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Saiba o que pode acontecer com Bolsonaro, de pedidos de impeachment a investigações no Supremo

Presidente enfrenta investigações no STF e pedidos de impeachment parados na Câmara

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São Paulo e Brasília

Isolado politicamente e cada vez mais dependente dos partidos do chamado centrão, que oferecem apoio ao governo no Congresso em troca de cargos e verbas, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) enfrenta investigações no Supremo, vê uma série de pedidos de impeachment contra ele na Câmara e acumula possíveis crimes de responsabilidade desde o início de seu mandato.

Hoje há ao menos 35 pedidos de impeachment de Bolsonaro em análise pelo presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Nesta quinta-feira (21), partidos de oposição e cerca de 400 entidades da sociedade civil apresentaram um pedido coletivo de impeachment de Bolsonaro por apoiar manifestações antidemocráticas e tentar intervir na Polícia Federal. Entre os partidos que assinam a peça estão PT, PC do B, PSOL e PSTU.

Confira, a seguir, os casos sob investigação em torno do presidente.

Demissão de Moro e investigação

O depoimento prestado pelo ex-ministro Sergio Moro à Polícia Federal é considerado um dos principais elementos do inquérito que pode levar à apresentação de denúncia contra ele mesmo ou contra o presidente Jair Bolsonaro.

A oitiva foi o primeiro passo da apuração iniciada após Moro pedir demissão do Ministério da Justiça e Segurança Pública, com graves acusações ao chefe do Executivo.

A investigação foi aberta a pedido do procurador-geral da República, Augusto Aras, e autorizada pelo ministro Celso de Mello, do STF (Supremo Tribunal Federal), relator do caso. O objetivo é descobrir se as acusações são verdadeiras ou, então, se o ex-juiz da Lava Jato pode ter cometido crimes caso tenha mentido sobre Bolsonaro.

Na visão de Aras, oito delitos podem ter sido cometidos: falsidade ideológica, coação no curso do processo, advocacia administrativa, obstrução de Justiça, corrupção passiva privilegiada, prevaricação, denunciação caluniosa e crime contra a honra.

De acordo com interlocutores do PGR, Moro pode ser enquadrado nos três últimos e Bolsonaro, nos seis primeiros. Nada impede, no entanto, que a investigação encontre outros crimes além desses e os denuncie por isso.

Além dos depoimentos que devem ser prestados no inquérito que investiga a veracidade das acusações do ex-juiz da Lava Jato, Celso de Mello também decidiu dar publicidade ao vídeo da reunião ministerial em que Bolsonaro teria ameaçado Moro de demissão caso não trocasse o diretor-geral da PF.

Segundo especialistas ouvidos pela Folha, os atos de Bolsonaro na demissão do ministro poderiam ser enquadrados em dois artigos da Lei do Impeachment:

  • Artigo 7º, 5 São crimes de responsabilidade contra o livre exercício dos direitos políticos, individuais e sociais servir-se das autoridades sob sua subordinação imediata para praticar abuso do poder, ou tolerar que essas autoridades o pratiquem sem repressão sua
  • Artigo 9º, 4, 6 e 7 São crimes de responsabilidade contra a probidade na administração: 4 - Expedir ordens ou fazer requisição de forma contrária às disposições expressas da Constituição; 6 - Usar de violência ou ameaça contra funcionário público para coagi-lo a proceder ilegalmente, bem como utilizar-se de suborno ou de qualquer outra forma de corrupção para o mesmo fim; 7 - Proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo

A Constituição prevê que o Legislativo tem que autorizar a abertura do processo contra o chefe do Executivo, com voto favorável de dois terços da Câmara dos Deputados. O STF, então, decide se recebe a denúncia e abre processo.

Uma vez aberto, o presidente é afastado enquanto durar o julgamento, por até 180 dias. A jurisprudência da corte, porém, permite que o presidente seja investigado sem autorização do Congresso.

Atos pró-golpe militar

O ministro Alexandre de Moraes, do STF, autorizou a abertura de inquérito para investigar as manifestações realizadas em 19 de abril. O pedido de investigação foi feito pelo procurador-geral da República, Augusto Aras.

O objetivo de Aras é apurar possível violação da Lei de Segurança Nacional por "atos contra o regime da democracia brasileira por vários cidadãos, inclusive deputados federais, o que justifica a competência do STF".

“O Estado brasileiro admite única ideologia que é a do regime da democracia participativa. Qualquer atentado à democracia afronta a Constituição e a Lei de Segurança Nacional”, afirmou o procurador-geral, sem citar o presidente Jair Bolsonaro, que também participou de ato em Brasília.

Interlocutores do procurador-geral afirmam que, inicialmente, Bolsonaro não será investigado. Eles alertam, porém, que, caso sejam encontrados indícios de que o chefe do Executivo ajudou a organizar as manifestações, ele pode vir a ser alvo do inquérito.

Naquele dia, em cima da caçamba de uma caminhonete, diante do quartel-general do Exército e se dirigindo a uma aglomeração de apoiadores pró-intervenção militar no Brasil, Bolsonaro afirmou que "acabou a época da patifaria" e gritou palavras de ordem como "agora é o povo no poder" e "não queremos negociar nada".

"Nós não queremos negociar nada. Nós queremos ação pelo Brasil", declarou o presidente, que participou pelo segundo dia seguido de manifestação em Brasília, provocando aglomerações em meio à pandemia do coronavírus. "Chega da velha política. Agora é Brasil acima de tudo e Deus acima de todos."

Crimes previstos na Lei de Segurança Nacional

  • Artigo 17: Tentar mudar, com emprego de violência ou grave ameaça, a ordem, o regime vigente ou o Estado de Direito
  • Pena prevista: de 3 a 15 anos de prisão
  • Artigo 23, incisos I, II e III: Incitar à subversão da ordem política ou social; à animosidade entre as Forças Armadas ou entre estas e as classes sociais ou as instituições civis; à luta com violência entre as classes sociais
  • Pena prevista: de 1 a 4 anos de prisão

Pedidos de impeachment

Ainda no final de abril, o ministro Celso de Mello, do STF, solicitou que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), explique a situação dos pedidos de impeachment contra o presidente que estão parados na sua mesa.

São ao menos 35, incluindo pedidos de parlamentares do PSOL, um do deputado Alexandre Frota (PSDB-SP), ex-aliado de Bolsonaro, e um do ex-candidato presidencial Ciro Gomes e do presidente do PDT, Carlos Lupi.

No despacho, que faz parte de um mandado de segurança assinado por dois advogados, o magistrado incluiu Bolsonaro formalmente como parte no processo. Celso de Mello explicou que, além da Advocacia-Geral da União, que representa o Executivo perante o Judiciário, o presidente também precisa fazer parte da ação.

Maia, hoje rompido com Bolsonaro, é o responsável por analisar de forma monocrática se dá ou não sequência aos pedidos de impeachment. Ele não tem prazo para tomar essas decisões.

Caso seja dada sequência, o caso é analisado por uma comissão especial e, depois, pelo plenário da Câmara. Somente com o voto de ao menos 342 dos 513 deputados é autorizado que o Senado abra o processo.

Nesse caso, Bolsonaro seria afastado até a conclusão do julgamento —ele perderia o mandato caso pelo menos 54 dos 81 senadores votassem nesse sentido. O Brasil já teve dois episódios de impeachment: o de Fernando Collor (1992), que renunciou antes da decisão final do Senado, e o de Dilma Rousseff (2016).

Possíveis crimes de responsabilidade no mandato

Da participação em protesto anti-Congresso a insultos a jornalistas, são ao menos 15 as situações em que o presidente Jair Bolsonaro pode ter cometido crime de responsabilidade.

A maioria dos casos envolve quebra de decoro ou afronta à Constituição. A quebra de decoro ocorre quando a autoridade procede "de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo”. A norma, segundo o professor de direito da USP Rafael Mafei, é um guarda-chuva que "visa garantir, nas palavras e ações do presidente, limites de civilidade política".

No início deste mês, Bolsonaro mais uma vez prestigiou pessoalmente uma manifestação em Brasília de apoiadores a ele e com críticas ao STF (Supremo Tribunal Federal) e ao Congresso. Desta vez, o ex-ministro Sergio Moro também foi alvo do protesto.

Em declaração transmitida em live dele em rede social, Bolsonaro afirmou: "Temos as Forças Armadas ao lado do povo, pela lei, pela ordem, pela democracia, pela liberdade".

São crimes de responsabilidade os "atos do presidente da República que atentem contra a Constituição e, especialmente, contra [...] o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais" das unidades da Federação.

Crimes de responsabilidade podem levar à abertura de um processo de impeachment pelo Congresso.

INVESTIGAÇ ÕES DA PF QUE ENVOLVEM BOLSONARO

Inquérito das fake news

Em março de 2019, o presidente do STF, ministro Dias Toffoli, anunciou a abertura de um inquérito para investigar a existência de fake news que atingem membros da corte. Paralelamente, em setembro do mesmo ano, a CPMI das Fake News foi instaurada no Congresso.

Desde então, a família Bolsonaro tem se colocado contrária ao funcionamento da comissão, que investiga perfis que fazem parte do arco de apoio do presidente da República.

No final de abril, a Folha revelou que a PF identificou o vereador Carlos Bolsonaro, filho do presidente Jair Bolsonaro, como um dos articuladores de um esquema criminoso de fake news.

Caso Queiroz

Fabrício Queiroz, policial militar aposentado e antigo amigo de Bolsonaro, é pivô da investigação do esquema de "rachadinha" no gabinete de Flávio Bolsonaro, hoje senador, quando o filho do presidente era deputado estadual na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.

Flávio é investigado desde janeiro de 2018 sob a suspeita de recolher parte do salário de seus empregados na Assembleia de 2007 a 2018. Os crimes em apuração são peculato, lavagem de dinheiro, ocultação de patrimônio e organização criminosa.​

A apuração contra o senador começou após relatório federal indicar movimentação financeira atípica de Queiroz, então assessor e espécie de chefe de gabinete de Flávio.

Além do volume movimentado, de R$ 1,2 milhão em um ano, chamou a atenção a forma com que as operações se davam: depósitos e saques em dinheiro vivo em datas próximas do pagamento de servidores da Assembleia.

Queiroz, que hoje mora em São Paulo para o tratamento de um câncer, afirmou que recebia parte dos valores dos salários dos colegas de gabinete. Ele diz que usava esse dinheiro para remunerar assessores informais de Flávio, sem conhecimento do então deputado estadual. A sua defesa, contudo, nunca apontou os beneficiários finais dos valores.

Queiroz era amigo do ex-policial militar e miliciano Adriano da Nóbrega, chamado de herói pelo presidente Bolsonaro e ligado ao gabinete de seu filho Flávio. Adriano esteve foragido por mais de um ano até março passado, quando foi morto durante uma operação policial na Bahia.

De 2007 até Flávio se mudar para o Senado, Adriano teve parentes nomeados no antigo gabinete na Assembleia. Primeiro foi a então mulher e, em 2016, a mãe. Queiroz disse ser o responsável pela indicação das duas.

Caso Marielle

O nome de Jair Bolsonaro (sem partido) foi colocado nas investigações sobre o assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL) a partir do depoimento de um porteiro do condomínio onde vivia o presidente antes de assumir o Palácio do Planalto, em janeiro de 2019.

A citação veio à tona em outubro do ano passado, quando o Jornal Nacional, da TV Globo, veiculou reportagem que fez menção ao nome do presidente na investigação do assassinato, ocorrido em março de 2018.

Segundo o Jornal Nacional revelou à época, o depoimento de um porteiro do condomínio onde Bolsonaro tem casa na Barra da Tijuca, na zona oeste do Rio, indicaria que um dos acusados pelo assassinato teria chegado ao local e dito que iria à casa do então deputado federal. Isso teria acontecido horas antes da morte de Marielle.

O Ministério Público, porém, disse em seguida que o depoimento do porteiro não condizia com as provas técnicas obtidas e que ele pode ter mentido. Além disso, no dia da morte de Marielle, Bolsonaro estava em Brasília. Dias depois, o porteiro afirmou à Polícia Federal ter cometido um erro ao mencionar o presidente.

Já em fevereiro deste ano foi concluído um laudo do ICCE (Instituto de Criminalística Carlos Éboli), da Polícia Civil do Rio, realizado em cinco HDs apreendidos no condomínio, onde moravam tanto Bolsonaro como o policial militar aposentado Ronnie Lessa, um dos acusados e preso pelo homicídio.

O laudo aponta que o porteiro que interfonou para Lessa não é o mesmo que prestou depoimento apontando o envolvimento de Bolsonaro.

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