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Gabriella Fregni

Sobre pais e (gestão de bens de) filhos

Nosso ordenamento jurídico traz insegurança e desproteção a menores

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Gabriella Fregni

Advogada, é mestre em direito civil comparado (PUC-SP) e doutora em direito do Estado (USP); sócia de Fregni – Advogados Associados

Coluna do ombudsman desta Folha ("Jornalismo de declaração", 20/8) fez boa análise sobre a cobertura que a imprensa dá ao universo das celebridades quando o assunto vai além e trata do direito e de questões relacionadas a família e patrimônio. No texto, está posta a necessidade de se cobrir o imbróglio envolvendo a atriz Larissa Manoela e seus pais —e o "divórcio" entre essas partes— para além da "fofoca", tão presente em coberturas do tipo.

Gostaria de seguir com reflexões com foco em elementos jurídicos. O principal aspecto: qual é a extensão da responsabilidade de pais para o patrimônio de filhos? A relação de pais e filhos é regida por "poder familiar" e trata das responsabilidades em relação a menores de 18 anos. Poder tido por irrenunciável, intransferível por iniciativa de seus titulares, inalienável e imprescritível.

A atriz Larissa Manoela com a mãe, a pedagoga Silvana Taques, e com o pai, o representante comercial Gilberto Elias, em foto publicada por ela nas redes sociais - @larissamanoela no Instagram - @larissamanoela no Instagram

Argumento expresso no artigo 227 da Constituição Federal, que deixa claro que é dever manter menores "a salvo de toda a forma de negligência". Esse vínculo envolve, entre outros, educação, tomada de decisões médicas, formação ética e moral —e também traz o dever de administração do patrimônio.

Os pais também não podem usar o patrimônio para seu benefício ou de terceiros. E, de acordo com o artigo 1.637 do Código Civil, em caso de falta no cumprimento de seus deveres ou atos que gerem a ruína dos bens dos filhos, poderá o Judiciário suspender o poder familiar.

Mas há questão no nosso ordenamento jurídico que traz insegurança e desproteção a crianças e adolescentes. O Código Civil, incorporado pela lei 12.399/2011, aponta que menor de 16 anos pode integrar sociedade limitada se representado pelos genitores, se o capital social estiver totalmente integralizado e se a criança ou o adolescente não for o administrador.

Ocorre que há risco de o filho responder no futuro com seus bens por dívidas contraídas pela empresa. Ou, se a criança ou adolescente possuir patrimônio, os pais poderão livremente gerir bens por meio da sociedade limitada sem cumprir regras protetivas de nossa legislação.

Prevaleceu por muito tempo o entendimento de que o menor de 18 anos não poderia integrar sociedade devido à restrição constante do Código Comercial. Mas acórdão do Supremo Tribunal Federal, do longínquo ano de 1976, afirmou a legalidade da inclusão do sócio menor. Com respaldo na decisão, admite-se o seu ingresso desde que exista a assinatura de pai e mãe para os atos de registro.

Isso posto, em tempos de celebridades que se consolidam ainda na juventude, são muito bem-vindos projetos de lei para regulamentar e proteger menores que passarem a participar de sociedades por decisão unilateral dos pais.

É fato que há casos em que, longe do controle judicial, genitores realizam livremente a gestão dos bens de menores, fazem uso de seus nomes e contraem dívidas que poderão onerá-los por anos. Isso em um mundo em que contratos são assinados rapidamente, transferências financeiras se resolvem a um clique e o nome e a imagem são os reais e efetivos patrimônios.

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