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O que a Folha pensa marco temporal

Marco polêmico

Debate sobre terras indígenas precisa de menos extremismo de lado a lado

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Vista aérea da aldeia Mynawa, na Terra Indígena Waimiri-Atroari (AM) - Lalo de Almeida/Folhapress

Congresso, Supremo Tribunal Federal e governo têm diante de si a responsabilidade de deliberar sobre o tema complexo —política e juridicamente— dos direitos das comunidades indígenas a terras perdidas ao longo da história.

Está em jogo o alcance da aplicação do artigo 231 da Constituição de 1988, que reconhece a esses povos "os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam" e "o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes".

A partir do ditame constitucional, o processo de demarcação de áreas indígenas conheceu enorme e justa expansão nas décadas seguintes, a ponto de elas ocuparem hoje nada menos de 13,8% do território nacional. É evidente que tamanha transformação não se deu sem controvérsia, que ganhou novo patamar a partir de 2009.

Naquele ano, o STF firmou a tese do marco temporal —vale dizer, considerou que o direito estabelecido na Constituição se aplicava, de fato, às terras ocupadas por indígenas no ano de promulgação do texto, 1988. Esse entendimento, porém, pode ser revisto agora, com o julgamento de um recurso apresentado pela Funai.

Diante dessa perspectiva, a Câmara dos Deputados aprovou nesta semana, por margem folgada de 283 votos a 155, projeto com o objetivo de consolidar e regular o marco temporal, no que foi tido como derrota de lideranças indígenas.

Ainda que haja forças retrógradas entre os apoiadores do projeto, é sem dúvida legítima a preocupação do setor rural com a segurança jurídica das propriedades. O marco temporal é questionável, no entanto, por deixar de fora áreas consideradas importantes em estados como Mato Grosso do Sul.

O debate, infelizmente, está contaminado por ideologização excessiva de lado a lado. Boa parte da polêmica pode ser contornada se os Poderes tratarem de eliminar as hipóteses mais extremistas.

É preciso deixar claro que, seja qual for o cenário, não haverá retrocesso nas demarcações já realizadas, 98,3% delas na Amazônia —e que o Estado zelará pela segurança e bem-estar de seus habitantes. Cumpre também esvaziar a ideia caricata de que qualquer porção do pais está sujeita a se converter em terra indígena.

O governo Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pode organizar, segundo se noticia, um fórum de discussões sobre o assunto, incluindo representantes do Legislativo e do Judiciário. A administração petista tem notória inclinação às teses indigenistas, mas dará contribuição importante se viabilizar uma discussão sóbria e plural.

O que puder ser feito para minorar os inevitáveis conflitos políticos e judiciais será bem-vindo.

editoriais@grupofolha.com.br

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