é um desafio primordial.

Como a pandemia e a crise econômica recentes demonstraram, as mulheres são as principais afetadas por um Estado que transferiu a responsabilidade pelos cuidados da crise sanitária ao espaço privado. Elas ampliaram sua participação entre as pessoas desalentadas e indisponíveis para trabalhar. Tornou-se ainda mais penoso ter um trabalho remunerado em 2021, com as creches e escolas fechadas e o atraso no início da vacinação.

Nesse sentido, agendas políticas que defendem igualdade racial e de gênero precisam se comprometer com a universalização de equipamentos públicos de cuidado, como creches e espaços para idosos.

Também é necessário estimular a criação de licenças igualmente divididas entre os pais, realidade em muitos países, responsabilizando os homens pelo cuidado. É urgente a atuação do Estado na promoção de mudanças estruturais e culturais: manutenção da política de cotas raciais no ensino superior; campanhas públicas para desnaturalizar competências e habilidades com viés de gênero e raça; e uma educação antissexista e antirracista.

As mulheres organizadas em movimentos sociais priorizaram a valorização do salário mínimo como agenda política no início dos anos 2000. Marchas organizadas para Brasília foram encampadas pelo movimento sindical e se desdobraram na maior conquista redistributiva do século 21, com redução na distância salarial entre homens brancos, mulheres brancas, homens negros e mulheres negras. Tal conquista foi descontinuada pelos governos Michel Temer (MDB) e Jair Bolsonaro.

A redução das desigualdades sociais no Brasil passará, necessariamente, por uma agenda feminista e antirracista. As mulheres são as principais afetadas pela descontinuidade de políticas redistributivas, pelas alterações que flexibilizam a jornada e contratos de trabalho e pelo desestímulo do Estado à diversificação produtiva. É preciso retomar uma agenda que aposte na qualificação, formalização, redução da jornada sem redução dos salários, garantia efetiva do intervalo durante a jornada de trabalho para o aleitamento e valorização real do salário mínimo.

O compromisso por maior valorização e reconhecimento do trabalho das mulheres precisa estar visceralmente atado à agenda redistributiva. Apenas assim elas terão uma retribuição à altura da sua parcela na produção de riquezas para o país.

Bárbara Castro (Unicamp)
Lygia Sabbag Fares (Brooklyn Institute for Social Research-NY)
Patrícia Vieira Trópia (UFU)
Selma Cristina Silva (UFBA)

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