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Cristina Tardáguila

Tempo, neurônio e dinheiro para combater a desinformação

Campanha mal começou e já fomos inundados por dezenas de fake news

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Cristina Tardáguila

Diretora sênior do ICFJ (International Center for Journalists) e fundadora da Agência Lupa

Palavras não bastam para combater a desinformação —menos ainda as de cunho eleitoral. Se não formos capazes de entender a importância de investir (tempo, neurônio e dinheiro) em iniciativas inovadoras para serem usadas contra as fake news, falharemos miseravelmente. E não só na eleição deste ano.

A campanha oficial mal começou e já fomos inundados por dezenas de informações falsas. Ouvimos dados truncados em entrevistas, recebemos conteúdos manipulados em nossos celulares e vimos imagens sendo maliciosamente usadas fora de contexto em vídeos virais.

Como previsto, ainda é fácil, barato e rápido criar e difundir narrativas enganosas —mesmo as que possam colocar em risco o processo eleitoral e a democracia em si. E ainda é muito difícil fazer frente a essas mentiras.

A novidade de 2022 é que diversas organizações investiram para tirar do papel produtos inovadores, pensados especificamente para reduzir as dores do combate à desinformação. Falo de um conjunto de projetos que foram capazes de enxergar falhas, bolar estratégias e conseguir investimento para trazê-las à luz. Um exemplo é o "Jogo Limpo", do International Center for Journalists (ICFJ) com o YouTube Brasil.

Até o último dia 11, por exemplo, não havia no Brasil (ao menos em português) uma ferramenta gratuita e aberta ao público capaz de transcrever um discurso ou um debate eleitoral de maneira instantânea, guardar essas transcrições em um único banco de dados e ainda permitir que qualquer indivíduo fizesse buscas nele. O Escriba para Jornalistas, do Aos Fatos, é uma conquista. Acelera a detecção e, logo, a resposta às fake news produzidas por candidatos.

Até poucos dias também não havia por aqui um sistema (um robô) capaz de indicar o minuto exato em que uma informação duvidosa aparecia em vídeos virais. O Núcleo Jornalismo deu à luz o BotPonto e encurtou o trabalho de jornalistas, "fact-checkers" e estudiosos da desinformação.

Também é muito recente o interesse e o investimento na regionalização da checagem de fatos. Centrados no eixo Rio-São Paulo-Brasília-Minas Gerais, os "fact-checkers" profissionais estavam deixando de ver mentiras grotescas ditas país afora.

Surgiu o Amazônia Check, iniciativa liderada por O Liberal, em Belém, para colocar à prova o que os presidenciáveis sabem/dizem sobre meio ambiente. O timing é perfeito.

E projetos de educação midiática? Multiplicaram-se em 2022.

Neste ano, poderosas empresas toparam investir no que considero a vacina da desinformação —no espalhamento da verdade. O Reload, coordenado pela Agência Pública, produz cartuns, infográficos e vídeos que mastigam para os jovens o que é e como funciona a democracia. O Instituto Vero e seu "Fake dói" (leia em voz alta para entender o trocadilho) oferecem um curso sobre técnicas de apuração com dados abertos (OSINT, em inglês). Tudo focado na juventude.

Ainda vale destacar que, não fosse por mais do que simples palavras, jamais o Redes Cordiais teria mobilizado 30 influenciadores digitais para ir ao Tribunal Superior Eleitoral e tirar dúvidas. Os críticos podem dizer o que quiserem. Mas, ao promover esse encontro e garantir que os influenciadores entendam como funciona a urna, por exemplo, conteúdos de qualidade sobre essa (ridícula) polêmica podem alcançar mais de 10 milhões de indivíduos.

São mais projetos como esses que necessitamos. Discursos vazios em favor da "verdade" pouco fazem. Este 2022 vai mostrar que é vital apoiar —de forma contínua e robusta— quem entrega soluções efetivas e inovadoras. Basta de perder tempo com lamúrias. Vamos apostar nas saídas contra as fake news.

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