"O Brasil não é para principiantes", destacou no alto de seu perfil no Twitter o usuário @waltergrandsonn, que acumulou 291 postagens na rede social até terça-feira passada (23).
Nesse mesmo dia foi preso aquele que é apontado como o administrador da página, Walter Delgatti Neto, 30, conhecido como Vermelho, um dos suspeitos de hackear o ministro Sergio Moro (Justiça) e outras autoridades.
Sua última mensagem foi: "Aí vem coisa hein kkkk". Era o comentário dele sobre a notícia da invasão ao celular do ministro Paulo Guedes (Economia).
Nas semanas anteriores, o conteúdo passou por críticas a Moro, opiniões sobre os diálogos trazidos a público pelo site The Intercept Brasil, ironias com o MBL (Movimento Brasil Livre) e ataques ao presidente Jair Bolsonaro (PSL).
O histórico da página associada ao suposto hacker é errante e chega a desafiar a lógica. A conta foi criada em julho de 2010 e teve 18 publicações até agosto de 2011.
Como mostrou a coluna Mônica Bergamo, seguiu-se um hiato que durou oito anos. Delgatti só retomou as postagens em 27 de maio deste ano, às vésperas da divulgação dos primeiros diálogos de Moro, que ocorreria dali a duas semanas.
O estilo dos posts mudou completamente depois do sumiço. Em 2011, ele usava a página, por exemplo, para lamentar a suposta morte do astro do cinema e das artes marciais Chuck Norris: "porra, o Chuck Norris morreu" —era fake news.
Também são da era despolitizada os tuítes: "AhuahahuahuaUahAhuHauHauHauHua", de 2010, sem nenhuma referência aparente, e "Queroooooo Comerrrrrrrr :((((((((", de 2011.
Em maio de 2019, ao reativar o perfil com o anúncio "Voltei!", veio a transformação: as mensagens passaram a abordar política, economia, Justiça e assuntos mais sérios do que seu próprio apetite.
O autor questionou, por exemplo, se o procurador Augusto Aras tinha condições de assumir "tamanha responsabilidade", quando começaram a circular rumores de sua indicação para o cargo de procurador-geral da República.
A Moro, que se tornou um dos alvos frequentes, Vermelho passou a dedicar a hashtag "#juizdesesperado", depois que o ex-magistrado começou a sofrer pressões em virtude dos diálogos revelados pelo Intercept e por outros veículos, como a Folha.
Em resposta a uma mensagem do próprio ministro, em que Moro criticava a revista Veja por uma reportagem sobre o caso, Delgatti escreveu: "Moro está desesperado, triste, abalado, tinha um assento no STF quase garantido. Moro, na boa véi, já se entrega hoje e colabora com a investigação que está por vir".
Dias atrás, postou uma montagem em que a testa do ministro ganhava a inscrição "Eu sou ladrão e vacilão" (retirada da foto real de um jovem que teve o rosto tatuado com a frase após ser acusado de roubar uma bicicleta, em São Bernardo do Campo, em 2017).
O tuiteiro costumava se referir a bolsonaristas como "gado", termo usado para menosprezar os apoiadores do presidente e do governo, e replicava notícias negativas sobre Bolsonaro.
No mês passado, repostou foto de dois líderes do MBL, o deputado federal Kim Kataguiri (DEM-SP) e o vereador Fernando Holiday (DEM-SP), com a frase: "Tontos e shallow now #TontosDoMBL".
Era uma alusão ao apelido usado por Moro para se referir ao grupo, como mostraram mensagens trocadas por ele com outros membros da força-tarefa da Lava Jato na época em que atuava em Curitiba.
Delgatti foi sarcástico ao reagir a uma mensagem da deputada federal Joice Hasselmann (PSL-SP) em defesa da aprovação da reforma da Previdência. "Nofa", respondeu ele à parlamentar (numa variação galhofeira da interjeição "nossa").
Vermelho também retuitou conteúdos favoráveis ao PT, como uma notícia sobre um laudo atestando a ex-presidente Dilma Rousseff de participação em irregularidades no governo e uma declaração do deputado federal petista Paulo Pimenta em que ele chama o procurador Deltan Dallagnol de militante político.
Vira e mexe, os assuntos mais leves reapareciam. Em 29 de junho, por exemplo, palpitou sobre a polêmica dos canudinhos de plástico, insinuando que o objeto seria dispensável para ele. "Eu tomo até garrafa de 2 litros virando na boca kkkkk".
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.