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Pedro Estevam Serrano e Anderson Medeiros Bonfim

A empresa e a Constituição

Ambiente de produção e inovação deve compatibilizar-se com regras da Carta

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Pedro Estevam Serrano

Doutor em direito do Estado (PUC-SP) com pós-doutoramento nas Universidades de Lisboa, Católica de Paris e Paris Nanterre, é advogado e professor de direito constitucional e de teoria do direito da PUC-SP

Anderson Medeiros Bonfim

Doutorando em direito administrativo pela PUC-SP

A exploração de atividades econômicas, ainda que aparente sujeitar-se meramente às regras de livre mercado e aos interesses egoísticos da iniciativa privada, é condicionada pela Constituição Federal.

É a Constituição o elemento responsável pela demarcação das condições e possibilidades das relações econômicas e sociais, cabendo às espécies normativas infraconstitucionais regular a atividade empresarial em busca da preservação dos legítimos interesses em jogo.

O professor e jurista Pedro Serrano - Mathilde Missioneiro - 6.mar.23/Folhapress

Com efeito, nossa ordem econômica é, dentre outros, fundada nos princípios da livre iniciativa, da propriedade privada e da concorrência, sendo assegurado o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização estatal, ressalvadas hipóteses excepcionais.

Aos referidos princípios se somam, dentre outros, o da função social da propriedade e o da redução das desigualdades sociais. Também não se pode desconsiderar serem fundamentos da nossa República os valores sociais do trabalho, o desenvolvimento, a erradicação da pobreza e da marginalização e, ainda, a redução das desigualdades.

A projeção à liberdade individual no plano da produção e de apropriação privada não é incondicionada. Ainda que, por um lado, seja desejável a liberdade de exploração privada, bem como a geração e circulação de riquezas por ela propiciada, o desempenho da atividade econômica deve ser balizado por determinados valores.

Com efeito, a saúde das empresas, bem como o seu compromisso com a ética e com a equidade nas relações com parceiros, investidores, colaboradores e consumidores, é peça chave para o desenvolvimento econômico e social.

Ademais, a atividade empresarial deve ser comprometida com o equilíbrio do sistema. Destaque-se, exemplificativamente, ser obrigação das empresas de capital aberto revelar, de forma contínua e independentemente de provocação, o estado dos seus negócios, isso em nome da própria estabilidade do mercado de capitais.

Nesse caso, o dever de transparência visa assegurar, através da publicidade, que informações cheguem aos acionistas e ao mercado em geral —isso para que eles possam avaliar as condições dos negócios da companhia e deliberem, em condições adequadas, entre alocar ou realocar investimentos dentro do sistema econômico.

Outro aspecto que se coloca é com relação à responsabilidade social das empresas. Não se sujeita a qualquer voluntarismo o dever de inclusão e diversidade, a vedação da exploração do trabalho escravo e, ainda, a proteção ao mercado de trabalho das pessoas com deficiência e da mulher.

Os direitos fundamentais previstos na Constituição não devem ser assegurados apenas pelos poderes públicos, mas igualmente pelas empresas. Trata-se da chamada eficácia dos direitos fundamentais entre terceiros ou, mais adequadamente, da eficácia horizontal dos direitos fundamentais nas relações privadas.

O compromisso sistêmico das empresas brasileiras decorre de um compromisso constitucional inegociável. Para além da mera voluntariedade, é preciso que o ambiente de produção e de inovação compatibilize-se com as exigências da Constituição.

A regulação da atividade econômica não deve ser substitutiva do mercado, o qual possui garantia constitucional contra a intervenção estatal. De todo modo, a Constituição supervisiona a ordem econômica, preservado o campo privado de inovação e circulação de riquezas. É essa a desejável relação entre a empresa e a Constituição.

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