Descrição de chapéu Legislativo Paulista

De trajetória improvável, 'Carteiro Reaça' leva estilo Bolsonaro à Assembleia

Estreante Gil Diniz (PSL) ficou conhecido dessa forma quando trabalhava nos Correios

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São Paulo

Uma trajetória improvável levou à Assembleia Legislativa de São Paulo um dos estreantes da legislatura que assume nesta sexta-feira (15).

Gildevânio Ilso dos Santos Diniz, 32, o Gil Diniz, já foi segurança de shopping, soldado temporário da PM e professor de história, mas foram suas duas últimas ocupações as responsáveis indiretas por sua eleição para deputado.

Quando Gil era funcionário dos Correios, o jeito contestador e as críticas ao que chamava de aparelhamento da estatal pelo PT fizeram companheiros o apelidarem de Carteiro Reaça. Eles criaram uma página para o personagem no Facebook e deram para o colega administrar.

O perfil já tinha certa popularidade quando, em 2015, Gil virou assessor do gabinete do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), posto que ele ocuparia até agosto de 2018. Em seu último mês no cargo, recebeu salário de pouco mais de R$ 5.000.

O deputado estadual Gil Diniz (PSL), conhecido pelo personagem das redes sociais Carteiro Reaça
O deputado estadual Gil Diniz (PSL), conhecido pelo personagem das redes sociais Carteiro Reaça - Bruno Santos/Folhapress

Com uma campanha que explorou o codinome Carteiro Reaça e contou com vídeos de apoio de Eduardo e do pai, Jair Bolsonaro, o pernambucano que chegou a São Paulo aos nove anos teve a quinta maior votação para deputado estadual (214.037 votos).

“Na véspera da eleição, o Jair me perguntou: ‘Carteiro, garante 20 mil votos amanhã?’. Falei: ‘Capitão, o trabalho foi feito, mas não tenho noção’. A votação foi uma surpresa.” 

O custo para chegar lá foi baixo. Ele declarou à Justiça Eleitoral ter gasto R$ 7.785. 

Gil, que ainda não se acostumou a ser chamado de deputado e dispensa tratamento cerimonioso (prefere o pronome “você”), fala que chega à Assembleia como um cidadão comum que terá a oportunidade de ajudar a melhorar a vida dos mais pobres.

Define-se como alguém que conhece as agruras dos serviços públicos e trabalhará para combatê-las. Seus dois filhos estudam em escola pública.

“Nasci na periferia do Brasil e cresci na periferia de São Paulo”, diz ele, criado no Jardim Arize (zona leste). “Não é uma história inventada, de marqueteiro. É uma vida real, de um brasileiro comum. Tenho Bilhete Único, ando de ônibus, nunca tive carro.”

Filho de retirantes, uma empregada doméstica (na profissão até hoje) e um funcionário de empresa de asfalto (agora desempregado), o deputado conta que começou a trabalhar aos 11 anos, como entregador de leite.

Cresceu apegado à família, indo à Igreja Católica e participando do movimento escoteiro. “São as três coisas que formaram meu caráter.”

A relação com a política começou nas escolas públicas onde estudou. “Não tinha consciência naquela época se eu era de direita ou de esquerda, mas hoje vejo que os valores que eu tinha me levavam para a direita.” Lembra que gostava de ser o porta-voz da turma, de exibir suas ideias.

Entrada na política

A entrada na política formal, diretamente atrelada ao clã Bolsonaro, foi por acaso.

Em um domingo durante a campanha de 2014, ele viu Eduardo e Carlos Bolsonaro panfletando na rua, perto de um shopping. Aproximou-se para dizer que apreciava o trabalho dos dois e admirava mais ainda o pai deles.

A família ganhou de vez o coração do fã porque Eduardo, conforme o relato de Gil, pegou o celular na hora e pôs o pai na linha para falar com ele.

Resumo da história: o então carteiro acabou se engajando na campanha de Eduardo e meses depois foi chamado para trabalhar como assessor no escritório do mandato dele em São Paulo.

Acabou se tornando íntimo não só do filho “03”, mas também do pai dele. Conta que viajou para Juiz de Fora (MG) com o antigo patrão no dia em que o então candidato Bolsonaro sofreu um atentado à faca e passou horas no hospital dando assistência à família.

Diante da gravidade da situação, chegou a temer pela vida do ídolo —Bolsonaro era a palavra que aparecia estampada na blusa de moletom de Gil no dia em que recebeu a Folha para esta entrevista.

Num vídeo gravado na época da campanha em que pede voto para o assessor do filho, o presidente elogia o trabalho do correligionário. “Quero agradecer a colaboração que ele deu para que esse movimento nosso fosse o melhor possível”, diz, ao lado do então postulante a deputado.

Agora eleito, Gil está um passo à frente em relação aos colegas do PSL na Assembleia paulista, já que é o único com alguma experiência no dia a dia da política. Todos os 15 eleitos da sigla são estreantes em cargos eletivos. Ele será o líder da bancada do partido.

A estrela do grupo é Janaina Paschoal, dona de um recorde de 2 milhões de votos e candidata à presidência contra o atual titular do cargo, Cauê Macris (PSDB), favorito à reeleição nesta sexta-feira (15).

Gil tem sido um dos articuladores da campanha dela e um dos formuladores dos motes de campanha. Teve participação ativa na estratégia de expor a dobradinha histórica que tucanos e petistas fazem na eleição da mesa diretora.

Em meio à disputa, festejou estar diante da “primeira chance em décadas de quebrar a hegemonia da aliança entre PSDB e PT”. Hoje a hipótese é vista como remota dentro e fora do PSL.

“O PSL já está fazendo mais oposição ao PSDB do que toda a oposição junta nesses últimos dez anos. O PT está se acovardando, o PSOL não tocou no assunto das denúncias contra Cauê”, afirma ele, em referência a suspeitas sobre as contas de campanha do tucano, que nega irregularidades.

No mandato, o ex-carteiro quer honrar suas promessas de campanha, ancoradas na segurança pública. Fala em defender ajuste salarial para policiais militares e aumento do efetivo da Polícia Civil. “O PSDB destruiu as forças policiais de São Paulo”, diz.

Ele viu por dentro o problema da falta de estrutura quando foi soldado do serviço voluntário da Polícia Militar, de 2009 a 2011. Tentou várias vezes se tornar policial, mas era barrado no exame psicotécnico da corporação. “Sempre acusava uma impulsividade”, relembra ele. “Sou muito impulsivo.”

Rompantes à parte, Gil diz que até tem amigos de esquerda —e que fala com eles em um grupo de WhatsApp, com provocações e piadas dos dois lados. São amizades herdadas da faculdade de história, que ele não chegou a concluir.

Foi bolsista do Prouni, com 100% da mensalidade bancada pelo programa do governo federal. “Mas não sou daqueles que acham que devem favor para o Lula e para o PT. Era bem crítico a eles.”

O parlamentar possui 282 mil seguidores no Facebook e 39 mil no Twitter. Lá posta comentários recheados de ironias contra partidos ditos tradicionais (ataca com a mesma ênfase PT e PSDB), feministas, imprensa, opositores de Bolsonaro em geral...

No domingo passado (10), voltou-se contra um aspecto do Carnaval, a exemplo do que o presidente fez (com um polêmico vídeo de uma cena escatológica em um bloco de rua da capital paulista).

Gil postou no Twitter ter visto um número impressionante de adolescentes na estação da Sé, “indo para o ‘pós-Carnaval’ em São Paulo promovido pela prefeitura”. E indagou: “Muitos desses adolescentes estão consumindo [no mínimo] álcool e a pergunta que fica: onde estão os pais? Cadê o Conselho Tutelar que não enxerga isso?”.

No Parlamento, o estilo mordaz dos comentários de rede social vai permanecer, afirma ele. “Vou tomar cuidado com o decoro, mas vou ser combativo. No plenário, a gente vai ter embate.”


Perfil

Idade 32 anos

Nascimento Serra Talhada (PE)

Partido PSL

Estado civil Solteiro

Cor/raça Branca

Grau de instrução Superior incompleto

Ocupação Outros

Reeleição Não

Descrição dos bens declarados do parlamentar Não declarado

Valor declarado dos bens  Não declarado

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