Há exagero contra Bolsonaro, e CCJ pode discutir anistia, diz Caroline de Toni

Da ala bolsonarista do partido, deputada defende votar pautas de costume na comissão

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Brasília

A nova presidente da CCJ (Comissão de Constituição e Justiça) da Câmara, deputada Caroline de Toni (PL-SC), diz à Folha que enxerga haver "exagero" contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e afirma que a comissão poderá discutir anistia aos condenados pelos atos golpistas do dia 8 de janeiro e incluir o ex-chefe do Executivo.

"Se enxergar que tem a oportunidade de ele [Bolsonaro] ser anistiado, com certeza. Ele vem sendo acusado de muitas coisas que nós entendemos que há um exagero. Havendo a conveniência e a oportunidade de pautar [projetos de anistia] e de incluí-lo, não vejo por que não", diz a deputada.

A deputada federal Caroline de Toni (PL-SC), nova presidente da CCJ da Câmara
A deputada federal Caroline de Toni (PL-SC), nova presidente da CCJ da Câmara, nesta quarta (6) - Pedro Ladeira/Folhapress

Na Câmara há projetos em tramitação que tratam da anistia dos envolvidos nos ataques golpistas. Um deles estava sob relatoria da deputada Sâmia Bonfim (PSOL-SP), que rechaçou a proposta. No entanto, ela não foi indicada pelo PSOL para integrar a CCJ neste ano e, dessa forma, perde a relatoria. Agora, caberá à presidente do colegiado definir o novo relator.

Caroline foi eleita presidente da principal comissão da Câmara dos Deputados na quarta-feira (6), num revés para o governo Lula (PT). Da ala bolsonarista do PL, a deputada defende pautas caras ao bolsonarismo, como a flexibilização do porte de armas, e é contra o aborto.

Ela diz que, havendo conveniência, as chamadas pautas de costume serão analisadas na CCJ. "Na medida do possível que a gente puder pautar temas de costumes, a gente vai pautar", diz.

A senhora irá pautar algum projeto de anistia aos condenados pelos atos golpistas do 8 de janeiro?
Nós temos cerca de 12 PLs que tratam desse assunto. Muitos desses nem estão na CCJ. Tem um que estava com a relatoria da deputada Sâmia [Bonfim, do PSOL]. E aí, aquela coisa, né? Estava com ela e ela não entregou, estava ali sentada em cima do projeto. Como a deputada Sâmia não estava designada como membro da comissão na instalação da comissão [na quarta], o regimento diz que cai a relatoria dela. Esse é um projeto que a gente tem que ainda designar relator.

Vou ter que conversar com o líder [do PL na Casa, Altineu Côrtes], com a minha bancada, com o presidente [da Câmara Arthur] Lira e vamos ver se há esse clima para poder aprovar. Porque realmente existe uma reclamação muito forte por parte dos advogados, das pessoas que participaram de manifestações no 8 de janeiro, de que os advogados não tiveram acesso aos autos, ou de que a sentença não é individualizada, de que teria sido infringido alguns incisos do artigo 5 da Constituição com relação aos direitos dos acusados. Caso haja um apelo social com relação a isso, não vejo problema de pautar esse tipo de projeto.

A sra. acha que a anistia deveria incluir o ex-presidente Jair Bolsonaro?
Tenho que analisar com mais detalhes isso. Se eu ver que tem a oportunidade dele ser anistiado, com certeza. Porque ele vem sendo acusado de muitas coisas que nós entendemos que há um exagero. Havendo a conveniência e oportunidade de pautar e de incluí-lo, eu não vejo por que não.

O presidente Lula foi acusado, julgado e condenado pela Justiça em três graus de jurisdição. Aí depois, o próprio Supremo anulou algumas das condenações, tornando ele elegível novamente e ele voltou a ser presidente. Ou seja, tiveram várias movimentações no sentido de uma espécie de anistia pelo presidente Lula. O presidente Bolsonaro, por outro lado, não cometeu nenhum crime. Não vejo que ele tenha cometido nenhum crime para ter sido declarado inelegível. Ele está dentro das quatro linhas da Constituição. Acredito que havendo conveniência, oportunidade, um apelo social, um apelo político. E não farei isso antes de ouvir as bases partidárias, antes de ouvir os líderes e o próprio Bolsonaro. Havendo clima para isso, não há por que não pautar esse tipo de projeto. Mas não é algo que eu veja para logo.

A presidência da deputada Bia Kicis (PL-DF) na CCJ foi marcada por tensionamento. Isso vai se repetir na sua gestão?
Acredito que não, porque o que caracterizou a Bia no início da gestão dela foi justamente tentar pautar muitos temas de costumes logo nas primeiras pautas e tão só temas de direita. E, na verdade, a gente tem que ter a sensibilidade de que a CCJ, por mais que queiramos como deputados de oposição fazer isso, nós temos que ver a conveniência e a oportunidade de se fazer isso.

Quando a gente faz uma pauta que atenda um pouco de cada bancada, a gente cumpre a missão institucional que nos levou até ali. Na medida do possível que a gente puder pautar temas de costumes, a gente vai pautar. Mas a gente também tem que ter a sensibilidade de que, sendo uma Casa que é um espelho da própria sociedade e da multiplicidade do próprio plenário, a gente tem que pautar um pouco de cada bancada. Estou elaborando a primeira pauta para a semana que vem e estamos tentando fazer justamente isso, uma pauta equilibrada que atenda um pouco do pedido de cada bancada.

A Câmara está discutindo uma PEC (proposta de emenda à Constituição) que restringe operações da Polícia Federal no Congresso. A sra. defende essa iniciativa?
Defendo é que as nossas prerrogativas sejam respeitadas. O que a gente tem visto hoje é que muitas das prerrogativas, muito da nossa imunidade para poder exercer o nosso trabalho, não estão sendo respeitadas. Tudo aquilo que se refere à defesa das prerrogativas, para que elas realmente se valham, acho que a gente tem que sim.

Tanto que a gente fez uma obstrução grande na Casa no ano passado. O [presidente do Senado, Rodrigo] Pacheco foi sensível ao nosso apelo, ele pautou uma das PECs que limitava esses avanços por decisões monocráticas [do STF]. A gente tem que restaurar o respeito, porque nenhum Poder está acima do outro. Todos os Poderes são igualmente válidos e a gente tem que ter esse respeito.

A sra. dará andamento na CCJ a pautas que miram a atuação do STF?
A PEC que foi aprovada no Senado [que limita as decisões individuais de ministros da corte], nem foi despachada pelo presidente Lira. Primeiro, a gente tem que discutir com ele [e dizer] ‘olha, está havendo um apelo, está havendo um avanço sobre as nossas prerrogativas, nós temos que defender essa Casa’. Tem que ser conversado com ele antes.

A sra. vai usar a CCJ para pautar projetos caros ao bolsonarismo?
Nós vamos ver a conveniência e oportunidade de pautá-los. Como deputada de direita, e o deputado Nikolas [Ferreira (PL-MG), que irá presidir a comissão de Educação] também, a gente entende que isso é um apelo popular, a gente também merece respeito. As pautas da direita também merecem respeito, porque foram chanceladas nas urnas.

A sra. é contra o aborto e defensora da aprovação do Estatuto do Nascituro. Esse tipo de pauta pode ser analisado a CCJ?
Entendo que quando o STF quis pautar a descriminalização do aborto, e agora, na normativa do Ministério [da Saúde sobre procedimentos de aborto legal], quis pautar novamente isso, não vejo por que a defesa da vida deveria ter inibição dentro da Câmara.

Se entender que há apelo popular, que está havendo uma invasão da nossa competência de legislar acerca do tema, uma das respostas que a gente que não é a favor do aborto tem a dar é tentar aprovar o Estatuto do Nascituro. Não veria problema nenhum de fazer isso, porque o Supremo e o Executivo estão tentando liberar o aborto. Uma resposta que a gente tem a dar é pautar esse tipo de projeto. Vejo isso como reação a esse movimento dos demais Poderes.

Aliados do governo têm minimizado a sua vitória, sob o argumento de que os projetos hoje são discutidos diretamente em plenário. Teme ter uma presidência esvaziada?
A gente tem percebido essa movimentação e essa forma de condução da Câmara. Prezo pelo cumprimento do regimento, então vejo [isso] de uma forma muito crítica, acredito que deva seguir o rito regimental. Por mais que às vezes chame um projeto direto para o plenário, você pode fazer discussão acerca daquele tema dentro da comissão. Há maneiras de que, por mais que se tente esvaziar, o governo faça essa movimentação junto ao Lira, a gente ainda tem como discutir temas de relevância nacional, caso seja feita essa manobra.

A sra. é a segunda mulher a presidir a CCJ. A primeira foi Bia Kicis, que também é de direita. Isso mostra fragilidade na esquerda?
A esquerda deveria ver o caso do PL como um grande exemplo a ser seguido, porque nas duas oportunidades que os partidos de direita tiveram de ocupar a principal comissão da Casa, indicaram mulheres. A esquerda, como diz defender a pauta das mulheres, deveria se espelhar nisso.

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