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Kombuchas e infusões 'roubam' lugar do vinho na harmonização de pratos

Restaurantes ampliam carta de bebidas não alcoólicas, que podem ser combinadas com receitas

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Roberto Saraiva
São Paulo

As opções em restaurantes para quem dispensa o álcool nas refeições já não se limitam a suco de laranja e refrigerante. Casas vêm investindo em harmonizar bebidas não alcoólicas a pratos, seguindo a mesma lógica usada para vinhos e cervejas —e acompanhando um movimento mundial encabeçado por gerações mais jovens.

No curitibano Manu, cada um dos tempos do menu-degustação pode ser acompanhado por uma bebida não alcoólica. O serviço custa R$ 240 (apenas a harmonização). A ideia veio da chef e proprietária Manu Buffara e saiu do papel na metade deste ano.

Caldo de camarão com café servido com coquetel de taperebá no restaurante D.O.M., em São Paulo
Caldo de camarão com café servido com coquetel de taperebá no restaurante D.O.M., em São Paulo - Keiny Andrade/Folhapress

Para fazer as combinações, há kombuchas preparadas por parceiros e infusões da casa —uma delas, mais herbal, leva pepino, salsão, manjericão e zimbro; outra, mais frutada, mistura hibisco com amora, mirtilo e morango.

Também há outros cinco fermentados rotativos feitos em colaboração entre as equipes do bar e da cozinha do Manu. Um deles leva batata-doce, curry e maracujá.

As bebidas vão se alternando por conta da sazonalidade dos ingredientes, da sua curta validade e para acompanhar as mudanças do cardápio.

O processo de escolha dos fermentados leva em consideração as características dos pratos —se a receita tem, por exemplo, sabor mais adocicado, ácido ou terroso, explica a sommelière Juli Rodrigues, 34.

"Para um prato com muita gordura, uso vinhos mais ácidos como [os feitos com a uva] riesling. O mesmo vale para a harmonização não alcoólica. Para carne, preciso de algo com mais especiarias, então usamos bebidas com anis, zimbro ou folha do curry."

No paulistano D.O.M., do chef Alex Atala, a harmonização não alcoólica é feita de maneira mais informal, como sugestão —o serviço não é cobrado, e o cliente paga o preço da bebida escolhida.

O foco dos sommeliers Gabriela Monteleone, 39, e Luciano Freitas, 34, é nos fermentados produzidos e engarrafados no restaurante desde 2018.

Uma das opções fabricadas é o aluá, uma bebida que, na casa, é feita com abacaxi, gengibre e rapadura, e tem origens indígenas e quilombolas. Por lá, é servida como boas-vindas acompanhando castanha-de-caju com sal.

Frutas como jabuticaba e caju se alternam com outras opções sazonais quase diariamente, e cerca de 20 garrafas são preparadas por semana.

"É diferente de fazer harmonização com vinho por conta da oferta de ingredientes. Pode ser que o fornecedor não tenha um cambuci, por exemplo", explica Gabriela.

Por conta dessa rotatividade, as opções de bebidas produzidas pelo restaurante vão mudando para acompanhar o menu. Dois drinques não alcoólicos, porém, estão permanentemente no cardápio: cordial (espécie de licor) de jabuticaba com limão e água com gás e o drinque de taperebá com limão e manjericão.

"Procuramos manter o critério de força entre prato e bebida. Receitas com ingredientes brasileiros, foco do D.O.M., pedem mais acidez e menos doçura", diz Gabriela.

Segundo ela, a brasilidade também é explorada nos drinques por meio de ervas, especiarias e raízes capazes de dar mais textura e corpo, como o amargor e o tanino (sensação adstringente na língua) do chá-mate ou da carqueja.

Prato Pirarucu cozido a baixa temperatura harmonizado com coquetel de jabuticaba
Prato Pirarucu cozido a baixa temperatura harmonizado com coquetel de jabuticaba - Keiny Andrade/Folhapress

O restaurante Pacato, de Belo Horizonte (MG), é outro a ter uma carta dedicada a quem não quer ingerir álcool. No menu-degustação lançado na semana passada, inspirado no Vale do Jequitinhonha, 6 dos 9 tempos são servidos com drinques não alcoólicos.

O prato mais pesado, que leva carne de sol, salada de palma, vagem e mandioca é servido com um chá de limão-cravo e laranja com refrigerante de pomelo e angostura.

"Tradicionalmente harmonizamos por oposição ou por semelhança ao sabor do prato, mas também buscamos outras relações, como contextos culturais e históricos’’, afirma Caio Soter, chef e dono.

Segundo Gabriela Monteleone, do D.O.M., o consumo de bebidas não alcoólicas deve crescer nos próximos anos. "As novas gerações bebem menos, têm mais curiosidade e não entendem só o vinho como bebida de restaurante."

"Hoje, conseguimos oferecer opções que vão além do sucos e refrigerantes. É possível preparar de cold brew (método que faz infusão prolongada de café em água fria) até uma água aromatizada, que parece simples, mas pode ser super refinada", acrescenta.

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