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Natália Leal e Tai Nalon

PL das Fake News é falho na luta contra a desinformação

Projeto em discussão deve prever regulação efetiva das plataformas digitais

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Natália Leal

Jornalista e CEO da Lupa

Tai Nalon

Jornalista, cofundadora e diretora-executiva do Aos Fatos

O avanço do projeto de lei 2.630/2020, o PL das Fake News, a ser votado na Câmara nesta terça-feira (2), impactará negativamente o combate à desinformação no Brasil. Como está, a proposta não contempla o exercício pleno dessa luta. Uma regulação da atuação de plataformas de redes sociais e aplicativos de mensagens no país é necessária, mas, para que isso ocorra por essa lei, pontos do projeto precisam ser modificados antes que ele seja votado.

O texto tem avanços em relação às suas primeiras versões. Não assegura, porém, ações fundamentais para o combate à desinformação, como o acesso a dados para investigações jornalísticas e o apoio financeiro para a educação midiática.

PL das Fake News enfrenta resistências por parte das big techs - Dado Ruvic - 13.jul.21/Reuters - REUTERS

O artigo 25 determina que apenas instituições acadêmicas, tecnológicas e de inovação terão acesso gratuito a alguns dados das plataformas, como informações sobre moderação de contas e de conteúdo, segmentação, publicidade e funcionamento dos algoritmos. O jornalismo, não.

Investigações independentes sobre a estrutura e o financiamento de cadeias desinformativas perpetradas por maus atores serão frontalmente impactadas. Reportagens resultantes desses monitoramentos já comprovaram que políticos em exercício de mandato estão entre os principais responsáveis pelo impulsionamento de conteúdos inverídicos e pela distorção do debate público. Esse tipo de trabalho, conduzido por quase uma década por organizações como Lupa e Aos Fatos, está sob risco de silenciamento.

O projeto prevê que União, estados e municípios fomentem a educação para o uso seguro da internet, mas não indica de que forma. Ao mesmo tempo, estabelece sanções e multas às plataformas que descumpram a regulação.

Surpreende que não haja indicação para que ao menos parte dos valores aferidos seja destinada a ações de educação midiática. Só uma sociedade consciente dos perigos do consumo e da produção de conteúdo em redes sociais pode garantir um ambiente digital saudável. Grupos que trabalham nessas ações precisam ser apoiados, inclusive financeiramente, mas não há garantias disso.

É preocupante também que recaia sobre qualquer instituição já existente o dever de regulamentar e de fiscalizar o cumprimento dessa lei. É imperativo que um órgão independente técnica e financeiramente seja criado para esse fim. Esse espaço precisa ser construído de forma multissetorial, garantindo voz a organizações que monitoram, identificam e constroem soluções de combate à desinformação. Isso não ocorre hoje e não está assegurado pelo PL.

É sabido que há mais pontos delicados e que o avanço da proposta está condicionado a múltiplos interesses. Advogar pela retirada da extensão da imunidade parlamentar material às redes sociais, a despeito de farta comprovação sobre os efeitos deletérios desse salvo-conduto, por exemplo, tem sido infrutífero. As mudanças que aqui se pede têm como único objetivo garantir que o combate à desinformação seja fortalecido por uma eventual legislação que regulamente as plataformas. E não que a nova lei contribua para desequilibrar ainda mais essa luta.

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